PUBLICIDADE

'PSDB votar pelo fim do fator previdenciário abala seu prestígio', afirma FHC

PUBLICIDADE

Foto do author Pedro  Venceslau
Por Gabriel Manzano e Pedro Venceslau
Atualização:

SÃO PAULO - O apoio de parlamentares do PSDB ao fim da reeleição - a começar pelo do próprio presidente do partido, senador Aécio Neves (MG) - não altera a opinião do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso sobre o assunto. “Eu continuo favorável a ela e não creio que o tempo de experiência tenha sido suficiente para invalidá-la.” Mas seu tom é mais duro quando comenta outra posição do partido, desta vez na votação do ajuste - o apoio a mudanças no fator previdenciário. “Acabar com o fator agrava a situação fiscal e, a médio prazo, o custo disso cairá no bolso do povo. O PSDB votar como votou abala seu prestígio, embora em camadas de menor peso eleitoral.”

"O PSDB votar como votou abala seu prestígio, embora em camadas de menor peso eleitoral”, afirma ex-presidente FHC Foto: Daniel Teixeira/Estadão

PUBLICIDADE

Muita gente do PSDB votou, no Congresso, contra a reeleição e contra o fator previdenciário, medidas que ele próprio criou. Faltam unidade e direção no partido?

São questões de natureza diferente. A duração do mandato depende da opinião que se tenha sobre a reeleição, não é questão doutrinária e não afeta diretamente o povo. Eu continuo favorável a ela e não creio que o tempo de experiência tenha sido suficiente para invalidá-la. Entretanto, entendo e respeito opiniões divergentes dentro do partido. Já acabar com o fator previdenciário ou diminuir as exigências de idade e tempo de trabalho - como foi feito - agrava a situação fiscal e, a médio prazo, o custo cairá no bolso do povo. Na campanha de 2014, o PSDB prometeu substituir o fator previdenciário por outro mecanismo, o que seria razoável. O PSDB votar como votou também abala seu prestígio, embora em camadas de menor peso eleitoral.

O partido passa a impressão de desunião. O que falta?

A imagem de um PSDB desunido aparece toda vez que estamos próximos a uma disputa eleitoral ou quando há ansiedade diante de um grande impasse. Por que isso e por que não com referência a outros partidos? Provavelmente porque o PSDB não tem dono e desde sua fundação contou com quadros de projeção nacional. Este é o lado positivo da resposta, mas há outros. Quais?

Como a maioria dos partidos, o PSDB, embora tenha uma postura reconhecida - que os adversários acusam de ser elitista, quando na verdade é, como se diz agora, mais “republicana” -, não possui unidade, digamos, ideológica. Mas como ele é o polo de oposição viável ao PT, cobra-se dele uma coerência que não é cobrada dos outros partidos.

Qual seria o caminho para aproveitar a atual crise do PT?

Publicidade

É compreensível que haja hesitação: votar contra tudo que vem do governo “do PT”, como este fez quando éramos governo, ou manter a coerência? Para mim não há dúvidas: é manter a coerência, denunciando, ao mesmo tempo, o oportunismo do PT. Este nos acusava de neoliberais, quando na verdade sabíamos as consequências da irresponsabilidade fiscal. Agora, diante do desastre que suas políticas demagógicas provocaram, não há alternativa à austeridade fiscal. Esta pesará sobre todos, mas custará mais caro aos assalariados. Pior: os ajustes vêm sendo feito sem crença por parte do PT e sem horizonte de esperanças para o povo.

Qual estratégia parece mais correta: apoiar a política de Joaquim Levy, porque confirmaria as teses tucanas, ou atacá-la porque seu sucesso fortalece o PT?

Para mim, o adversário não é o Levy, mas o lulopetismo, ao qual, neste momento, o Levy serve. Mas, entre os dois, há o Brasil. Como sair da armadilha? Votando o indispensável e mostrando que o que se faz agora é uma operação de resgate dos desastres do governo petista. Sem responsabilizar o ministro pelo que não é de sua alçada, ele, para manter vivo um governo que perdeu credibilidade e, portanto, as condições para oferecer um futuro promissor, submete o País a uma cirurgia sem a anestesia da esperança.

O País precisaria, para sair da situação atual, de um plano para “vender” ao eleitorado - isso ocorreu em 1994, com o Real. O partido deveria estar cuidando disso?

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

O Plano Real não foi feito apenas para baixar a inflação. Seu objetivo era - e conseguiu - repor em funcionamento saudável as finanças públicas. Daí as privatizações, as agências reguladoras, o Proer e o Proes, a transformação das empresas estatais em empresas que respondessem às exigências do mercado e ao interesse público. Tiramos delas o caráter de repartições obedientes aos interesses partidários. Os governos petistas foram reduzindo a importância das agências reguladoras, ampliando estatais e submetendo-as aos interesses partidários. Não fosse a inépcia do lulopetismo, e o Brasil estaria em melhor situação.

Para se fortalecer para 2018, que plano deve ser adotado?

Tem-se de restabelecer agora a confiança e a credibilidade perdidas pelo governo atual. Recomposta a confiança e rearranjadas as bases fiscais, teremos que abrir oportunidades para investimentos na área de infraestrutura, enfrentar com coragem os desafios educacionais e repor a economia com avanços tecnológicos. Em vez de protecionismo e ineficiência governamental, uma política industrial que apoie a modernização tecnológica e uma abertura comercial que nos faça presentes nos mercados globais mais dinâmicos. Só assim conseguiremos financiar programas sociais, criar bases não demagógicas e oferecer empregos de qualidade.

Publicidade

A linha agressiva do programa eleitoral na TV lhe pareceu adequada? O PSDB trocou o “deixar sangrar” pelo “fazer sangrar” para dificultar a volta de Lula?

A frase de que diante do “mensalão” seria melhor deixar o Lula sangrar foi de um dirigente do PFL, não do PSDB. Eu temia outra coisa: com o prestígio até então inabalado, Lula abriria uma fenda histórica no País, acusando “as elites” de o haverem derrubado. Foi pensando na unidade nacional que me pareceu arriscado o impeachment. Agora, diante do quadro de corrupção e inépcia escancarado, o PSDB precisa ser mais direto e duro nas críticas, com a mesma motivação, a de evitar que o País mergulhe na desilusão e na descrença.

O que são direita e esquerda, neste século 21?

O qualificativo de “direita” aplicado ao PSDB é pura jogada eleitoreira do PT. Com que autoridade um partido que governa com um lídimo representante do sistema financeiro controlando a economia, uma líder ruralista autêntica na agricultura e que entregou o comando congressual ao PMDB, sem que eu queira criticar estas pessoas, ainda se arroga em designar-se “de esquerda” e de acusar seus adversários polares como “direitistas”?

E o que separa, concretamente, hoje, o PT do PSDB?

Tanto PT como PSDB são versões da social-democracia que variam pelo grau maior de aceitação da centralização econômica pelo PT; maior apego à democracia, inclusive quanto à liberdade de opinião e dos meios de comunicação pelo PSDB; igual empenho na inclusão social, embora o PT simbolicamente expresse esse desejo com mais força; coincidência quanto a que a via revolucionária perdeu vigência. No presente, as diferenças maiores são quanto à aceitação das regras de mercado, implícita, mas relutante pelo PT, ou explicitamente pelo PSDB. Sempre com a ressalva de que elas não são absolutas; a ação do Estado é básica para assegurar os objetivos nacionais e para tentar equilibrar as desigualdades do capitalismo.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.