O teste do sereno

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Por Dora Kramer
Atualização:

Até onde alcança a vista do PMDB, a nomeação de Edison Lobão para o Ministério das Minas e Energia está sacramentada. Tudo certo, falta só marcar a data da posse, não restam dúvidas no partido quanto à retomada da pasta perdida quando surgiram denúncias de corrupção contra o titular anterior, Silas Rondeau. E por que, então, o presidente Luiz Inácio da Silva não oficializou o gesto na quinta-feira mesmo, quando confirmou para a cúpula do partido a indicação, deixando o anúncio para a próxima quarta-feira? Porque - este é o entendimento vigente entre os pemedebistas - quer aproveitar esse intervalo para ver se não aparece nada, nenhuma denúncia que possa comprometer a presença de Lobão no ministério. O PMDB não esquece, e o governo também não, o episódio Odílio Balbinotti. Confirmado para o Ministério da Agricultura no dia 15 de março de 2007, com posse marcada para a semana seguinte, três dias depois Balbinotti foi convidado a desistir por causa de acusações de uso de funcionários como laranjas em operações junto ao Banco do Brasil. Que os dirigentes pemedebistas tenham conhecimento, Lobão não carrega pendências dessa natureza; mas, como diz um deles, pelo sim, pelo não, o presidente achou melhor deixá-lo uns dias exposto à chuva, ao sol e ao sereno. Um teste que não deixa de ser esquisito, porque natural seria que o governo já tivesse a certeza sobre a lisura da biografia dos postulantes a integrar a equipe presidencial antes de aceitar a indicação dos nomes. A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) existe também para fazer triagem sobre currículos. Não funcionou no caso de Odílio Balbinotti, cuja folha corrida foi revelada pela imprensa, obrigando ao recuo. A espera agora, em tese, revelaria apenas prudência, não significasse também uma demonstração explícita de desconfiança a priori. O PMDB não vê as coisas assim, alega que todos os presidentes fazem isso quando deixam os nomes de indicados circulando alguns dias. Só não assumem a motivação. No entendimento da cúpula do partido, só uma descoberta de última hora poderia comprometer a indicação. As críticas à entrega do ministério a um político em clima de crise de energia não preocupam. O PMDB tem na ponta da língua o revide. Diz que nos últimos cinco anos o controle "dos técnicos" sob o comando de Dilma Rousseff não impediu que a situação se agravasse. O problema, portanto, não estaria no ministro, mas na administração e coordenação do setor. Em público, no entanto, a impertinência não transpõe os limites da boca fechada onde não entra mosca e, por segurança, de onde oficialmente só sai o discurso de que, diga o que disser, pense o que pensar, a ministra tem toda a razão. Flor do recesso O presidente da República se reúne com deputados e senadores para discutir cortes no Orçamento, que saem da conversa falando em recriação da CPMF com uma alíquota menor e embrulhada no invólucro dourado da reforma tributária. Quem vê a cena, chega à conclusão de que há um jogo combinado, que o governo virou, mexeu e foi ao ponto desejado: ter de volta o dinheiro perdido no monumental tropeço de fim de ano. Mas cabeças realistas da Esplanada dos Ministérios, experientes nas questões de Congresso e velhas de guerra nas artes e nas manhas da administração do Orçamento, tratam de desfazer a primeira impressão. Analisam que a idéia de ressuscitar a CPMF é daqueles assuntos chamados de flores do recesso quando não se quer dar a eles o nome correto: falta de assunto resultante da ausência de solução. Um mero sinal de agonia com a possibilidade de cortes nas emendas parlamentares da base governista em ano eleitoral e a impossibilidade de criar um conflito aberto com a oposição, restringindo a passada da foice às emendas de quem votou contra a CPMF e criou a situação. Como ninguém quer cortar coisa alguma e, diante disso, não há o que fazer, opta-se por dizer qualquer coisa, por menos condições que a proposta tenha de prosperar. Não que o governo não quisesse ter de volta os bilhões. Adoraria. Se pudesse, ressuscitaria a CPMF, embolsaria os aumentos do pacote de ano-novo e ainda sairia dizendo que fez a reforma tributária. Mas a realidade nua a crua é que o governo não tem como fazer isso. Por medida provisória, corre o alto risco de perder de novo. Por projeto de lei de iniciativa do Legislativo, Lula termina o governo e não aprova. Fará o quê, então? Nada diferente do que tem sido feito até agora: simula negociações com o Congresso para adaptar contabilmente o Orçamento à ausência dos R$ 40 bilhões da CPMF, tenta aprovar o pacote, faz discursos atribuindo todos os males do ajuste à oposição. Muito barulho por quase nada, pois o Orçamento autoriza, mas não obriga o governo a fazer as despesas previstas. Querendo cortar, basta fechar a torneira na boca do caixa e arbitrar quem, quando e quanto pode gastar.

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