Marco Aurélio assume TSE com crítica pesada aos políticos

Na posse, ele disse que o Brasil tornou-se o país do faz-de-conta, em referência ao esquema do mensalão

Por Agencia Estado
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O ministro Marco Aurélio Mello tomou posse nesta quinta-feira à noite como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) dizendo que "o Brasil se tornou um país do faz-de-conta". Sem citar nomes, Marco Aurélio fez menção ao fato de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmar, com freqüência, que não sabia das irregularidades que, segundo o ministro, provocaram um prejuízo milionário e irreversível. "Perplexos, percebemos, na simples comparação entre o discurso oficial e as notícias jornalísticas, que o Brasil se tornou um país de faz-de-conta. Faz de conta que não se produziu o maior dos escândalos nacionais, que os culpados nada sabiam - o que lhes daria uma carta de alforria prévia para continuar agindo como se nada de mal tivessem feito. Faz de conta que não foram usadas as mais descaradas falcatruas para desviar milhões de reais, num prejuízo irreversível em país de tantos miseráveis. Faz de conta que tais tipos de abusos não continuam se reproduzindo à plena luz, num desafio cínico à supremacia da lei, cuja observação é tão necessária em momentos conturbados", afirmou o ministro em seu discurso de posse no TSE. O ministro afirmou que o País passa por "tempos muito estranhos". Segundo ele, a notícia de indiciamento de autoridades tornou-se banal. Ele citou a providência tomada recentemente pelo procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, de denunciar 40 pessoas acusadas de envolvimento com o esquema do mensalão. "A rotina de desfaçatez e indignidade parece não ter limites, levando os já conformados cidadãos brasileiros a uma apatia cada vez mais surpreendente, como se tudo fosse muito natural e devesse ser assim mesmo", observou o ministro, parente do ex-presidente Fernando Collor. Em seguida, ele disse que há "a tática do avestruz: enterrar a cabeça para deixar o vendaval passar." "A repulsa dos que sabem o valor do trabalho árduo se transformou em indiferença e desdém, como acontece quando, por vergonha, alguém desiste de torcer pelo time do coração e resolve ignorar essa parte do cotidiano", afirmou. "São tantas e tão deslavadas as mentiras, tão grosseiras as justificativas, tão grande a falta de escrúpulos que já não se pode cogitar somente de uma crise de valores, senão de um fosso moral e ético que parece dividir o País em dois segmentos estanques - o da corrupção, seduzido pelo projeto de alcançar o poder de uma forma ilimitada e duradoura, e o da grande massa comandada que, apesar do mau exemplo, esforça-se para sobreviver e progredir", concluiu o ministro. Revolução pelo voto Marco Aurélio, que presidirá o TSE durante as eleições, conclamou os eleitores brasileiros a fazerem uma revolução pelo voto. "Ao reverso do abatimento e da inércia, é de conclamar o povo, principalmente os mais jovens, a se manifestar pela cura, não pela doença, não pela podridão do vale-tudo", disse. "Ao usar a voz da urna, o povo brasileiro certamente ouvirá o eco vitorioso da cidadania", afirmou. O ministro disse que o Judiciário tem um papel fundamental na superação da crise e que, no que depender dele, o TSE será implacável com quem cometer irregularidades na campanha. "Não haverá contemporizações a pretexto de eventuais lacunas na lei", afirmou. "Não ocorrerá tergiversação capaz de turbar o real objetivo da lei, nem artifício conducente a legitimar a aparente vontade das urnas, se o pleito mostrar-se eivado de irregularidades", prometeu. Ele disse que o TSE será rígido na análise das contas das campanhas eleitorais. "Esqueçam, por exemplo, a aprovação de contas com as famosas ressalvas", afirmou. "Passem ao largo das chicanas, dos jeitinhos, dos ardis possibilitados pelas entrelinhas dos diplomas legais", disse. "Nenhum fim legitimará o meio condenável", acrescentou.

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