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O jogo do impeachment

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Por José Roberto de Toledo
Atualização:

O jogo do impeachment funciona mais ou menos assim. Os deputados abertamente a favor lançam movimento, fazem abaixo-assinado e encontram advogados desinibidos que formalizem o pedido – para dar uma cara de movimento da sociedade. Mas eles não têm os 342 votos necessários para derrubar a presidente. Nem têm certeza de com quantos podem contar na hora H. Os deputados sabem que, se o impeachment falhar, quem tiver se exposto pode ser retaliado. Por isso, os pró-impeachment montaram uma estratégia por etapas. Para ir sondando o terreno enquanto tentam somar apoios ao longo do processo. O primeiro passo é tentar emplacar a narrativa de que “ruim com impeachment (porque demora e pode haver reação, greves, conflito), pior sem ele”. Para tanto, tentam persuadir empresários e parlamentares que estão no muro de que o governo não conseguirá estabilizar a economia. Nem agora nem nunca. “Não podemos ficar do jeito que estamos por muito tempo”, traduz FHC. É condição necessária garantirem o fracasso do plano de ajuste fiscal apresentado pela equipe econômica. Nem precisam se esforçar muito, porque o governo tratou de colocar o carro na frente da récua. Em vez de fazer os cortes primeiro, para só então tentar recriar e aumentar impostos, subverteu a lógica, aumentou o atrito e ainda deu tempo para os adversários. Na política, a ordem dos fatores atrapalha muito o produto. Ao mesmo tempo, a vanguarda pressionará o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB), a dar logo uma resposta ao pedido de impeachment. Nada o obriga a responder, mas como Cunha poderia resistir a ter o mandato de Dilma Rousseff praticamente em suas mãos? Se ele se calar, nada acontece. Se ele indeferir, o recurso imediato da vanguarda será ao plenário. Quem tiver maioria simples leva. Será o primeiro teste real da força dos pró-impeachment. Contam seus votos e ainda criam fato político. Qual a chance de a oposição ganhar essa votação? Vai depender de quão atentos e mobilizados estiverem os governistas. Segundo o “Vai Passar?”, do Estadão Dados, se o PSDB e a minoria orientarem a favor, o PT e o governo orientarem contra, tudo fica nas mãos das lideranças do PMDB e do PSD. Eles são o melhor termômetro do que vai pela cabeça do plenário. Se ambos ficarem neutros, ou seja, liberarem suas bancadas, há 73% de chance de os pró-impeachment terem sucesso. Mas se PMDB e PSD forem contra, a chance de o pedido vingar é muito baixa. Se vencer essa primeira votação, o impeachment deixa de ser possibilidade e passa a ser uma probabilidade. Em poucas sessões a Câmara teria que decidir se abre ou não o processo contra Dilma. Abertura do processo implica afastamento automático da presidente e, na prática, a perda do mandato. O resto é formalidade. Collor renunciou após a Câmara aprovar a abertura. Mas essa segunda votação é muito mais difícil. O quórum é qualificado (seria melhor dizer quantificado, mas deixa estar). São necessários dois terços dos 513 deputados, ou 342 votos. Para chegar nesse número, os pró-impeachment precisariam ter o apoio explícito do líder do PMDB e, de preferência, do PSD – que assinaram “manifesto” a favor da soberania do voto popular e, na prática, contra o impeachment. Mas isso não quer dizer muito. Na frase atribuída a Magalhães Pinto, “política é como nuvem: você olha e ela está de um jeito, olha de novo, e já mudou”. Se forem de tempestade, então… A despeito do que digam, lideranças do PMDB e do PSD vão flutuar ao vento nos próximos dias e semanas. Se o ajuste econômico falhar novamente no Congresso, a ventania soprará contra Dilma e enfunará as velas da oposição.  Enquanto isso, o PMDB perde a cerimônia. Oficializa a doação oculta de campanha e ainda manda recado para a presidente: “se vetar, vai dar mais problema”. Rima com “coragem”, mas o nome é outro.

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