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Morre Olavo de Carvalho, ‘guru’ do bolsonarismo, aos 74 anos

O escritor estava internado na Virgínia, nos Estados Unidos; morte foi lamentada pelo presidente Jair Bolsonaro

Foto do author Renato Vasconcelos
Por Renato Vasconcelos e Jessica Brasil Skroch
Atualização:

Considerado o “guru do bolsonarismo”, Olavo de Carvalho morreu nesta segunda-feira, 24, nos Estados Unidos aos 74 anos. A notícia foi divulgada em seu perfil oficial nas redes sociais e a causa da morte não foi revelada. Ele sofria de problemas cardíacos e, em 15 de janeiro, foi diagnosticado com covid-19. O governo federal emitiu nota oficial para lamentar a morte, e o presidente Jair Bolsonaro decretou luto de um dia, após afirmar que o Brasil perdeu um dos “maiores pensadores de sua história”.

Foi a segunda vez que Bolsonaro decretou luto oficial desde o início do governo. A primeira foi em junho passado, quando morreu o ex-vice-presidente Marco Maciel. Na ocasião, o luto durou três dias.

Olavo de Carvalho faleceu na noite de segunda-feira, 24, nos Estados Unidos Foto: TV Escola

Cercado de ex-alunos do escritor, Bolsonaro abraçou parte de suas teorias para se eleger, em 2018, e desde então alimenta seguidores que, assim como Olavo, são adeptos do “politicamente incorreto”, da “luta contra o marxismo cultural” e da preocupação com o “ensino da ideologia de gênero” nas escolas. Ideias que, segundo analistas ouvidos pelo Estadão, se perpetuarão entre os representantes da chamada “nova direita”.

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Nascido em Campinas, no interior paulista, Olavo morava nos Estados Unidos desde 2005. Segundo a publicação feita pela família, ele faleceu na região de Richmond, na Virgínia, onde estava hospitalizado. “O professor deixa a esposa, Roxane, oito filhos e 18 netos. A família agradece a todos os amigos as mensagens de solidariedade e pede orações pela alma do professor”, informou o texto.

A nota do governo federal afirmou que Olavo de Carvalho foi um “intransigente defensor da liberdade” e deixa como legado “um verdadeiro apostolado a respeito da vida intelectual”. Pelas redes sociais, Bolsonaro classificou o escritor como um “farol para milhões de brasileiros”. Em 2019, ele concedeu a Olavo o grau máximo da Ordem Nacional de Rio Branco, de Grã-Cruz, indicado para autoridades de alta hierarquia, como o vice-presidente Hamilton Mourão e ministros.

A carreira do autointitulado filósofo, apesar de nunca ter concluído graduação na área, começou longe da política. Na década de 1980, ele ministrava cursos de astrologia e oferecia serviços com base na análise de mapa astral. Ao longo da década seguinte, começou a desenvolver ensaios sobre literatura, filosofia e ciência política, publicando artigos em jornais e escrevendo prefácios de livros.

Em 1996, publicou o seu primeiro sucesso editorial, O Imbecil Coletivo: Atualidades Inculturais Brasileiras, em que desenvolve uma crítica ao meio intelectual brasileiro. Outra publicação popular foi O Mínimo que Você Precisa Saber para não Ser um Idiota, coletânea de artigos publicada em 2013.

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Influência

Influente entre os filhos do presidente, especialmente a partir de 2015, quando intensificou sua presença na internet por meio de lives, Olavo chegou a indicar ministros no início do governo: Ricardo Vélez Rodríguez e Abraham Weintraub, os dois primeiros a comandar o Ministério da Educação, e Ernesto Araújo, que foi chanceler até março de 2021.

Mas o poder da chamada “ala ideológica” foi sendo reduzido ao longo da gestão. Olavo rompeu com Bolsonaro em meados de 2020, quando publicou um vídeo direcionando críticas e xingamentos ao governo. O escritor dizia estar decepcionado com o presidente por considerar ter sido usado por ele como uma espécie de “garoto propaganda”. Em dezembro, comentando a eleição deste ano, Olavo afirmou que a “briga já estava perdida”, mas que votaria em Bolsonaro por “falta de opção”.

Para o filósofo Pablo Ortellado, professor de Gestão de Políticas Públicas da EACH-USP, o alcance das ideias de Olavo ganhou força a partir das redes sociais e cursos online. “Os lugares tradicionais de formação política, que eram os sindicatos e o movimento estudantil, estavam ocupados pela esquerda. Olavo fez um trabalho de militante político. Fez um esforço de proselitismo popular, por meio de ações na internet, em sites e pelo Orkut, e depois com o curso online de filosofia, e foi formando pessoas que estavam fora desses ambientes. Ele é o pai espiritual dessa nova direita”, afirmou Ortellado. “Uma direita que é populista, antissistêmica, antiglobalista, antidireitos humanos, antifeminismo e antiLGBT.” 

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“Olavo de Carvalho teve uma atuação múltipla, em diferentes frentes, conseguindo se comunicar com o jovem secundarista e a pessoa comum que busca se informar sobre política e atualidades, até círculos muito mais especializados. As ideias dele têm uma presença no Judiciário, na administração pública, em determinados círculos militares”, disse a antropóloga Isabela Kalil, professora da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo. Segundo ela, o escritor se diferencia da “direita tradicional e histórica” na cena política brasileira e está inserido na “nova direita” que se destaca na década de 2000-2010.

Para o cineasta Josias Teófilo, autor do documentário Jardim das Aflições, sobre Olavo, a influência do escritor tende a aumentar. “E eu acho que isso favorece muito Bolsonaro, porque a gente vê a quantidade de gente que está comemorando a morte do Olavo e essa coisa vai ter um efeito tremendo de união da direita.”

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