No centro de São Paulo, 290 mil imóveis estão à espera de moradores

Região tem casas e apartamentos vazios em número mais do que suficiente para atender a população que não tem onde morar

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Por Redação
Atualização:

A reocupação do centro tornou-se uma das principais discussões urbanas de São Paulo. Além de ser uma questão essencial para o problema da habitação na capital, levar de volta moradores à região, que contempla os bairros Bela Vista, Bom Retiro, Brás, Cambuci, Consolação, Liberdade, Pari, República, Santa Cecília e Sé, envolve ainda temas como transporte, segurança, serviços e atrações culturais.

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Degradado, o centro foi abandonado por famílias, empresas e governo. Dados do IBGE mostram que o local perdeu 179.584 habitantes ao longo das décadas de 80 e 90 – para se ter ideia, o Censo aponta que há 290 mil domicílios vazios na região, o que seria mais do que suficiente para criar casas e os apartamentos para atender as 130 mil famílias de São Paulo que não tem onde morar. Ao todo, o déficit habitacional conta ainda com outras 800 mil famílias quem vivem atualmente em situação de risco, em áreas precárias ou em terrenos irregulares

Entre 2000 e 2010, em um movimento iniciado especialmente a partir de 2006, a região começou a ter um retorno tímido da população, mas ainda assim um retorno: 65.485 voltaram a habitar a área central da cidade. Com o aumento no número de restaurantes, cafés, bares e lojas na região, aliado à uma infraestrutura ímpar, o próprio mercado imobiliário passou a ver a região com outros olhos. Hoje, há exatos 22 prédios residenciais em construção no centro, o que pode levar ao local, ao longo dos próximos quatro anos, mais de 6 mil moradores.

Entre essas pessoas que voltaram a morar no centro está Maria Aparecida Ferreira. Apesar das facilidades de acesso, ela reclama de questões como insegurança, falta de iluminação e, especialmente, os altos custos. Segundo o Sindicato da Habitação (Secovi-SP), o preço médio do aluguel de um imóvel com um dormitório no centro, caso da moradia de Maria Aparecida, é R$ 1.454,20. Já na chamada zona leste B, onde a assistente administrativa morou nos últimos anos, alugar um apartamento de um quarto não sai por mais que R$ 796,95, quase metade.

Da parte pública, no entanto, a revitalização do centro ainda caminha a passos miúdos. A principal proposta da gestão do prefeito Gilberto Kassab (PSD), a "Nova Luz", nem teve o edital para sua licitação de R$ 1,1 bilhão publicado. Nos últimos três anos, a projeto enfrentou liminares da Justiça e protestos de lojistas. Outra ideia da Prefeitura é o Renova Centro, programa lançado em 2009 que pretende destinar mais de 60 edifícios para moradia popular, totalizando 3 mil unidades. Até agora, nenhum prédio foi entregue. Segundo a Secretaria da Habitação, há 16 prédios em obras, sendo que apenas um deverá ser inaugurado até dezembro e os outros não contam nem com previsão de conclusão.

Para especialistas, o governo deveria mais do que promover moradias de interesse social para as famílias de baixa renda, criar uma estratégia que facilite o acesso dessa população às unidades produzidas. "Essas famílias não têm renda suficiente para comprar esses imóveis e, por isso, é preciso adotar novas formas de acesso", acredita o urbanista Kazuo Nakano, técnico do Instituto Polis. Para ele, a elevação na renda e a maior oferta de créditos imobiliários deveria ajudar a reurbanizar o centro. "As pessoas que conseguem ter uma melhor condição econômica e um emprego com salário fixo acabam decidindo morar no centro, que é um local que permite acessibilidade para todas as partes da cidade."

Professor de história da urbanização da Faculdade de Arquitetura da USP, o urbanista Renato Cymbalista não vê em políticas macro a solução para a questão do despovoamento da região. "Precisamos de uma política de adensamento quadra a quadra, com ações específicas para cada local". Segundo ele, uma boa ideia para o governo seria incentivar a construção de unidades habitacionais sem garagem, o que diminui o valor dos imóveis e permitiria um acesso mais facilitado da classe média.

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Depoimento. "Morava em Cangaíba, na zona leste, mas resolvi vir para cá (Rua Helena Zerrener, na Sé) há seis meses por causa do acesso. O trânsito para chegar aqui me irritava muito. Já cheguei a descer do ônibus depois de 40 minutos parado no congestionamento, ir a pé até algum local menos complicado e pegar outra condução para terminar de chegar ao trabalho. Hoje faço praticamente tudo à pé. Mas apesar da facilidade de acesso, aqui é ruim em algumas questões, como limpeza, iluminação, segurança. Aqui também é tudo mais caro. Meu custo de vida dobrou, entre aluguel, despesas e gastos com comida", Maria Aparecida Ferreira. 

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