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Previdência dos militares pode fazer Bolsonaro virar capitão

O desafio do presidente na reforma da aposentadoria das Forças

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Por Marcelo Godoy
Atualização:

Caro leitor,

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o País convive com realidades que se completam e se excluem em um jogo permanente de dissimulação e contraste. Há o litoral e o sertão, a casa grande e a senzala, a planície e o planalto, o morro e o asfalto. A lista é infindável e vertiginosa. E a presidência de Jair Bolsonaro parece inaugurar outras tantas. Uma em especial desperta o interesse de soldados e generais: o capitão e o presidente.

O então deputado Bolsonaro se comprometia em acabar com distorções que penalizariam seus pares em relação aos demais funcionários públicos. Ao subir a rampa, o agora presidente se viu às voltas com a reforma da previdência para os civis e não pôde excluir os militares do sacrifício. E assim o Ministério da Defesa apresentou em março o projeto de lei sobre a reforma da previdência e das carreiras militares.

Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro Foto: ERNESTO RODRIGUES / ESTADAO

Para dissimular o crescimento da alíquota da contribuição previdenciária e do tempo de serviço, o projeto cria o adicional de disponibilidade dos militares e aumenta o adicional de habilitação (cursos feitos durante a carreira). O primeiro será  proporcional ao soldo, sendo, por exemplo, de 41% para generais e almirantes (soldo de R$ 13.421,00) e 6% para cabos (R$ 2.627,00) e segundos-tenentes (R$ 7.490,00) - os valores crescem conforme a hierarquia de oficiais e graduados.

Os números despertaram reações entre os militares - o ministro-chefe da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos, reclamou pelo Twitter das "pessoas inescrupulosas" que teriam tentando dividir o Exército. Recebeu apoio de outros generais. Mesmo assim, nos dia 13 e 14 de agosto vão se reunir em Brasília representantes de associações militares para tratar da tramitação do projeto no Congresso. Há muita insatisfação - dizem - principalmente, entre os praças. De soldados a subtenentes. 

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“O projeto pode aumentar o fosso entre graduados e oficiais”, afirmou o general de divisão Synésio Scofano Fernandes, que até maio trabalhava na Secretaria de Finanças do ExércitoLá, teve como chefe o general Hamilton Mourão, atual vice-presidente. Synésio faz cálculos. Muitos. E define a defasagem do soldo nos últimos 20 anos.

“É de 45%.” Em 2002 – ele explica –, a remuneração média de um militar era 110% da média da administração direta. “Agora está em torno de 65%.” E diz ainda: “A remuneração média do Exército é 35% daquela do Banco Central, 45% do Legislativo e 47% do Judiciário.” Synésio vê perdas. E não lhe agrada o projeto de Bolsonaro. Quer 16% de aumento imediato do soldo. Muitos nas Forças Armadas e no governo conhecem e receberam as contas do general.

Enquanto isso, o projeto da reforma da previdência dos militares está parado na Câmara dos Deputados desde 25 de abril. Para o Exército, passado o recesso do Congresso, a comissão que deve analisá-lo começará a funcionar. A espera, porém, provoca inquietações. Um coronel da Aeronáutica – que pediu anonimato – resumiu seu sentimento pouco antes de disparar um textão para cerca de 80 colegas no WhatsApp: “Escrevi sobre a carreira, o soldo e digo que espero que o capitão Bolsonaro não se esqueça de seu passado”.

Synésio confirma o mal-estar. O general também se lembra do passado do presidente. “Em 1986, ele escreveu um artigo em uma revista com o título: ‘O soldo está baixo’. Foi o início de sua carreira política." Há quem lembre ainda das panelas batendo diante dos quartéis. Lá estava o recém-eleito deputado federal Bolsonaro. Nesta semana, acaba o recesso do Congresso. As pressões devem crescer e alcançar o Planalto. Há muita gente querendo que o presidente volte a ser o capitão. 

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