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'Quebra de empreiteiras da Lava Jato trará risco sistêmico ao País', diz advogado

Walfrido Jorge Warde Júnior lançará livro com plano alternativo à leniência para empresas investigadas por desvios na Petrobrás: 'Se elas falirem, Brasil sucumbirá'

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Por Tonia Machado
Atualização:

As 29 empreiteiras envolvidas no esquema de corrupção na Petrobrás detêm os principais projetos de infraestrutura no País. Se condenadas, nenhuma poderá ser contratada novamente pelo governo, o que levaria muitas à falência. Para evitar que isso ocorra, seis delas já recorreram à Controladoria-Geral da União (CGU) para celebrar um acordo de leniência - espécie de delação premiada para pessoas jurídicas. Esse acordo, no entanto, pode ser feito apenas com a primeira empresa interessada. No livro Um plano de ação para o salvamento do projeto nacional de infraestrutura, que será lançado em 12 de novembro, os advogados Walfrido Jorge Warde Júnior, Gilberto Bercovici e José Francisco Siqueira Neto propõem uma alternativa a esse acordo. Em entrevista ao Estado, Walfrido Jorge explica a proposta, que já foi enviada ao governo e, segundo ele, é a única solução para as empreiteiras e também para a saúde econômica do País.

Walfrido Jorge Warde Junior, do escritório de advocacia Lehmann, Warde e Monteiro de Castro Foto: Gabriela Biló/Estadão

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O que o projeto propõe?

Que as empresas envolvidas no esquema de corrupção da Petrobrás paguem integralmente as indenizações e multas pelos prejuízos que deram à União e à estatal. Isso seria feito por meio das ações que elas possuem em projetos dos quais ganharam licitações. Por exemplo, projetos de aeroportos, sondas, termelétricas. Se, por exemplo, a empresa deve R$ 1 bilhão e tem o equivalente a esse valor distribuído em ações de projetos, ela as entrega à União e à Petrobrás, que vende essas ações no mercado de capitais. Se o valor total arrecadado com a venda somar R$ 1 bilhão, está tudo resolvido. Se faltar uma parte, a empresa deve pagar o restante. E o controle dos projetos passa para quem comprar as ações.Quem poderia comprar?

O mundo inteiro tem interesse em comprar essas ações. Como é um leilão, quem paga mais. Com exceção das empresas que as detinham anteriormente.Por que o sr. acredita que essa seja a melhor solução?

Ela permite que as empresas envolvidas paguem o que devem e, assim, possam voltar a contratar com o Estado. Ao mesmo tempo, permite que o Estado recobre o controle de projetos que são essenciais para o Brasil e vendam esses projetos no mercado de capitais para novos entrantes. Além disso, essa medida traz para o caixa da Petrobrás vários bilhões de reais que saíram por meio de contratos fraudulentos, superfaturados. Nenhuma outra solução existente na legislação é capaz de fazer isso.Não seria melhor punir as empresas e substituí-las?

Atualmente, essas 29 empresas têm o controle dos principais projetos de infraestrutura brasileiros. Se elas sucumbirem, com elas sucumbem todos esses projetos e, ao mesmo tempo, um crédito brutal do Estado contra elas, que é garantido pelos bancos privados. Nos últimos anos, o Estado colocou por meio dos bancos públicos, por meio dos fundos de pensão, mais de R$ 1 trilhão nessas empresas. Se elas quebrarem, se criará um problema sistêmico de crédito para o Brasil. Além disso, muitas delas são excelentes sob o ponto de vista tecnológico e técnico. Há determinadas obras que só empresas brasileiras sabem fazer porque desenvolveram tecnologias para isso. Essas empresas também são contratantes de milhões de empregos. A falência delas aumentaria ainda mais o desemprego no País. Existe também a infraestrutura jurídica. Foram gastos bilhões de reais ao longo dos anos para fazer editais de licitação, leilões, contratos de concessão, contratos administrativos que têm como partes a União e essas empresas. Refazer essa malha de infraestrutura jurídica levaria anos.A permanência dessas empreiteiras não pode gerar uma sensação de que nada mudou?

Não podemos querer dessas empresas mais do que a lei impõe a elas. Só se estivéssemos falando: olha, você me deve R$ 100, mas eu recebo R$ 50 e fico bonzinho, como alguns projetos, que são corruptelas da nossa solução no Congresso Nacional, pretendem. O que sugerimos não é quebrar multa e indenização. Propomos que elas paguem 100% do que a lei determina. Isso não é um projeto para salvar empreiteiras, mas para salvar a infraestrutura e a economia do Brasil.Esse acordo cobriria o prejuízo causado à União e à Petrobrás?

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O dano declarado pela Petrobrás em seu balanço é de R$ 6,2 bilhões. Quem calcula a multa a ser paga pelas empresas é a União. Imagine que seja o dobro ou o triplo desse valor. Estamos falando em R$ 15 ou R$ 20 bilhões e 90% vai para o caixa da Petrobrás. É tudo o que ela precisa pra voltar à normalidade. Se daria uma resposta adequada aos investidores e seria a primeira vez na história, talvez mundial, em que um escândalo de corrupção foi resolvido, sob o ponto de vista econômico, tão rapidamente.

Essa solução acabaria com o problema de corrupção entre essas empresas e o Estado, já que eles continuarão fechando negócios?

São duas coisas diferentes. Uma coisa é resolver o problema sistêmico que temos agora e que é um problema econômico. Há quem diga que o impacto da Lava Jato na economia é 10% de investimento bruto de capital e 3% do PIB. Isso é o impacto direto. Há também o indireto. No entorno dessas grandes empresas gravitam empresas médias e pequenas. Temos também a crise de crédito, que envolveria bancos, o Tesouro, o Fundo de Amparo ao Trabalhador, fundos de pensão. Não estamos olhando para o tamanho do problema que temos diante de nós. O problema emergencial é salvar a infraestrutura do Brasil e salvar a economia brasileira de todos esses riscos. A segunda coisa é o combate sistêmico à corrupção que, acredito, está bem colocado no Brasil. Estamos muito bem guarnecidos de instrumentos legais duríssimos.

Porque o sr. resolveu enviar o projeto ao governo?

Estamos vendo que estamos nos aproximando do abismo e não temos nenhuma solução a não ser essa.

E o governo deu alguma resposta?

Conversamos com vários ministros de Estado e tivemos respaldo do ministro Joaquim Levy (Fazenda), que vem estudando o projeto. Ele escreveu um comentário altamente elogioso e favorável no livro.

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Em que termos acordos de leniência são feitos em outros países?

Em países de tradição anglo-saxônica normalmente tudo isso é muito bem definido. Pagou, está resolvido. Nos Estados Unidos, o acordo não significa que as pessoas não vão para a cadeia. Às vezes vão e ficam o resto da vida e também não significa que as multas sejam pequenas. São altíssimas. Muitas vezes obrigam a saída dessas empresas do mercado. Mas a tendência é de pragmatismo: de que adianta destruir um conglomerado empresarial, que dá empregos e é importante para a economia? Não se ganha com isso, se perde. Até porque, um conglomerado empresarial não pode responder integralmente pelo ato de dois ou três dirigentes que mal conduziram um negócio. É como se você destruísse o carro pela multa de trânsito que deve tomar o condutor. No máximo, se deve tirar o carro dele porque ele não é capaz de pagar a multa.

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