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Oposição a Bolsonaro é fiel da balança na disputa para sucessão de Maia

Escolha do próximo presidente da Câmara ganha importância em momento de grave crise, com 48 pedidos de impeachment contra Jair Bolsonaro

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Por Vera Rosa
Atualização:

Caro leitor,

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Com o racha do Centrão, os votos dos partidos de oposição ao presidente Jair Bolsonaro passaram a ser agora o “fiel da balança” para eleger o sucessor de Rodrigo Maia (DEM-RJ) ao comando da Câmara. Em um momento de grave crise, com 48 pedidos de impeachment contra Bolsonaro aguardando despacho de quem dirige a Casa, a escolha passou a ganhar ainda mais importância e os apoios para a disputa que renovará a cúpula do Congresso vêm sendo articulados em conversas de bastidor.

Embora a eleição para a presidência da Câmara e do Senado esteja marcada para fevereiro de 2021, os pré-candidatos já se movimentam em busca de composições. Maia se reuniu pessoalmente com a oposição, há quinze dias, para discutir a agenda do segundo semestre – ainda sob impacto da pandemia do coronavírus – antes das campanhas municipais. A conversa também tratou de sua substituição, daqui a sete meses. Integrantes da esquerda manifestaram ali a intenção de se aliar ao deputado do DEM para derrotar Bolsonaro. A estratégia desenhada passa pela presidência da Câmara.

Tanto Maia como o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP) estão impedidos de concorrer à reeleição, a não ser que haja mudanças de normas. Motivo: a Constituição impede que presidentes da Câmara e do Senado sejam reconduzidos aos cargos na mesma legislatura. Alcolumbre, no entanto, faz gestões para derrubar essa proibição e conta com aval de aliados para uma consulta ao Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o caso, sob o argumento de que seu mandato é de oito anos, terminando apenas em 2022.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia Foto: André Dusek/Estadão

Mesmo se conseguir ultrapassar essa barreira, porém, Alcolumbre precisará do apoio dos colegas para ser reconduzido ao posto. Há dúvidas, ainda, se essa intrincada articulação pode substituir uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) sobre o assunto, que, para ser aprovada, teria de contar com 308 votos na Câmara e 49 no Senado, em duas votações.

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Maia tem dito que não será candidato sob nenhuma hipótese. “Mas se ele puder ser, e quiser, eu o apoiarei”, afirmou o deputado Elmar Nascimento (DEM-BA), um dos pré-candidatos à cadeira de presidente da Câmara. “Esse é um tema que só devemos discutir depois das eleições para prefeito e vereador, em novembro. Precisamos agora focar na retomada do crescimento pós-pandemia”, completou Elmar.

Há três blocos informais na disputa pelo comando da Câmara. Um deles, em torno de Maia, abriga o DEM, o PSDB, o MDB, a parte do PSL rompida com Bolsonaro e o Cidadania, entre outras siglas. Uma segunda ala, hoje chamada de “Centrão raiz” ou “Centrão bolsonarista”, é dirigida pelo deputado Arthur Lira (AL) e reúne partidos como Progressistas, PL, PSD e Republicanos. O terceiro é formado pela oposição, com o PT, PSB, PDT, PSOL, PC do B, PV e Rede, além de outros “desgarrados” que podem se compor com a esquerda. É esse campo que, pelos cálculos levados a Maia, tem 133 votos e, para onde pender, define o futuro do embate no Salão Verde do Congresso.

Isolado nas principais campanhas para as prefeituras, o PT do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva – com a maior bancada – passou agora a ser “objeto do desejo” na Câmara. “Não acertamos nada de apoio nem de candidatura, mas nosso objetivo é impedir que Bolsonaro controle a presidência da Câmara”, resumiu o deputado Carlos Zarattini (PT-SP).

“No momento em que o Brasil vive, ter um presidente que diga amém para o governo é um péssimo negócio para a Câmara e aceitamos discutir com o bloco do Rodrigo uma proposta de unidade que preserve a autonomia do Legislativo”, emendou José Guimarães (PT-CE).

No cenário atual, a tendência é que a centro-esquerda se una ao “projeto Maia”. Mas há resistências. O deputado Alessandro Molon (PSB-RJ) corre por fora e seu grupo avalia que uma aliança com Maia, se houver, só deve ser firmada em eventual segundo turno.

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Do lado do Centrão, o candidato que mais se movimenta é Arthur Lira. O deputado alagoano se atrelou ao governo quando Bolsonaro rachou o grupo e começou a distribuir cargos para barrar o impeachment. Vice-presidente da Câmara, Marcos Pereira (Republicanos-SP) também quer entrar no páreo e conta com respaldo da bancada evangélica. Os dois buscam o aval de Bolsonaro.

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Na prática, porém, o Centrão está fraturado. O relator da reforma tributária, Aguinaldo Ribeiro (Progressistas-PB), tem a simpatia de Maia, assim como o presidente do MDB, Baleia Rossi (SP), e o PL apresenta dois postulantes: os deputados Capitão Augusto (SP) e Marcelo Ramos (AM).

“Vou começar a viajar em agosto para todos os Estados porque quero apresentar minha plataforma pessoalmente aos colegas”, contou Capitão Augusto, que preside a Frente Parlamentar da Segurança Pública. “Não tem como fazer campanha virtual. Tem de ser olho no olho”.

Com trânsito entre partidos de oposição, Ramos – que está no primeiro mandato e já foi filiado ao PCdoB – desconversou quando questionado sobre a caça aos votos. “Não é hora de antecipar a sucessão. Isso só atrapalhará o País que tanto precisa da Câmara funcionando com unidade”, disse ele. O deputado observou, porém, que os adversários do presidente estão com a faca e o queijo na mão. “A oposição definirá a eleição se decidir fazer uma composição e não sair com candidaturas isoladas, como fez na última disputa”.

Bolsonaro já percebeu esse jogo e avisou que não entrará no embate do Congresso. Como se sabe, trata-se apenas de retórica oficial. Mesmo assim, os movimentos do Planalto precisam ser sutis. Dono de estilo conflituoso, Bolsonaro foi aconselhado por auxiliares a evitar briga com Maia, nos últimos meses do deputado à frente da Câmara, para impedir a repetição do que ocorreu em 2015.

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À época, a então presidente Dilma Rousseff apoiou Arlindo Chinaglia (PT-SP) no ruidoso confronto com Eduardo Cunha (MDB-RJ). Cunha venceu a eleição para a presidência da Câmara no primeiro turno e, dez meses depois, aceitou pedido para abertura de impeachment contra Dilma.

Apesar de Bolsonaro sempre dizer, nas mais variadas situações, que “um raio não cai duas vezes no mesmo lugar”, a superstição vira e mexe bate à porta do atual inquilino do Planalto.

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