Pesquisa mostra que aids cresce mais no Sul

Por Agencia Estado
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A epidemia da aids na região Sul cresce numa velocidade muito maior do que no resto do Brasil, revela uma pesquisa realizada pelo Ministério da Saúde, feita em dois períodos da década de 90. Entre 1993 e 1998, a elevação da incidência da doença foi de 51% nos três Estados (Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul), enquanto, no resto do País, o crescimento foi de 16% no mesmo período. A tendência continua nos anos que seguem. Entre 1996 e 2000, a epidemia perde velocidade no País (-2%), mas sobe 13% no Sul. Preocupada com isso, a Coordenação Nacional de Aids, do Ministério da Saúde, organiza amanhã, em Florianópolis, um encontro com entidades da área para tentar mobilizar autoridades e criar novas campanhas de prevenção na região. O ministro da Saúde, José Serra, deverá participar do encontro para reforçar a importância do alerta. "O crescimento da aids no Sul surpreendeu-nos. De fato, em algumas áreas, esse movimento é muito preocupante", afirma o chefe de Epidemiologia da Coordenação Nacional de Aids, Dráurio Barreira. Essas áreas são o sul de Santa Catarina, na fronteira com o Rio Grande do Sul, e algumas cidades do litoral catarinense e do Paraná. Incidência é o porcentual de doentes pelo número absoluto da população num período específico. Essa taxa é medida a partir dos novos casos notificados pelo sistema de saúde, anualmente. A notificação é obrigatória, mas registra apenas as vítimas do HIV que apresentam os sintomas da aids. Ficam de fora da estatística oficial os que são soropositivos mas estão saudáveis. Em 1999, por exemplo, a incidência da doença foi de 11,2 por 100 mil habitantes no Brasil, mas atingiu 14,5/100 mil no Sul. No total de casos notificados até hoje, desde o início da epidemia, nos anos 80, o Sul tem 29 mil dos 203 mil do País. A explicação para a explosão da aids no Sul está no perfil das vítimas. A epidemia lá, ao contrário do resto do País, cresce muito entre usuários de drogas. Enquanto no País todo o porcentual de drogados vítimas de aids é de 8,8%, no Sul, esse número chega a 18%. O resultado disso é que o uso de drogas injetáveis é a principal causa de contaminação de homens da região. Nas mulheres, a maior forma de infectar-se pelo vírus ainda é o sexo heterossexual, mas os técnicos avaliam que elas são parceiras de drogados, o que se reflete em outra taxa, a de transmissão vertical. O crescimento no Sul de contaminação de bebês pelas mães passa a Região Sudeste, a partir de 1993 e continua crescendo (30% entre 1993 e 1996). Segundo o Ministério da Saúde, os usuários de drogas injetáveis formam o grupo mais difícil de ser atingido por campanhas de prevenção. Isso ocorre por causa da marginalização causada pela droga e da resistência da opinião pública em aceitar programas específicos, como o de distribuição de seringas descartáveis - que é motivo de debate entre ativistas e grupos conservadores que acreditam que a distribuição pode estimular o uso de drogas. Há dois indícios que podem ajudar a entender as causas da questão. O primeiro é o fato de que, segundo revela o levantamento do Ministério, as vítimas de aids na região têm mais parceiros sexuais do que no resto do País. No Brasil, 17,1% dos homens soropositivos admitem ter vários parceiros, enquanto no Sul essa taxa é de 23,3%. O porcentual nas mulheres vítimas da aids é ainda maior: 27,3% no País e 34,5% nos três Estados da região. O segundo e mais alarmante indício é a baixa adesão à camisinha nesses Estados. O Ministério tem outro estudo que mediu o crescimento na venda de perservativos entre 1998 e 2000 dividindo o País em áreas. O Sul é de longe o que registrou menor elevação, de apenas 7,4%. O Grande Rio e o Nordeste foram os campeões, com 126% e 104%. "Estamos diante de questões difíceis, que misturam drogas, resistência à camisinha, múltiplos parceiros e aids. Temos de fazer um grande alerta para esse coquetel de problemas", diz Barreira. Os governos de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná argumentam que o crescimento nas taxas de incidência não reflete um movimento real, mas é conseqüência do fato de que a região tem o melhor sistema de notificações do País. O que estaria acontecendo, segundo eles, é que os casos de doentes estariam chegando aos computadores do Ministério antes dos números de outras regiões, que têm sistemas mais falhos de apuração. O chefe de Epidemiologia admite que o sistema de contagem do Sul é, de fato, melhor, mas nega que a diferença das taxas de crescimento da epidemia seja causada por isso. "Calculamos que, por causa da agilidade deles, os números estejam com uma diferença de 2%, mas isso não é suficiente para dizer que a elevação de casos no Sul não foi maior. Até porque o sistema de notificação deles melhorou apenas no fim dos anos 90 e o nosso estudo analisa quase todos os anos da década", afirma Barreira.

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