'Meu Deus do céu! Essa é a nossa alternativa de poder', diz ministro do STF sobre PMDB

Em meio à discussão do processo de impeachment, o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF) disse que o País enfrenta um problema de 'falta de alternativa'

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Foto do author Beatriz Bulla
Por Beatriz Bulla e Gustavo Aguiar
Atualização:
O ministro do STF Luís Roberto Barroso Foto: DIDA SAMPAIO/ESTADãO

Brasília - Em meio à discussão do processo de impeachment, o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF) disse que o País enfrenta um problema de “falta de alternativa” e comentou em tom crítico a possibilidade de o PMDB assumir o poder.“Quando, anteontem, o jornal exibia que o PMDB desembarcou do governo e mostrava as pessoas que erguiam as mãos, eu olhei e pensei: Meu Deus do céu! Essa é a nossa alternativa de poder. Eu não vou fulanizar, mas quem viu a foto sabe do que estou falando”, disse o ministro, em conversa no Tribunal com alunos da Fundação Lemann.

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A foto do momento em que é selado o desembarque do PMDB do governo tem como figuras principais o ex-ministro Eliseu Padilha – um dos peemedebistas mais próximos do vice-presidente Michel Temer -, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e o primeiro vice-presidente do PMDB, senador Romero Jucá (RR).

Na conversa com alunos, Barroso afirmou que o problema do País é a “falta de alternativa” na política. “Não tem para onde correr. Isso é um desastre”, afirmou.

O ministro não sabia, ao fazer os comentários, que o encontro estava sendo transmitido pelo sistema interno de TV do Supremo, ao qual todos os gabinetes do Tribunal têm acesso. Após as críticas, Barroso foi informado que a conversa estava sendo exibida e pediu para que os áudios fossem excluídos.

Barroso também fez comentários sobre o sistema político. “A política morreu, porque nós sistema político que não tem um mínimo de legitimidade democrática, ele deu uma centralidade imensa ao dinheiro e à necessidade de financiamento e se tornou um espaço de corrupção generalizada”, disse o ministro, que emendou “Talvez morreu eu tenha exagerado. Mas ela está claramente enferma. É preciso mudar”.

Crítico ao sistema eleitoral do País, Barroso disse que há um distanciamento entre eleitores e eleitos. “É um sistema em que o eleitor não tem de quem cobrar e o eleito não tem a quem prestar contas, não pode funcionar”, disse, ao falar sobre a eleição por voto proporcional.

Repercussão. A avaliação de declarações em público de magistrados e uma eventual suspeição para julgamento de casos futuros dividem estudiosos do direito constitucional. Para o professor da FGV Direito SP Rubens Glezer, um dos coordenadores do Supremo em Pauta, as afirmações de Barroso não chegam a configurar “emissão de juízo negativo”. “A manifestação de Barroso não fere a imparcialidade exigida a ele enquanto ministro do Supremo. Ele é uma autoridade em direito constitucional e estava falando como professor”, afirmou.

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Para o jurista Wálter Maierovitch, no entanto, Barroso pode ser colocado em suspeição caso tenha de julgar processos envolvendo os políticos retratados na foto ou o PMDB – como nos processos da Lava Jato, por exemplo. “A partir de agora, ele não pode participar de nenhum julgamento relativo às pessoas da foto e ao próprio PMDB. Ele não teve cautela”, disse.

Entre os políticos, o líder do DEM na Câmara, Pauderney Avelino (AM), disse que Barroso “fez um julgamento personalíssimo que não caberia fazer, estando ele na presença de visitantes nas dependências do STF”. Procurado ontem à noite, Cunha não quis comentar o caso.

Foro – Mais cedo, em palestra a universitários do Centro Universitário de Brasília (UniCeub), Barroso fez críticas ao chamado “foro privilegiado”. “É um desastre para o País e é um mal para o Supremo. O foro por prerrogativa de função deveria alcançar o Presidente da República, o vice-presidente da República, os presidentes de poder e mais quase ninguém”, disse o ministro.

Ele defendeu, conforme já fez em momentos anteriores, a criação de uma vara especializada em Brasília para cuidar dos processos criminais de autoridades que hoje possuem foro perante o STF e perante o Superior Tribunal de Justiça. Atualmente, além dos presidentes de Poder e presidente e vice-presidente da República, uma série de outras autoridades possui a prerrogativa de só ser investigado e processado na área penal pelo Supremo, como deputados, senadores e ministros de Estado.

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Barroso afirmou ainda que o modelo de foro privilegiado amplo “estimula a fraude à jurisdição”, citando por exemplo, de forma genérica, casos em que parlamentares renunciam para escapar do julgamento no STF. Dentro das próximas semanas, o Supremo terá de julgar a situação do foro do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que, ao ser empossado ministro-chefe da Casa Civil, teria suas investigações remetidas ao STF. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, no entanto, enviou parecer à Corte na qual pede a manutenção da posse de Lula, mas a continuidade das investigações na justiça de primeira instância, para evitar efeitos prejudiciais do que chama de “desvio de finalidade” na nomeação do petista.

O ministro também afirmou que o processo de impeachment é um “momento dramático” para o País, independentemente do resultado final, mas defendeu a tolerância nas discussões. “As pessoas deveriam debater ideias sem compulsão de desqualificar as opiniões dos outros. Não precisa dizer que quem pensa diferente é mal intencionado. (...) Um choque civilizatório no debate público brasileiro faria muito bem a todos”, disse Barroso.