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Para ONGs, atraso de dados do Inpe põe em xeque transparência

Dados sobre desmatamento foram divulgados três semanas após o previsto.

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Por Carolina Glycerio
Atualização:

A decisão de adiar a divulgação dos dados sobre o desmatamento na Amazônia põe em dúvida a transparência do governo sobre a destruição da floresta e a independência do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Especiais), na opinião de ambientalistas ouvidos pela BBC Brasil. Ana Euler, coordenadora do WWF em Rondônia, disse considerar um "retrocesso" ter a "transparência dos dados ameaçada". Para Paulo Adário, representante do Greenpeace, o adiamento é uma decisão "desastrada". "O governo não está sozinho no monitoramento por satélite do desmatamento. Mesmo se quisessem esconder, não conseguiriam", disse Adário. O Inpe divulgou os dados de maio nesta terça-feira, com três semanas de atraso. Em geral, a divulgação ocorre 15 dias depois do fim do mês analisado. De acordo com o sistema Deter (Detecção do Desmatamento em Tempo Real), 1.096 km2 da floresta foram mapeados como corte raso ou degradação progressiva em maio, área um pouco menor da desmatada em abril (1.123 km2). A organização Imazon, que também monitora a floresta por satélite, já havia divulgado os seus dados de maio no final de junho, que, assim como os do Inpe, indicaram uma queda no índice de novos desmatamentos. O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, reconheceu, há duas semanas, que a apresentação dos dados do Inpe estava pendente a pedido da Casa Civil, que exigiu que os dados fossem apresentados antes ao presidente Lula. Desmatamento progressivo Desta vez, como havia anunciado o diretor do Inpe, Gilberto Câmara, na segunda-feira, os números vieram acompanhados de uma análise estatística e de uma distinção dos diversos tipos de desmatamento: corte raso (remoção total da floresta) e remoção parcial (desmatamento progressivo). A inclusão da remoção parcial nos dados de desmatamento era um dos principais motivos de crítica do governador do Mato Grosso, Blairo Maggi. O pesquisador Paulo Barreto, do Imazon, disse que, apesar de "estranho", o atraso seria justificável se estivesse vinculado à necessidade de desagregar os dados. "Não porque a degradação não seja importante, às vezes é o primeiro estágio (do desmatamento), mas também pode ter sido uma área em que entrou fogo. É importante (ter os dados desagragados) até para entender melhor esse processo." "Se foi só para desagregar, é importante, mas não está claro se houve ingerência", disse Barreto. "É bem importante manter a independência do Inpe." Adário, do Greenpeace, diz que o atraso dos dados do Inpe e a exigência do governo de analisá-los antes levantam especulações de ingerência política e ameaça a independência do instituto, que o próprio governo promoveu no exterior. "O governo, que dois meses antes havia oferecido a tecnologia do Inpe para uso internacional (na reunião da ONU em Bali, em dezembro de 2007), começou a questionar o Inpe e sua credibilidade." Desde o final de 2007, quando os dados do Inpe passaram a apontar uma reversão na queda do desmatamento verificada nos anos anteriores, o governo, ainda na gestão da ministra Marina Silva, passou a adotar medidas para conter o ritmo de destruição na floresta. Representantes do agronegócio passaram então a questionar as medidas e os dados do instituto. Paulo Adário lembra que a abertura dos dados sobre o desmatamento, até então uma "caixa-preta", foi uma conquista do próprio governo Lula que passou a divulgar os dados anuais do Prodes (Programa de Cálculo do Desflorestamento da Amazônia) em 2003. No final de 2006, em meio às boas notícias sobre a queda no desmatamento, o Inpe também passou a divulgar os dados mensais do Deter que havia desenvolvido em 2004 como forma mais eficaz de monitorar o desmatamento em tempo real. "Com a queda do desmatamento, esses dados começaram a ser positivos para a própria imagem do governo, que começou a usar os dados do Deter de forma política", disse Paulo Adário. "No fim de 2007, quando subiu de novo, foram anunciadas medidas (de contenção do desmatamento) que geraram forte reação do agronegócio, especialmente do Mato Grosso, e toda essa discussão (em torno da legitimidade dos dados)." BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

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