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MP que desobriga balanços em jornais é ‘retribuição’ a tratamento da imprensa, diz Bolsonaro

'No dia de ontem eu retribuí parte daquilo que grande parte da mídia me atacou', disse o presidente; associação vê medida com 'estranhamento'

Por Ricardo Galhardo
Atualização:

ITAPIRA (SP) – O presidente Jair Bolsonaro afirmou nesta terça-feira, 6, durante inauguração de uma fábrica de remédios oncológicos em Itapira (SP), que a decisão de disponibilizar o Diário Oficial da União para que as empresas publiquem seus balanços anuais a custo zero é uma “retribuição” à forma como foi tratado pela imprensa durante a campanha eleitoral. 

“(Bolsonaro foi eleito) sem televisão, sem tempo de partido, sem recursos, com quase toda a mídia o tempo todo esculachando a gente. (Chamavam de) Racista, fascista e seja lá o que for. No dia de ontem eu retribuí parte daquilo que grande parte da mídia me atacou”, disse o presidente. 

Jair Bolsonaro assina mais uma MP;desta vez, a que permite que as publicações obrigatórias de empresas sejam divulgadas apenas no site da CVM Foto: Dida Sampaio/ ESTADÃO

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Até a Medida Provisória anunciada na segunda-feira, 5, por Bolsonaro, as empresas eram obrigadas a pagar pela divulgação dos balanços em jornais privados. Embora tenha associado a MP ao tratamento que recebeu durante a campanha eleitoral, Bolsonaro disse que não se trata de retaliação.

“Os empresários que gastavam milhões de reais para publicar seus balancetes em jornais agora podem faze-lo no Diário Oficial da União a custo zero. Não é uma retaliação contra a imprensa, é tirar o Estado de cima daquele que produz”, afirmou o presidente.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), criticou a MP, afirmando que ela pode ‘inviabilizar milhares de jornais” da “noite para o dia”.  Segundo Maia, os jornais impressos são instrumentos importantes de “divulgação de informação, da garantia da liberdade de imprensa, liberdade de expressão e da nossa democracia”. Maia sinalizou que o Congresso deve modificar a medida.

“Retirar essa receita dos jornais da noite para o dia não me parece a melhor decisão. Acho que a Câmara e o Senado poderão construir um acordo onde a gente olhe para o futuro, onde o papel jornal já não seja de fato relevante. Mas no curto prazo é difícil a gente imaginar nos próximos cinco ou seis anos, que, da noite para o dia, vamos inviabilizar milhares de jornais que funcionam informando a sociedade”, disse Maia.

Bolsonaro participou nesta terça-feira da inauguração da planta de farmoquímica oncológica do laboratório Cristália, em Itapira. Ele foi recepcionado por políticos locais, parlamentares, executivos e funcionários da empresa.

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Vestindo um jaleco branco, Bolsonaro posou para fotos e distribuiu abraços entre os participantes. Alguns o chamaram de “mito”. O presidente teve quase 80% dos votos no segundo turno da eleição presidencial em Itapira. 

ANJ vê medida com ‘estranhamento’

A Associação Nacional de Jornais (ANJ) divulgou nota na qual afirma ter recebido com “surpresa e estranhamento a edição da Medida Provisória 892”. “Além de ir na contramão da transparência de informações exigida pela sociedade, a MP afronta parte da Lei 13.818, recém aprovada pela Câmara e pelo Senado e sancionada pelo próprio presidente da República em abril. Por essa lei, a partir de 1º de janeiro de 2022, os balanços das empresas com ações negociadas em bolsa devem ser publicados de modo resumido em veículos de imprensa na localidade sede da companhia e a sua integralidade nas versões digitais dos mesmos jornais”, diz a nota da ANJ.

Bolsonaro lança dúvidas sobre lisura as agências de controle

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Durante inauguração, Bolsonaro também lançou dúvidas sobre a lisura da atuação das agências de controle. “Quanto tempo leva uma patente na Anvisa? Será que é excesso de zelo ou estão tentando criar dificuldade para vender facilidade?”, questionou Bolsonaro durante o evento.

O presidente lembrou que foi contra a criação das agências desde o primeiro momento, quando era deputado federal de posição ao governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB).

Segundo Bolsonaro, as agências, que têm autonomia em relação aos governos, “têm um grande poder para o bem ou para o mal” e sua intenção é substituir os comandos atuais por pessoas que tenham mais afinidade. O presidente comemorou indicação do almirante Antonio Barra Torres para o cargo. “A primeira foi a Anvisa. Colocamos lá um almirante”, disse Bolsonaro.

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O ataque às agências faz parte do discurso anti-burocracia adotado por Bolsonaro. O presidente lembrou que enviou mais de 100 medidas para o Congresso, grande parte delas com o objetivo de diminuir o tamanho do estado, mas muitas delas não foram votadas. Depois de elogiar “a maior parte” dos parlamentares, Bolsonaro voltou a dizer que embora respeite a configuração institucional determinada pela Constituição, só deve respeito à população que o elegeu. 

“Eu respeito as instituições mas devo a lealdade apenas a vocês, povo brasileiro, porque vocês tiveram a coragem de romper o continuísmo, o populismo a demagogia que este Brasil maravilhoso vivia nestes últimos 30 anos”, afirmou.

A declaração ocorre dois dias depois de o ministro Celso de Mello, decano do Supremo Tribunal Federal (STF), ter dito ao Estado que Bolsonaro não respeita a divisão entre os Poderes. Ao final do discurso, o presidente reiterou que será um governante “temente a Deus”, que respeita a “inocência das crianças em sala de aula” e que será contra qualquer “processo de legalizar drogas”. /COLABORARAM MARIANA HAUBERT E CAMILA TURTELLI

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