Projeto permite a político explorar bingo

Parecer de relator não inclui restrição a que detentor de cargo eletivo seja dono de casa de jogo; presidentes de comissões apoiam proibição

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Por Valmar Hupsel Filho
Atualização:

Com amplo apoio dos parlamentares envolvidos na discussão, tramitam no Congresso propostas para viabilizar a legalização dos jogos de azar – bingos, cassinos, caça níqueis e jogo do bicho – no Brasil. Parecer apresentado na semana passada pelo senador Blairo Maggi (PR-MT), que relata o tema no Senado, não prevê qualquer restrição a que políticos sejam donos de estabelecimentos para explorar jogos. 

O texto que está sendo construído no Senado prevê que numa eventual legalização dos jogos, caberá aos Estados e ao Distrito Federal a prerrogativa de dar “autorização outorgada” para a abertura e funcionamento das casas de jogos de azar. No caso dos cassinos, as pessoas jurídicas interessadas na exploração seriam previamente credenciadas no governo federal.

Relator do projeto, senador Blairo Maggi indicou ser 'desejável' legalização de jogo Foto: JEFFERSON RUDY/AGÊNCIA SENADO

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Questionados sobre a possibilidade de políticos, que poderão ter influência sobre a decisão de Estados e municípios, autorizarem o funcionamento de casas de jogos, os presidentes das duas comissões onde a matéria está sendo discutida disseram que, apesar de mais de 30 projetos sobre a legalização dos jogos já terem sido apresentados, até agora não houve qualquer sugestão no sentido de restringir o controle das casas de jogos por detentores de cargos eletivos. 

“Até agora ninguém veio falar comigo para sugerir esta restrição. Mas é uma boa ideia”, disse o senador Otto Alencar (PSD-BA), presidente da Comissão Especial de Desenvolvimento Nacional, onde tramita o Projeto de Lei 186/2014. De autoria do senador Ciro Nogueira (PP-PI), o texto propõe estabelecer um marco regulatório para a legalização, em espaços físicos e online, dos chamados jogos de azar no País.

O projeto impõe regras como a exigência de bons antecedentes criminais, regularidade fiscal e idoneidade financeira às empresas (e seus controladores) que receberiam a outorga para a exploração da atividade em uma eventual legalização. O texto recebeu sugestões do relator, senador Blairo Maggi, como regras para a construção de cassinos e limites para instalação de máquinas de caça-níqueis nos estabelecimentos.

Na última quarta-feira, Maggi apresentou seu parecer, no qual diz ser “desejável” a legalização dos jogos de azar. O texto foi lido, mas não apreciado, por falta de quórum na comissão. Apesar do amplo apoio dos integrantes à aprovação da matéria, a expectativa do relator é que o texto receba pedidos de vista e novas sugestões.

Como tramita em caráter terminativo, se aprovado pela comissão, o projeto é encaminhado diretamente para a Câmara, sem a necessidade de passar pelo plenário do Senado. Otto Alencar disse que, até lá, pretende inserir um parágrafo ao texto que trate da proibição a políticos com mandatos eletivos de controlarem casas de jogos de azar. “Vai ser um parágrafo único”, disse.

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A ideia do senador baiano, no entanto, pode encontrar resistência do relator da matéria. “Será que o político é um bicho tão esquisito que não pode exercer algumas atividades econômicas?”, questionou Maggi quando consultado sobre o assunto.

Menos avançada. Na Câmara, a discussão está menos avançada que no Senado. A Comissão Especial do Marco Regulatório dos Jogos no Brasil foi instalada em setembro e está na fase de realização de audiências públicas para discutir o assunto. O clima entre os membros da comissão, entretanto, é no sentido de dar celeridade à tramitação para uma rápida aprovação do substitutivo que reunirá elementos dos projetos já apresentados na Casa sobre o tema.

O relator, deputado Guilherme Mussi (PP-SP), reuniu-se nesta semana com o senador Blairo Maggi para discutir pontos da matéria. Segundo ele, a ideia é fazer com que o texto saia do Senado de tal forma que receba o mínimo de alterações na Câmara, para que tenha tramitação célere. “Nossa intenção é quanto menos mexer, melhor”, disse. Uma nova reunião entre os dois está agendada para a próxima terça-feira.

Interesses. Mussi concorda que políticos devem ser vedados de explorar casas de jogos de azar. “Há um conflito de interesse direto”, disse. “Políticos com mandato não podem ter, por exemplo, empreiteiras que têm contratos com o poder público”, compara. O presidente da Comissão Especial do Marco Regulatório dos Jogos no Brasil, deputado Elmar Nascimento (DEM-BA), também considera que políticos devem ser proibidos de explorar casas de jogos, caso a atividade seja realizada por meio de concessão. “O que for como atividade comercial comum, não tem por que haver impedimento. Mas se for concessão, fica ruim”, disse.

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Segundo ele, a discussão é bem-vinda mas ainda não foi feita na Câmara. Nenhum dos mais de 30 projetos que tramitaram na Casa sobre o assunto, afirmou, tratou sobre esta proibição. “Essa é a primeira vez que ouço falar disso”.

Arrecadação seria de ‘meia CPMF’. A proposta de legalizar jogos de azar no Brasil foi aventada em setembro pelo senador Benedito de Lira (PP-AL) como alternativa para melhorar a arrecadação do governo. “Isso geraria uma arrecadação de R$ 15 bilhões a R$ 20 bilhões em impostos por ano. É meia CPMF”, argumenta Lira. 

O projeto que tramita no Senado prevê que um porcentual de 10% da arrecadação das casas de jogos seria dividido em impostos estaduais (7%) e municipais (3%).

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Proibição no País é de 2004. O debate sobre a legalidade dos jogos de azar começou em 2004, quando veio a público o escândalo Waldomiro Diniz. O então assessor do ministro José Dirceu apareceu em gravações nas quais cobrava propina de Carlinhos Cachoeira, empresário do ramo do jogo do bicho. O esquema foi revelado pela revista Época. 

Em resposta às denúncias contra Waldomiro Diniz, o governo elaborou uma Medida Provisória que proibia bingos e máquinas caça-níqueis em todo o País. Desde a edição da Medida Provisória pela União, governo e casas de jogos de azar travam uma guerra jurídica que dura até os dias de hoje. 

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