Manobra oposicionista interrompe votação do Orçamento

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Por Agencia Estado
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Uma armadilha preparada pela oposição na madrugada deste sábado impediu que a votação da proposta orçamentária de 2002 na Comissão Mista de Orçamento do Congresso fosse concluída antes do Natal. O senador Tião Viana (PT-AC) surpreendeu toda a bancada da coalizão governista, comandada por líderes de segundo escalão, ao votar contra o bloqueio de recursos federais para obras com indícios graves de irregularidade apontados pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e, em seguida, solicitar votação por chamada nominal para verificação do quórum. Os líderes governistas ficaram perplexos. Eles sabiam que não tinham número suficiente de senadores para assegurar o quórum mínimo de uma votação nominal mas contavam com uma sólida bancada de 40 deputados para enfrentar os obstáculos da oposição - as votações na Comissão são separadas entre os 64 deputados e os 22 senadores. Eles não esperavam, no entanto, que a tática da obstrução fosse armada sobre uma das principais bandeiras defendidas pelos oposicionistas na Comissão: a fiscalização rigorosa das obras financiadas com recursos públicos. A sessão foi encerrada pouco antes das 2 horas da madrugada. Os líderes governistas chegaram a convocar uma nova reunião para este domingo, mas desistiram ao constatar que não conseguiriam arregimentar suas bancadas. Depois de uma série de consultas aos escalões superiores da base do governo, que durou cerca de duas horas, o presidente da Comissão, senador Carlos Bezerra (PMDB-MT), marcou nova reunião para a próxima quarta-feira, quando será iniciado um novo período de convocação extraordinária. Para evitar outros contratempos e tentar votar o Orçamento de 2002 sem necessidade de acordo com a oposição, a convocação será por 12 dias, terminados em 7 de janeiro. A definição do prazo não foi aleatória. Essa é a data limite para que o Orçamento seja aprovado antes que o presidente Fernando Henrique Cardoso formalize sua decisão sobre a sanção ou o veto ao projeto de lei que reajusta a tabela de alíquotas do imposto de renda da pessoa física. Na próxima semana, o governo deverá agir para acomodar os parlamentares descontentes com a distribuição dos últimos recursos do bolo orçamentário. Esse descontentamento facilitou a manobra da oposição para derrubar a sessão da Comissão de Orçamento. O senador Tião Viana não teria condições regimentais para pedir a verificação de quórum não fosse o apoio do senador Wellington Roberto (PMDB-PB), que ficou contrariado com a rejeição de todos os sete destaques que apresentou. Ele não foi o único insatisfeito na base do governo. Muitos questionaram o critério utilizado pelo relator, deputado Sampaio Dória (PSDB-SP), que gastou o maior quinhão dos últimos R$ 540 milhões disponíveis - que estavam camuflados no relatório - para recompor parte das emendas apresentadas pelas Comissões Permanentes do Congresso a pedido dos Ministérios, que sofreram cortes em benefício do reajuste do salário mínimo para R$ 200,00. Como os destaques para essas dotações foram apresentados por um pequeno grupo de parlamentares próximos ao relator, houve desconfiança sobre a forma de distribuição adotada. "A concentração de recursos entre os parlamentares que compõem o núcleo de poder da Comissão provocou uma desconfiança enorme na base do governo", avaliou o líder do PDT na Câmara, Miro Teixeira (RJ), que operou junto com o líder do PT, Walter Pinheiro (BA), a estratégia arquitetada pelo deputado Sergio Miranda (PC do B-MG). Desde quinta-feira, Miranda vem criando um clima de desconfiança sobre os critérios de distribuição de recursos do relator. Depois que os esforços da oposição para obstruir a votação do texto básico do relatório foram vencidos pela base governista, ele, Teixeira e Pinheiro deixaram transparecer sinais de abatimento e resignação. Na madrugada de sexta-feira, o governo mostrou sua força, mantendo 41 deputados e 12 senadores de prontidão até 4h30, quando terminou a votação. O senador Ronaldo Cunha Lima (PSDB-PB), que precisa se locomover com cadeira de rodas em razão de um derrame, foi liberado apenas para dormir no carro. A vitória deu confiança aos líderes governistas, que haviam seduzido a oposição com a possibilidade de um acordo para um reajuste maior do salário mínimo. Mas a frustração fez com que a bancada do PT voltasse a se realinhar com o PDT e o PC do B, que estavam isolados na obstrução. Para desarmar os líderes do governo, os oposicionistas também usaram uma tática de sedução. Se ofereceram para votar antes dos destaques ao relatório uma relação de 32 projetos de lei que ampliam em R$ 4,6 bilhões os recursos previstos no orçamento deste ano de vários Ministérios, principalmente da área social. Eles deixaram até "passar batido" - sem crítica ou discurso - um acréscimo de R$ 345 milhões nas despesas para amortização de dívida pública contraída com a emissão de títulos no exterior, que ficou mais cara por causa da desvalorização cambial. Depois da votação, os líderes oposicionistas receberam telefonemas de agradecimento de ministros que terão um dinheiro a mais para gastar até o final do ano e até elogios pela astúcia da estratégia adotada pela minoria. Um contraste em relação aos líderes da maioria, cuja sensação era a mesma do time que sofre um gol contra proposital. "Dá até raiva, a gente abre mão de compromissos para estar aqui até agora e não consegue votar por causa de senador da própria base", queixou-se o deputado Waldemir Moka (PMDB-MS), que deixou de ser padrinho de casamento de um amigo em Campo Grande.

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