O papel do general Ramos no governo Bolsonaro

Ministro deve evitar a radicalização diante das frustrações do governo em lidar com os limites da política e da Constituição

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colunista convidado
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Por Marcelo Godoy
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Caro leitor,

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Há um general que não foi até agora alvo da rede bolsonarista na internet apesar de sua proximidade com o presidente da República. Trata-se de Luiz Eduardo Ramos. O ministro-chefe da Secretaria de Governo é mais um amigo que o presidente Jair Bolsonaro mantém no Palácio do Planalto. Ramos nunca escondeu a amizade, nem mesmo em sua redes sociais quando ainda era o comandante militar do Sudeste.

A mensagem de despedida que lhe foi endereçada pelo comandante do Exército, Edson Pujol, mostra o apreço com que o general é visto por seus pares. Pujol destacou as habilidades políticas do subordinado no momento em que Ramos deixava o Exército para assumir uma trincheira no Planalto. "Rezem por mim", disse então o general aos seus convidados, quando foi receber o vice-presidente Hamilton Mourão - Bolsonaro chegaria pouco depois para a solenidade de passagem de comando do Sudeste.

Luiz Eduardo Ramos Foto: MARCOS CORRÊA/PR

Ramos - até mais do que o general Augusto Heleno - é dos poucos oficiais nas Forças Armadas que apostavam em Bolsonaro desde sempre. Fez parte do grupo do Alto Comando que se manifestou politicamente em 2018, a exemplo de seu então chefe e agora colega de governo, Eduardo Villas Bôas. Acompanhou Bolsonaro no hospital após a facada e esperava ansioso cada pesquisa eleitoral para ver as chances do candidato do PSL.

Por conhecer o presidente tenta convencer a todos que o comportamento de Bolsonaro não é um problema para o País. E afirma que o amigo é uma pessoa autêntica. Sua autenticidade e transparência seriam índice de lealdade. Bolsonaro seria incapaz de dizer uma coisa e fazer outra, como outros que passaram no cargo conforme o general disse ao Correio Brasiliense. Se alguém censura as besteiras ditas pelo primeiro mandatário, o general rememora as bobagens ditas por Lula e Dilma. E lembra que o presidente não é um acadêmico. De fato, isso ele não é.

Agora ministro, ele defende a distribuição de cargos e a liberação de recursos para as emendas dos parlamentares como fatos normais da política. Seria a forma legítima de dividir o poder com os aliados que podem contribuir com o governo por meio de obras e de profissionais capacitados para funções que devem se preenchidas. O ministro, portanto, não demoniza a política nem fala em novo ou em velho para se referir a deputados e senadores, mesmo quando estes podem desagradar o governo.

Ao tirar o casaco de general, Ramos vestiu rapidamente o do político. Queimou seus navios, como disse, e agora vincula sua sobrevivência no futuro do governo. Mas se alguém apostar nele para tutelar Bolsonaro e fazer o que Paulo Guedes, Sérgio Moro ou Augusto Heleno não conseguiram, pode tirar o cavalo da chuva. Bolsonaro não pode ser tutelado. Ele gosta de dizer que não é um banana, ainda que às vezes isso signifique afrontar as instituições, como o Ministério Público Federal.

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O problema é que o exercício do poder não se limita ao ato de mandar. Ramos não controlará o chefe. Mas pode fazê-lo aprender a ouvir? Devia tentar ao menos. Primeiro, porque nem todos que se opõem ao governo são desonestos ou comunistas. Depois, porque o presidente deve ouvir alguém que não seja um turibulário ou um desmiolado, como a turma do filho Carlos e a do professor de cursos online Olavo de Carvalho. Se evitar a radicalização do governo diante das frustrações do bolsonarismo em lidar com os limites da política e da Constituição, Ramos terá cumprido seu papel. A democracia e as instituições serão preservadas. E terá valido a pena queimar seu navios.

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