Medida para coibir roubo de medicamentos é mal recebida

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Por Agencia Estado
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O roubo de medicamentos ocupa o segundo posto entre as mercadorias mais visadas em São Paulo, o maior mercado do País. Perde só para os eletroeletrônicos. No ano passado, foram levados R$ 36,4 milhões. Em 2001, o prejuízo somou R$ 12,2 milhões, e a carga era a quarta mais procurada. É um indicador de que as quadrilhas de remédios voltaram a atuar, segundo o Sindicato das Empresas de Transporte de Carga de São Paulo e Região. Seria também um fator a mais para que indústria, atacado e varejo se unissem em torno de uma resolução federal que pretende moralizar a comercialização dos remédios. Mas a simples idéia de fazer com que só cheguem aos consumidores produtos com procedência garantida ainda sofre resistência. A resolução 320 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), de novembro, determina que empresas atacadistas, as distribuidoras, informem nas notas fiscais o número do lote dos medicamentos. Os laboratórios da indústria farmacêutica já fazem isso, atendendo à Portaria 802, de 1998. A crença da agência é de que a nova norma fecharia o cerco à sonegação fiscal e ao escoamento de mercadoria roubada nas prateleiras das farmácias. Hoje não é possível diferenciar um remédio roubado de outro, de origem comprovada. Para a Abrafarma, a medida que afeta a categoria que representa, a dos atacadistas, não terá efeito. Segundo o diretor-executivo, Jorge Fróes, o roubo de carga ocorre com freqüência no caminho entre laboratórios e distribuidoras. E arrisca: se a mercadoria for "marcada" só nessas empresas, nada impedirá que produtos roubados de um mesmo lote continuem a chegar às farmácias. "Quem deve registrar um filho: o pai, a mãe ou o vizinho?" O pai e a mãe do produto são os laboratórios. Mas, com base numa tabela de custos, eles dizem que nada têm a ver com a resolução 320. "A Febrafarma estudou a proposta de um sistema de código de barras a ser aplicado em cada caixa de medicamento. A conclusão é de que os custos são enormes, em muitos casos inviabilizando a operação do produto ou das empresas", disse o presidente da entidade representante da indústria farmacêutica, Ciro Mortella. "Poderíamos soltar uma norma para todos, mas no curto prazo já teríamos um resultado muito bom se a aplicarmos nas distribuidoras", explicou o diretor da Anvisa Luiz Milton Veloso da Costa. Projeto feito pelas Secretarias da Saúde e da Receita Estadual aumentou o controle sobre a distribuição dos medicamentos nesse Estado. E a arrecadação cresceu 14% entre janeiro e fevereiro deste ano e o mesmo período de 2002. "Com o número do lote nas notas fiscais, será possível rastrearmos o produto", afirmou a diretora da Superintendência de Fiscalização Maria do Carmo Silveira Nascimento. O atual código de barras usado pela indústria não permite armazenar muitos dados. Com isso, as distribuidoras terão de introduzir um código adicional, já que boa parte da operação é automatizada pelas empresas do setor, responsáveis por 70% do volume entregue às lojas. As redes de farmácias, que compram diretamente das indústrias e vendem 4 milhões de remédios por mês, temem que a introdução de outro código leve a erros. "Mensalmente, poderão ser 640 mil unidades de erro, já que o processo de etiquetagem será manual", disse Sérgio Mena Barreto, da Abrafarma. Em 2002, a indústria entregou ao mercado 1,6 bilhão de unidades de medicamento. Para um País em que há mais farmácias (55 mil) do que padarias (52 mil), descobrir os caminhos de um remédio da indústria às lojas é tarefa quase impossível. Quem rouba medicamentos os distribui nas farmácias. Por isso, a resolução da Anvisa prevê que esses estabelecimentos obtenham autorização federal para funcionar. Já há 32 mil pedidos pendentes na agência. O presidente da Associação Brasileira do Comércio Farmacêutico, Pedro Zidoi, criticou a medida. "As distribuidoras vão ter dificuldade para separar os lotes e as farmácias terão de parar de atender para verificar o recebimento dos produtos." Uma loja mediana recebe cerca de 700 medicamentos por dia. Segundo ele, a Anvisa está certa em querer aperfeiçoar o setor, mas "exagera" ao entrar em áreas de atuação das vigilâncias sanitárias. "Também queremos moralizar e, por isso, fazemos várias denúncias de farmácias que vendem com preços até 70% mais baratos." As secretarias estaduais da Fazenda têm interesse na resolução, já que prevêem aumento da arrecadação caso a norma seja cumprida. Em São Paulo, que editou um decreto nesse sentido, 4% da arrecadação vem da área de medicamentos. São cerca de R$ 2 bilhões por ano. A resolução entraria em vigor em janeiro, mas foi adiada para o dia 27. Segundo o gerente-geral de inspeção e controle da Anvisa, Antônio Carlos Bezerra, a punição pode variar de multas de R$ 2 mil a R$ 1,5 milhão até o fechamento de atacadistas. Segundo a Abafarma e a Abrafarma, as distribuidoras e redes de farmácias cumprirão a medida com dificuldades. Zidoi pediu mais prazo para o varejo obter a autorização de funcionamento. A Anvisa já avisou que a fiscalização será intensificada em abril, quando a norma entrará efetivamente em vigor.

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