O mito e a meta

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Por Redação
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José Roberto Arruda anda conversador e politicamente bem ativo depois que emergiu do fundo do poço da renúncia do mandato por violação ao painel eletrônico do Senado ao posto de governador do Distrito Federal, eleito no primeiro turno. Anda também citado nas listas de prováveis candidatos a presidente daqui a três anos, freqüentadas por gente como o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral Filho, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, o deputado Ciro Gomes, a ex-senadora Heloísa Helena e outros menos cotados a entrar na roda onde por enquanto só há dois assumidos: José Serra e Aécio Neves. Como de praxe, Arruda nega a hipótese, o que, nesta altura do campeonato ainda não iniciado, não influi nem contribui. Ora, ora, se é assim, então por que falamos de Arruda e de candidaturas agora, se há assuntos mais urgentes em pauta? Porque ele tem circulado por todos os cantos partidários onde se armam as primeiras articulações do jogo de 2010 e sua preliminar em 2008, foi do PSDB, integra o DEM, se dá muito bem obrigado com o presidente Luiz Inácio da Silva, acompanha de perto as movimentações de todos eles, tem uma visão crítica do mundo político e fez outro dia uma observação pertinente sobre a relação entre a popularidade de Lula e a força eleitoral do PT decorrente dela na sucessão presidencial. "Mito, ali, só tem um", disse, a propósito da animação dos petistas com as pesquisas de opinião, acreditando que um Lula forte no governo significa também um PT forte na eleição. A constatação sucinta do governador combina com outras análises feitas por políticos de vários matizes. Todos ligeiramente desconfiados de que se o vento continuar soprando a favor, o presidente poderá vir a se interessar vivamente pela possibilidade de um terceiro mandato já. Isso principalmente se não houver uma boa viravolta no processo de desmoralização parlamentar e na crescente ojeriza que a sociedade vem desenvolvendo por políticos de um modo geral. Sendo Lula o único dono da prerrogativa da identificação mítica com parcelas extensas do eleitorado, o PT não teria com outro candidato grandes chances de assegurar a Presidência da República. O presidente, então, jogaria com duas opções: a tentativa de mudar a Constituição via plebiscito, para poder concorrer em 2010 ou voltar em 2014, participando da próxima eleição como fortíssimo cabo eleitoral patrocinador de muitas candidaturas amigas. Nessa estratégia, a idéia seria pulverizar o eleitorado de forma a retirar consistência do adversário - no caso, o candidato do PSDB - e não incentivar também uma grande liderança popular que no campo governista possa vir a fazer sombra a Lula e, assim, deixar o caminho bem asfaltado para o retorno dele em 2014. O problema é que na política, assim como na vida, as coisas não são esquemáticas e a realidade não costuma ser muito obediente aos desejos. Em 2002, o então presidente Fernando Henrique Cardoso também não chorou lágrimas de esguicho com a derrota de seu candidato, José Serra, e até imaginou que com a vitória do PT ele e o PSDB se fortaleceriam aos olhos do eleitorado na comparação. Não deu certo. Não só porque Lula soube manejar bem a ilusão da chegada da classe operária ao paraíso e se apropriar dos benefícios do governo anterior deixando ao antecessor só a conta dos malefícios, mas principalmente porque o PSDB se revelou inepto para se afirmar do lado positivo do contraponto. Parte dos tucanos caiu no conto da aliança social-democrata com o PT, parte ficou com medo da popularidade de Lula - como bem disse outro dia no Senado o líder Arthur Virgílio, "o PSDB não consegue pôr 200 pessoas na rua" - e o partido dedicou-se mais ao exercício da autofagia do que em dizer à sociedade quais são mesmo seus planos para o País. Por essas e algumas outras, Lula não arriscará seu projeto futuro deixando correr frouxo o processo eleitoral de 2010 - como fizeram os tucanos em 2002 -, na expectativa de que uma eventual vitória da oposição signifique apenas um interregno para a volta em 2014. O PT, quando o assunto é poder, não brinca em serviço. É como avisou Lula ao acusar seus críticos de brincarem com a democracia: em matéria de recreações de rua, a oposição matricula-se agora numa escola onde ele há tempos é professor. A conferir Silvério Zebral, consultor-residente no Brasil do Comitê Internacional para a Democracia em Cuba - entidade que reúne opositores de Fidel Castro no exterior - antecipa como será, no seu entender, o desenrolar do caso dos pugilistas Guillermo Rigondeaux e Erislandy Lara. "Fidel organizará um espetáculo para transformar as deserções em propaganda política pró-regime. Não se espantem se nos próximos dias um deles surgir enrolado na bandeira, pedindo perdão e tecendo loas à generosidade do comandante. Assim funcionam os regimes totalitários: primeiro o controle, depois o medo e, por fim, o perdão."

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