A Lava Jato está alarmada. A grande polêmica do dia é: a decisão dos ministros da 2.ª Turma do Supremo, tomada na sessão de terça, 27, contamina todas as investigações e ações, até a do sítio de Atibaia, na qual Lula pegou 12 anos e onze meses de reclusão na sentença de Gabriela Hardt?
A anulação da condenação de Aldemir Bendine põe de joelhos toda a operação, sua doutrina e seus primados? Aqui e ali, temos ouvido opiniões divergentes que se multiplicam. Uns apostam que o grosso das ações em que teria ocorrido o mesmo 'vício' - explorado pela defesa de Bendine - terá o mesmo fim. Outra corrente não acredita que a Lava Jato está a caminho do seu crepúsculo.
De concreto mesmo, a Lava Jato em Curitiba ostenta outras 49 ações penais julgadas nesses cinco anos de operação - além do processo contra Bendine. Investigadores da força-tarefa que abarca Ministério Público Federal, Polícia Federal e Receita temem que o emblemático caso Bendine coloque na fila outros 158 condenados em busca de revisão de suas sentenças.
Um procurador disse, taxativamente, que o entendimento do Supremo se aplica, sim, a praticamente todos os casos em que se verificou prazo comum aos réus colaboradores e aos não delatores. A Lava Jato está em alerta.
Seus mentores e protagonistas estão diante do 'fantasma' Bendine. Eles já trabalham com a hipótese de que a decisão do Supremo pode gerar anulação em série. Isso não estava no radar dos procuradores.
A votação Bendine ficou em 3 a 1. Esse voto dito vencido, do ministro Fachin, pode manter vivo o processo contra o ex-mandatário da Petrobrás? Podem os autos ainda serem submetidos ao crivo do Plenário da Corte?
Tudo pode na Justiça. Os recursos, os embargos e quetais estão aí para isso, para levar à eternidade as demandas. Mas não talvez no caso Bendine. A Súmula 606 do STF diz que não cabe habeas corpus originário para o Tribunal Pleno de decisão de Turma. É este o ponto central.
O fato é que as defesas de outros réus certamente já se preparam para adotar a mesma estratégia do defensor de Bendine.
Teve peso decisivo na anulação o detalhe de que o delator deve entregar seus memoriais (ou alegações finais) antes dos outros acusados, a quem ele incriminou, preservando, assim, a plena defesa dos delatados. A falha teria ocorrido quando foi aberto prazo a todos os acusados, ao mesmo tempo, para apresentação da peça final.
A Lava Jato reuniu, de um lado, um elenco de procuradores determinados no embate contra a corrupção que se instalou na Petrobrás. Profissionais destemidos e altamente qualificados, movidos pela disposição de pôr um fim no cartel de propinas que tomou de assalto diretorias estratégicas da petrolífera. Isso é fato.
E reuniu, também, de outra parte, grandes advogados, criminalistas igualmente preparados, estudiosos do Direito Penal, perspicazes por excelência. É o caso de Alberto Zacharias Toron, constituído por Bendine.
Toron, com seus mais de 30 anos de experiência, conhece todos os atalhos de uma ação, por mais pesada e robusta que seja a acusação - como é esta que levou Moro a condenar Bendine a 11 anos de reclusão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
A estratégia de Toron foi atacar uma questão de ordem processual, uma brecha que ele viu lá atrás, ainda na fase da entrega dos memoriais, e que sustentou seu pedido de habeas corpus já perante o Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, o Tribunal da Lava Jato.
Na Corte de apelações o alerta do advogado foi rechaçado. Ele não desiste e leva o caso adiante, até bater à porta da 2.ª Turma do Supremo. Três a um. Para Toron foi um 'ato de rotina' em sua missão. Ele avalia que o resultado do julgamento mostra que o Supremo reconhece o habeas corpus como instrumento de controle. "A fragilização desse instrumento de controle permitiu um sem número de práticas não conforme a Constituição e as leis", defende Toron.
Procuradores estão inquietos. Para eles, 'esse entendimento novo do Supremo que aplicam para trás é injusto'. Eles consideram que a decisão dos ministros, na prática, 'cria uma nova regra'. E que ela pode destruir a Lava Jato.