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Na posse, Raquel promete respeito ao ‘processo legal’

Primeira mulher a comandar a Procuradoria-Geral da República assume com discurso contra a corrupção e ‘observância da lei e dos direitos individuais’; Lava Jato não é citada

Foto do author Beatriz Bulla
Por Beatriz Bulla , Rafael Moraes Moura e Carla Araujo
Atualização:

BRASÍLIA - Em seu discurso de posse, a nova procuradora-geral da República, Raquel Dodge, afirmou ontem que o País “passa por um momento de depuração”. Na fala de cerca de 15 minutos, ela citou a necessidade de respeito ao “devido processo legal”, defendeu a harmonia entre os Poderes e não mencionou a Operação Lava Jato ao discorrer sobre a corrupção.

“O País passa por um momento de depuração. Os órgãos do sistema de administração de justiça têm no respeito e harmonia entre as instituições a pedra angular que equilibra a relação necessária para se fazer Justiça em cada caso concreto”, afirmou Raquel, que é a primeira mulher a ocupar o cargo.

Raquel Dodge toma posse como procuradora-geral da República, ao lado do presidente Michel Temer Foto: Dida Sampaio

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A cerimônia de posse ocorreu em meio à tensão entre a Procuradoria-Geral da República e a classe política. Depois de denunciar o presidente Michel Temer duas vezes, o ex-procurador-geral Rodrigo Janot virou alvo de críticas diretas do Planalto. Janot não compareceu ao evento de sua sucessora, mas parte do seu grupo de confiança prestigiou a posse de Raquel.

No discurso, ela afirmou que o Ministério Público tem o papel de fazer com que “ninguém esteja acima da lei e ninguém esteja abaixo da lei”. Na mesa da cerimônia de posse estavam Temer e os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), todos alvos das investigações da Lava Jato. A presidente do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia, também integrou a mesa.

Raquel afirmou que o País “não tolera a corrupção”, mas deixou claro que o Ministério Público deve estar atento para outras áreas, como defesa de minorias e liberdade religiosa. A nova procuradora-geral da República pediu “igual ênfase” à função criminal e à defesa dos direitos humanos. “É preciso desempenhar bem todas estas funções, porque todas ainda são realmente necessárias. Para muitos brasileiros a situação continua difícil, pois estão expostos à violência e à insegurança pública, recebem serviços públicos precários, pagam impostos elevados, encontram obstáculos no acesso à Justiça, sofrem os efeitos da corrupção, têm dificuldade de se auto-organizar, mas ainda almejam um futuro de prosperidade e paz social.”

Papa. O papa Francisco foi mencionado pela nova procuradora-geral, que é católica praticante. “O papa Francisco nos ensina que a ‘corrupção não é um ato, mas uma condição, um estado pessoal e social, no qual a pessoa se habitua a viver. O corrupto está tão fechado e satisfeito em alimentar a sua autossuficiência que não se deixa questionar por nada e ninguém’”, disse Raquel, citando um livro do pontífice.

A única menção de Raquel a Janot foi um cumprimento pelo “serviço à Nação” prestado por seu antecessor. Os dois são desafetos dentro do Ministério Público Federal. Ao iniciar o discurso, ela destacou que 41 brasileiros já assumiram esse cargo e alguns “sob intensa tempestade”. 

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O dia da nova procuradora-geral da República ontem foi destinado a reuniões e assinatura de portarias para oficializar a nomeação de sua equipe. Depois da solenidade, ela se reuniu com Cármen Lúcia. As duas já haviam almoçado juntas e se encontraram na semana passada, quando Raquel entregou a Cármen pessoalmente o convite para a sua posse. 

‘Povo’. Ambas, por sinal, iniciaram seus discursos de posse de maneira semelhante. Em setembro do ano passado, ao assumir a presidência do STF, Cármen quebrou o protocolo e cumprimentou inicialmente “Sua Excelência, o povo”. Raquel, por sua vez, começou a fala de ontem dirigindo-se ao povo brasileiro, “de quem emana todo o poder”.

À noite, Raquel participou de jantar organizado pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR). As informações sigilosas da Lava Jato começaram a ser repassadas pela antiga equipe de Janot ao grupo de Raquel após a posse. A procuradora-geral encontra o gabinete com cerca de 450 processos para parecer ou encaminhamento – o que é o equivalente ao giro mensal de ações que chegam do STF à instituição.