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Ministro da Justiça admite que pasta produziu relatório sobre opositores

André Mendonça é ouvido em sessão virtual por parlamentares e diz que outros governos também monitoraram adversários

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Por Redação
Atualização:

BRASÍLIA – Em audiência fechada com parlamentares, o ministro da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça, admitiu nesta sexta-feira, 7, a existência de relatório de inteligência da pasta sobre 579 servidores públicos que integram grupos ‘antifascistas’. O ministro foi ouvido em sessão virtual por integrantes da Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência (CCAI) do Congresso Nacional, que cobraram explicações após o portal UOL revelar que o governo estava monitorando opositores ao presidente Jair Bolsonaro.

Um dia depois de afirmar ao Supremo Tribunal Federal que a pasta não persegue adversários políticos do governo e não investiga ninguém, o ministro foi pressionado pelos parlamentares a dizer claramente qual documento o órgão elaborou e quem foram os alvos. Mesmo sem detalhar, Mendonça admitiu, segundo três pessoas presentes no encontro afirmaram ao Estadão, a existência de um relatório sobre opositores. Ele disse que irá enviar todo o material produzido pela pasta à comissão na semana que vem, se antecipando a eventual aprovação de requerimento sobre o tema.

Indicado por Bolsonaro para vaga no Supremo, André Mendonça pode fortalecer relação do presidente com grupos de posição conservadora; ele ficará na Corte até 2047. Foto: Dida Sampaio / Estadão

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O ministro, porém, recusou o termo “dossiê”, afirmando que essa expressão remete a algo ilegal. Ele disse que não há espionagem e não há investigação alguma conduzida pela Secretaria de Operações Integradas (Seopi), órgão vinculado à pasta apontado como responsável por monitorar o grupo de servidores.

No encontro, Mendonça apresentou relatórios de gestões passadas para tentar convencer os parlamentares de que a pesquisa feita contra opositores do governo é procedimento comum e legal, e não uma exclusividade da gestão de Bolsonaro. Para sustentar a afirmação, ele expôs trechos de documentos de inteligência relacionados a grandes eventos que ocorreram no País nos últimos anos e envolveram a presença de autoridades do mundo inteiro, como a Copa de 2014 e a Olimpíada de 2016. De acordo com os parlamentares, o ministro citou ainda documentos produzidos durante o processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).

Um dos nomes citados no relatório da gestão da petista, relatado por Mendonça na reunião, foi o do atual deputado federal Kim Kataguiri (DEM-SP), líder do Movimento Brasil Livre (MBL), um dos principais opositores ao governo na época. O parlamentar criticou a comparação feita pelo ministro da Justiça. "Utilizar a espionagem do governo petista contra mim para justificar os próprios atos é a pavimentação do caminho para um Estado totalitário. Quer dizer então que se o PT utilizou o Estado para perseguir adversários políticos, Bolsonaro também pode? Caminho perigoso para o Estado de Direito", disse Kataguiri ao Estadão.

Ministra do Supremo apontou gravidade

A produção do "dossiê" contra os servidores antifascistas está sob análise do Supremo Tribunal Federal. Em uma ação da Rede Sustentabilidade, a relatora Cármen Lúcia apontou gravidade nas informações descritas. Em resposta, o ministério disse na quinta-feira, 6, que não poderia fornecer os dados de inteligência solicitados pelo autor da ação. Afirmou ainda não ser atribuição da pasta produzir dossiês.

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“Estamos peticionando no âmbito da ADPF 722, relatada pela ministra Cármen Lúcia, para que ela instaure inquérito investigativo sobre a conduta do senhor ministro da Justiça e do tal departamento (Seopi)”, disse o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), após a sessão desta sexta-feira. Pelo Twitter, o parlamentar disse que vai pedir que o ministro preste esclarecimentos no plenário do Senado."Irei reiterar a convocação do Ministro da Justiça p/ que ele compareça ao plenário do Senado da República p/ que agora, abertamente e em público, ele preste os esclarecimentos que não foram feitos de forma devida na reunião de hoje."

A oposição também pressiona a Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência para formalizar um pedido ao Ministério da Justiça para ter acesso ao relatório citado por Mendonça, caso o ministro não cumpra a promessa de enviá-lo na semana que vem. Caberá ao presidente do colegiado, senador Nelsinho Trad (PSD-MS), encaminhar o requerimento.

Além de Randolfe e Trad, participaram da reunião os senadores Eduardo Braga (MDB-AM) e Marcos do Val (Pode-ES) e os deputados Claudio Cajado (PP-BA), Carlos Zarattini (PT-SP), José Guimarães (PT-CE), Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). A audiência durou três horas e meia.

Ministro diz que ‘não permite perseguição’

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Em nota à imprensa após a reunião, o ministro disse que atua de maneira “técnica e republicana” e não admite “qualquer tipo de perseguição a quem quer que seja”. “Os esclarecimentos prestados não deixam dúvidas de que meu trabalho à frente do Ministério da Justiça e Segurança Pública tem se pautado pelos princípios do Estado Democrático de Direito, não admitindo qualquer tipo de perseguição a quem quer que seja”, disse André Mendonça.

Ele acrescentou que sua orientação à Seopi sempre foi para o “esforço máximo em auxílio aos Estados e Distrito Federal em ações integradas para o combate irrestrito ao crime organizado, à corrupção, ao tráfico de pessoas e, principalmente, aos crimes cometidos contra mulheres, crianças e adolescentes.”

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