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Ministros debatem ''''organização criminosa''''

Legislação não tipifica como crime expressão usada em denúncia

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Por Fausto Macedo
Atualização:

O quarto dia do julgamento do mensalão no Supremo Tribunal Federal abriu polêmica sobre o crime de formação de quadrilha, uma das acusações que a Procuradoria-Geral da República imputa a 24 dos 40 supostos integrantes do esquema. Para Antonio Fernando de Souza, chefe do Ministério Público Federal e acusador do mensalão, o inquérito revela a ação de ''''uma sofisticada organização criminosa''''. Tecnicamente, porém, ele não teve como enquadrar os investigados nesse tipo de delito porque no Brasil não existe previsão em lei que tipifique tal conduta. Para contornar essa ausência legal, a saída da procuradoria foi recorrer ao artigo 288 do Código Penal, que define o crime de formação de quadrilha, punido com 1 a 3 anos de prisão - dosagem considerada branda demais pelos procuradores especializados em investigações sobre organizações que fraudam o Tesouro. Em sua acusação, de 136 páginas, o procurador-geral insiste no termo organização criminosa, mas na hora de formalizar a denúncia o fez com base no artigo 288 (''''associarem-se mais de 3 pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer crimes''''). Ele sustenta que o grupo era dividido ''''em setores de atuação que se estruturou profissionalmente para a prática de crimes como peculato, lavagem de dinheiro, corrupção ativa, gestão fraudulenta, além das mais diversas formas de fraude''''. Segundo Souza, ''''a organização criminosa era estruturada em núcleos específicos, cada um colaborando com o todo criminoso em busca de uma forma individualizada de contraprestação''''. Quando descreve a atuação do ''''núcleo político-partidário'''' da associação, ele aponta 4 nomes: ''''O núcleo principal da quadrilha era composto pelo ex-ministro José Dirceu, o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, o ex-secretário-geral Sílvio Pereira, e o ex-presidente do PT José Genoino.'''' O STF transformou em réus por quadrilha 10 acusados. ''''Não existe a figura do crime organizado no Brasil'''', anota o desembargador Celso Limongi, presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo. ''''É por isso que o órgão acusador se utiliza da alternativa que dispõe e denuncia os agentes por crime de quadrilha. Se não tiver lei não tem como imputar crime.'''' ''''Organização criminosa não tem definição legal no Brasil, portanto não pode ser enquadrada como delito'''', endossa o jurista Luiz Flávio Gomes. ''''Os conceitos são diferentes. Organização não está inserida no Código. O legislador deve aprovar lei para esse tipo de infração, com penas compatíveis com a gravidade da ação.'''' Gomes anota que as organizações agem com finalidade econômica. ''''Elas se caracterizam pela divisão de territórios e de tarefas, com regras de subordinação. Mantêm aproximação com o poder público, corrompem parlamentares e juízes. Quadrilha ou bando é coisa caipira, provinciana, até 4 pessoas que se juntam para furtar gado. A citação sobre organização nas denúncias do Ministério Público é indevida.'''' Segundo ele, acusações equivocadas surgiram a partir da adesão do Brasil ao Tratado de Palermo, em 2004, para combate à criminalidade organizada transnacional. ''''Pretendem que os conceitos do tratado tenham validade no Brasil, mas isso é impossível.'''' ''''Isso favorece sobretudo o autor intelectual do crime de corrupção na administração pública'''', alerta o promotor de Justiça Roberto Wider. ''''Na falta de um tipo penal adequado, o agente acaba enquadrado em crime menor.'''' O procurador da República Rodrigo de Grandis defende lei específica sobre organização criminosa ''''para acabar com essa discussão e enquadrar a conduta dos agentes com pena que deva ser substancialmente mais forte do que a prevista no artigo 288 do Código Penal'''' .

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