Ministro da Justiça manda PF investigar autores de outdoors críticos a Bolsonaro em Palmas

Peças comparavam presidente a "pequi roído" e defendiam impeachment

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Por Lailton Costa
Atualização:

O sociólogo e professor Tiago Costa Rodrigues é alvo de investigação da Polícia Federal por ter organizado a instalação de dois outdoors críticos ao governo de Jair Bolsonaro em Palmas, no Tocantins. Rodrigues criou uma vaquinha online e arrecadou R$ 2,3 mil usados na instalação das peças em agosto do ano passado. Um deles continha a frase "Cabra à toa, não vale um pequi roído. Palmas quer impeachment já" e o outro, "Aí mente! Vaza Bolsonaro, o Tocantins quer paz”. O dono da empresa contratada para o serviço, Roberval Ferreira de Jesus, também é alvo do inquérito. “Tempos sombrios que vivemos. Estamos vivendo um estado policialesco que utiliza do seu aparato para coagir livres manifestações populares como a nossa”, disse Rodrigues, que é dirigente do PCdoB local ao Estadão. Apesar de o caso ter sido arquivado originalmente por recomendação da Corregedoria Regional da PF e do Ministério Público Federal do Tocantins, o ministro da Justiça, André Mendonça, determinou a abertura do inquérito. 

Outdoor sobre o presidente Jair Bolsonaro Foto: Acervo Tiago Costa Rodrigues

O caso foi revelado pelo Jornal do Tocantins. A investigação começou em agosto do ano passado, após um simpatizante de Bolsonaro acionar a Polícia Federal com uma notícia-crime em que pedia a investigação dos dois pela Lei de Segurança Nacional. Comum no Tocantins, a expressão "pequi roído" se refere a algo sem valor.A Corregedoria Regional da PF e o Ministério Público Federal no Estado arquivaram o caso e comunicaram a decisão ao ministro da Justiça no final de outubro. Em dezembro, porém, Mendonça requisitou a abertura do inquérito ao diretor-geral da PF, imputando ao professor e ao dono da empresa de outdoor crime contra a honra do presidente. O sociólogo e o dono da empresa prestaram depoimento por videoconferência à delegada da PF Aline Carvalho Miranda em janeiro.

Outdoor sobre o presidente Jair Bolsonaro Foto: Acervo Tiago Costa Rodrigues

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Secretário de formação política do PCdoB no Tocantins, Rodrigues acredita que sua militância política influenciou a decisão do ministro da Justiça: “Estou sendo perseguido por ser professor, membro do Partido Comunista do Brasil e por divergir em todos os aspectos sobre a forma como esse governo tem tratado a saúde, a dignidade e a liberdade de seu povo. Esse tipo de ação autoritária é típica de governos fascistas”.

Advogado do professor, Edy Cesar dos Passos destacou que o Brasil é signatário da Carta das Nações Unidas e de diversos tratados internacionais sobre direitos humanos que estão sendo desrespeitados. “Esse governo mostra a total falta de interesse em manter compromissos em defesa da liberdade de expressão com outros países”, afirmou Passos. Por meio de nota, a defesa de Roberval Ferreira de Jesus alega que ele não pretendia ofender o presidente, e se limitou a prestar o serviço contratado, usando os arquivos originais entregues pelo cliente. “Cumpre ressaltar que o contrato de locação possui previsão expressa de que o locatário se responsabiliza pelo teor da publicidade nos outdoors." Os advogados Pedro Vitor Rabello e João Feliz Barbosa, que assinam o texto, informaram que a empresa também instalou outdoors para outros clientes que manifestaram apoio a Bolsonaro, o que “demonstra a ausência de prática de qualquer infração penal”. 

Procurado, o ministro da Justiça não se manifestou até a publicação da reportagem

Censura?

Em Pernambuco, a professora da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) Erika Suruagy Assis de Figueiredo, atual vice-presidente da Associação dos Docentes da Universidade Federal Rural de Pernambuco (Aduferpe), também é alvo de investigação por causa de um outdoor instalado em Recife, no ano passado, com críticas ao presidente. À frente da entidade à época, Erika prestou depoimento no dia 10. O outdoor definia o presidente como "inimigo da educação e do povo", usava o #Fora Bolsonaro e uma montagem com o presidente caracterizado como morte, com uma foice na mão, sugerindo sua responsabilidade diante das "mais de 120 mil" vidas perdidas para covid-19 até então. Por meio de nota, a Aduferpe definiu o episódio como uma tentativa de "inconstitucional" de censura.

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Recentemente, o ex-reitor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Pedro Hallal, e o pró-reitor de Extensão da universidade, Eraldo dos Santos Pinheiro, assinaram um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) proposto pela Corregedoria Geral da União se comprometendo a não criticar o governo Bolsonaro dentro de ambiente de repartição pública. Os dois atacaram a condução do combate à pandemia durante uma live realizada dentro da universidade. Epidemiologista e responsável por uma das principais pesquisas sobre a covid-19 no Brasil, Hallal afirmou em entrevista ao Estadão que não deixará de opinar sobre as falhas na atuação do presidente. "Se foi uma tentativa de censura, saiu pela culatra", disse o pesquisador.

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