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Opinião|O mundo de sempre

A crise na Ucrânia abrange questões fundamentais para o futuro das relações internacionais

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Atualização:

O que Vladimir Putin está fazendo com a Ucrânia equivale a um choque elétrico em quem pensa e acompanha relações internacionais. Cobri para o Estadão a queda do Muro de Berlim, em 1989, e confesso que também fui contagiado pelo sentimento geral de que ali nascia um “mundo melhor”.

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Era entendido como um mundo no qual não mais se tolerariam mudanças de fronteiras pelo emprego da força bruta, e no qual os Estados teriam soberania para fazer escolhas. A esse “mundo melhor” o fotógrafo Hélio Campos Mello e eu assistimos na linha de frente quando ampla coligação internacional, apoiada inclusive por Moscou e comandada pelos americanos, expulsou em 1991 do Kuwait o exército invasor do ditador iraquiano Saddam Hussein

Seria o tal “fim da História”, ou a predominância de um sistema internacional que coroava a ordem liberal liderada pelos Estados Unidos desde 1945. No fundo, nossas vidas de repórteres empolgados com a ação, as violentas emoções e nossas experiências de combate em primeira mão acabaram tornando difícil entender qual mundo ali na verdade continuava.

Soldado ucraniano descansa no front de Trokhizbenka, em 2 de fevereiro. Foto: Tyler Hicks/The New York Times

De Tucídides (Guerra do Peloponeso, 411 a.C.) a Hans Morgenthau (Politics Among Nations”, 1949), o pai da moderna disciplina das relações internacionais é o mundo descrito pelas relações de poder e emprego de força entre as potências. Para adeptos da escola do hiper-realismo, como Henry Kissinger, não existe outra coisa entre países senão o desejo por segurança e, em consequência, a luta pelo poder.

Nesse sentido, importam pouco sistema econômico, crenças religiosas ou filosofias políticas e ideológicas de cada potência – mas, sim, seu “interesse nacional”, subordinado, em primeiro lugar, à segurança. Note-se que é exatamente esse conceito, o da “segurança indivisível”, que os russos estão colocando em primeiro plano nas negociações em torno da crise da Ucrânia.

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Não é à toa que se “desenterrou” artigo de Kissinger de 2014 no qual ele já antecipava que a solução da crise da Ucrânia é a submissão (gostem os ucranianos ou não) desse país a um estado de “neutralidade” imposto pela Rússia. E foi tão lido o artigo da semana passada do historiador Noah Harari, segundo o qual a crise da Ucrânia levanta como questão central saber se as relações internacionais evoluem para evitar (e não viver de) guerras.

É uma pergunta crucial cuja resposta vai sair da maneira como China (e Rússia) vão moldar a ordem internacional na qual os Estados Unidos não mandam mais sozinhos. A História humana é a da mudança para melhor (Harari) ou a da inevitabilidade da tragédia (Kissinger)? Até aqui, os fatos estão dando razão a Kissinger.

*JORNALISTA E APRESENTADOR DO JORNAL DA CNN

Opinião por William Waack

Jornalista e apresentador do programa WW, da CNN

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