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Opinião|O Brasil velho, o Centrão e a ‘governabilidade’

Há uma coisa que não muda: o desfrute da máquina pública do País por interesses particulares

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Foto do author J.R.  Guzzo
Atualização:

O Brasil velho está mais vivo e forte do que nunca. Entra década e sai década, entra governo e sai governo, entra Constituição e sai Constituição, há uma coisa que não muda: o desfrute da máquina pública do País por interesses particulares. Tente esquecer um pouco as discussões sobre alta política que fazem parte do noticiário. O que vale, por trás do falatório, é o que está dizendo o Diário Oficial da União, na seção reservada às nomeações – é ali que vai se ver, no mundo das coisas reais, a quantas anda o governo. O do presidente Jair Bolsonaro, dado como a caminho do cemitério praticamente desde que tomou posse, apresenta um boletim de saúde que diz outra coisa: pela distribuição de cargos dourados na administração federal, o “acordo político” que estava faltando parece que já não falta mais.

O presidente Jair Bolsonaro na frente do Palácio da Alvorada Foto: Gabriela Biló/Estadão

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É o preço a pagar, no Brasil velho que não muda nunca, por esta coisa que os entendidos em política chamam de “governabilidade” –ou seja, a simples capacidade de se tomar alguma decisão que fique de pé e, sobretudo, de se manter o presidente no cargo para o qual foi eleito durante os quatro anos de seu mandado legal. Quer ficar vivo? Então conserve o aparelho do Estado do tamanho em que está, ou se possível maior ainda, e terceirize a sua exploração pelas gangues políticas conhecidas como “partidos”. Em troca de cargos na constelação estatal, elas formarão a sua “base de apoio” – e a sua vida de governante fica automaticamente mais segura. Os negociantes são os mesmos do século passado, ou até do outro.

Seu nome genérico do momento é “centrão”.

Demorou, mas a turma de sempre já começou a receber a sua parte: “Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação”, “Secretaria de Mobilidade Urbana”, “Departamento Nacional de Obras Contra a Seca”, etc. Que raio seria esse Fundo? Não interessa. O que conta é que o orçamento lá é de quase R$ 30 bilhões por ano; compram coisas como “kits escolares”, etc. Deu para entender? Outra coisa: fica mais claro, agora, porque todos os governos, não importa o que digam, têm horror a diminuir o tamanho do Estado. Se for diminuído, diminuem os cargos a serem traficados – e aí, como é que fica a “governabilidade”?

Talvez não exista um emblema mais revelador do Brasil velho, e da sua capacidade de resistir a tudo, do que esse infame DNOCS. Ele foi criado para “combater a seca” no Nordeste. É lógico que se tivesse feito o trabalho pelo qual o contribuinte paga já não haveria mais seca, no Nordeste ou em lugar nenhum. Mas esse negócio está aí desde 1909 (seu nome de nascença era “IOCS”, depois “IFOCS, até virar DNOCS a partir de 1945) e a seca continua. Se em 111 anos não resolveu o problema, por que iria resolver agora, com a direção do senador Ciro Nogueira? O destaque principal de sua biografia é ter sido denunciado ao Supremo Tribunal Federal em fevereiro último pela Procuradoria-Geral da República, por corrupção e lavagem de dinheiro – coisa de Odebrecht e Lava Jato.

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São nossas coisas, são coisas nossas.

Opinião por J.R. Guzzo

Jornalista escreve semanalmente sobre o cenário político e econômico do País

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