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''''Não ficou demonstrado que a ONG é sempre necessária''''

Para Rossi, governos não devem transferir tarefas que podem executar e são responsáveis por eventuais irregularidades

Por Ricardo Brandt
Atualização:

A responsabilidade sobre as irregularidades em contratos entre o poder público e entidades do terceiro setor é de prefeitos e governadores que concederam os recursos. A afirmação é do diretor-geral do Tribunal de Contas do Estado (TCE) de São Paulo, Sérgio Rossi, um dos autores do aditamento 04/05 - que criou critérios mais rígidos de fiscalização nesses tipos de contratos. Só em 2007 foram abertos 1.891 processos sobre o tema, conforme revelou ontem o Estado. Leia a seguir os principais trechos da entrevista. De quem é a responsabilidade sobre problemas que ocorram nos contratos com as organizações não-governamentais? Não tenho dúvida nenhuma de que é o concedente (o governo ou a prefeitura). Ele é o chamado controle interno que a Constituição diz que deve estar entrelaçado com o controle externo, que somos nós. Eles é que sabem com quem estão fazendo negócio. Vou chegar e encontrar uma prestação de contas de um recurso que foi dado para determinado programa e eu vou ver se os documentos são legítimos. Agora é que estamos dando passos à frente para ver se a entidade está lá, como é que funciona, que resultado deu, se as crianças estão tendo tratamento dentário que foi dito que ia ter. Ou seja, qual o produto decorrente do recurso concedido à organização não-governamental. Qual era o principal problema nas fiscalizações do TCE em relação a essas entidades? O concedente não tinha responsabilidade. Dizia "não prestou contas" e pronto. Aí tínhamos que buscar, ver quem é, onde estava. Então decidimos: você deu, você tem a responsabilidade de dizer onde gastou. O TCE tem condições de fiscalizar todas as entidades? Infelizmente não é possível. O universo de entidades não nos permite isso. Mas nós passamos a exigir da auditoria uma visita. Já tivemos a surpresa de ir ao local e a entidade havia fechado. Os convênios com entidades do terceiro setor são feitos totalmente sem critérios? Não diria elaborado sem critério. Nosso aditivo exige programa de trabalho proposto pela entidade e avaliado pelo poder público. Ou seja, primeira coisa: Trouxe um programa de trabalho? Ele é factível e viável? É, então dá dinheiro. Passo seguinte: Ele foi cumprido? Essas exigências estão obrigando o concedente a saber que ele terá uma enorme responsabilidade. Nós encontramos situações onde não havia sequer a aprovação do programa de trabalho apresentado. O sr. é defensor, então, de critérios mais rígidos para a assinatura desses convênios? Acho que não. Acho que o primeiro ponto seria a demonstração inequívoca de que o poder público não está dispondo de condições de execução de programas que são de sua obrigação. Quando ficar demonstrado que há um estrangulamento da máquina, aí vamos transferir para uma entidade dessa natureza, com critérios objetivos, com avaliação do programa e dos resultados obtidos. O sr. avalia que se criou no País um vício de transferência de obrigações que são do Estado para as organizações do terceiro setor? Acho que não ficou devidamente demonstrado que sempre é necessária a intervenção de uma organização não-governamental. Não estou dizendo que elas não são importantes e que elas não devam existir. Mas elas devem ser reservadas para situações em que efetivamente a iniciativa delas supere aquilo que o poder público pode oferecer. De que forma os prefeitos e governadores podem ser responsabilizados no caso de irregularidades? No TCE, o limite de penalidade se resume à aplicação de multa, independentemente de eu poder julgar irregular a prestação de contas e considerar responsável solidariamente o concedente. Mas se eu sentir que há um vestígio de desvio, eu mando para o Ministério Público. Quem é: Sérgio Rossi É diretor-geral do Tribunal de Contas do Estado. Técnico do TCE desde 1970, é advogado e contador. Autor dos livros Lei de Responsabilidade Fiscal e Convênios Firmados: Aspectos de Interesse, entre outros.

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