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Partidos caçam talentos em movimentos de renovação

Siglas disputam alunos egressos de grupos como o RenovaBR; legendas oferecem ‘liberdade’ para que novos quadros votem contra as posições partidárias

Por Ricardo Galhardo e Matheus Lara
Atualização:

Desde que se formou na turma de 2019 do RenovaBR, no dia 14 deste mês, a advogada Renata Cezar, de 30 anos, já conversou com oito partidos interessados em tê-la como candidata nas eleições municipais do ano que vem. O espectro ideológico vai desde o PSOL até o PSD. Ainda surpresa com o assédio, ela já agendou reuniões com outras duas legendas em janeiro do próximo ano.

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Colegas de turma da advogada contabilizaram ao menos 10 siglas no lobby de um hotel em São Paulo onde se hospedaram os formandos do RenovaBR. Ali os alunos eram abordados por dirigentes ou representantes partidários que os convidavam a conhecer as propostas de cada legenda e, quem sabe, se filiar. “No dia da formatura tinha uma feira de recrutamento no hotel”, disse o também advogado Saul de Carvalho Isaias, de 26 anos.

O interesse dos partidos por quadros formados em movimentos civis como o RenovaBR vem da constatação das direções partidárias de que existe uma forte demanda do eleitorado por nomes de fora da política tradicional, evidenciada nas eleições do ano passado.

O sucesso eleitoral dos candidatos egressos dos movimentos de renovação política tem levado até partidos com estrutura mais fechada a discutirem o assunto, como o PT, o PSOL e o PSD (leia mais informações aqui).

Na disputa pelos jovens quadros, os partidos oferecem legenda e garantias de apoio material e político para as eleições do ano que vem. Algumas siglas que não tinham setores específicos para mulheres, LGBT, juventude e negros criaram comissões para melhorar o diálogo com as agendas dos alunos de grupos de renovação.

A advogada Renata Cezar, de 30 anos, já se reuniu com oito legendas; ela busca partido que 'converse' com suas pautas Foto: Werther Santana/Estadão

Partidos como Rede e Cidadania chegam a prometer liberdade total de atuação, mesmo que isso possa contrariar orientações partidárias, sem risco de punições ou retaliações. “Essa é uma ação que está no DNA da Rede. Consideramos que a política e as eleições abram espaço não só para os partidos políticos convencionais mas também para candidaturas independentes e cidadãs. Essa já é uma prática em vários outros países onde a democracia é mais avançada”, afirmou o porta-voz da Rede, Pedro Ivo.

“São movimentos espontâneos formados por jovens. Como no Brasil há determinação legal de que só se pode participar do processo político através de partidos, nós passamos a dialogar para integrá-los. Existe hoje uma nova formação política que não vem dos partidos tradicionais. Quem quiser continuar existindo tem que se adaptar”, disse Roberto Freire, presidente do Cidadania.

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A legenda, que negocia a filiação de Luciano Huck (fundador e um dos apoiadores do RenovaBR), alterou seu estatuto para eliminar a possibilidade de suas bancadas “fecharem questão” em qualquer tema. A alteração foi determinada em diálogo com movimentos de renovação.

Em 2018, o Renova BR “elegeu” dez deputados federais, um senador e seis deputados estaduais por sete partidos diferentes em um arco que vai do PSB e PDT até o Novo e o DEM. Se fosse uma legenda, o movimento teria uma bancada maior do que a de oito partidos, entre eles o próprio Cidadania, PSC, PCdoB, Novo e Rede. Este ano a autodenominada “escola de democracia” formou 1.170 alunos, muitos deles prontos para disputar as eleições de 2020.

Ao oferecer aos novos quadros liberdade para votar contra as orientações partidárias, as legendas tentam evitar que se repita o que aconteceu com o PDT e o PSB, que puniram sete parlamentares eleitos no ano passado por votarem a favor da reforma da Previdência – contrariando as orientações partidárias. Entre eles, dois ex-alunos do RenovaBR, Tábata Amaral (PDT-SP) e Felipe Rigoni (PSB-ES).

Para Saul de Carvalho, 26 anos, movimentos facilitam entrada de jovens nos partidos Foto: Nilton Fukuda/Estadão

Prioridades

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A liberdade para votar conforme suas convicções e de seu eleitorado, mesmo que isso contrarie a orientação partidária, é uma precondição imposta por boa parte dos jovens egressos dos novos movimentos. “Isso está entre minhas grandes prioridades para escolher um partido, sim”, disse Renata Cezar.

Mulher, negra, jovem, vinda da periferia, com boa formação acadêmica e histórico de trabalhos sociais na área da saúde, Renata tem perfil que cai como uma luva para partidos que buscam se adequar à “nova política”. Além disso, ela ajuda a cumprir a cota de 30% de candidaturas femininas prevista na legislação eleitoral.

A advogada atua há anos com o tema do direito à saúde, tem trabalho premiado na Itália sobre o assunto e quer ser vereadora por São Paulo em 2020. “Procuro um partido em que as pautas conversem com as minhas. Não pretendo fazer só um mandato.”

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O assédio é grande até sobre os alunos que não pretendem se candidatar e ingressaram no RenovaBR por outros motivos. É o caso de Saul Isaias. Ele militou no movimento estudantil e depois de formado decidiu que iria trabalhar na área do direito público. Para fazer a migração, contou com o Vetor Brasil, uma organização voltada para a melhora do setor público, onde descobriu o grupo de renovação.

Embora diga que não está interessado em se candidatar no ano que vem, Isaias avalia que movimentos deste tipo ajudam a quebrar as barreiras que dificultam a entrada de jovens nos partidos políticos. “Partido tem muito de apadrinhamento, não tem proximidade com a população”, disse ele, que constatou “uma visibilidade muito grande” do grupo de renovação.

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