Lula lança relatório sobre ditadura e militares não comparecem

Por RICARDO AMARAL
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Sem a presença dos comandantes do Exército, Marinha e Aeronáutica, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva lançou nesta quarta-feira o livro-relatório "Direito à Memória e à Verdade", com o resultado oficial de pesquisas sobre a repressão a adversários políticos da ditadura militar entre 1964 e 1985. Lula garantiu em discurso que o relatório, produzido ao longo de 11 anos pela Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos, não tem intenção "revanchista" em relação aos militares. Primeiro documento oficial sobre o caso, o livro narra casos de tortura, morte e desaparecimento de presos. Parentes de desaparecidos criticam o governo por não ter promovido, nesse período, a localização dos corpos, tema que ainda é considerado tabu em meios militares. Oficialmente, os comandos das Forças Armadas negam a existência de arquivos com essas informações. "Uma das feridas que permanecem abertas é a localização (dos corpos). A gente deveria determinar um prazo e pensar que estratégia utilizar para que a gente pudesse saber onde está, sem expectativa de que a gente vá fazer um processo de revanchismo", disse o presidente em seu discurso. Segundo a assessoria da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, os três comandantes militares, subordinados ao ministro da Defesa, Nelson Jobim, foram convidados para a cerimônia, assim como familiares de mortos e desaparecidos e dirigentes de movimentos de defesa dos direitos humanos. Em rápida entrevista após a solenidade, Lula não conseguiu explicar a ausência dos comandantes. "Não sei. Primeiro porque não conversei com os militares. Eu fui convidado pela Secretaria de Direitos Humanos. O Jobim foi convidado. Veio quem foi convidado." Mais tarde, a assessoria do Ministério da Defesa informou que foi Jobim quem decidiu pela ausência dos três comandantes, levando em conta que o comandante do Exército, general Enzo Peri, estaria em missão da Argentina. Em 1996, quando era ministro da Justiça no governo Fernando Henrique Cardoso, Nelson Jobim iniciou o processo de reconhecimento da responsabilidade do Estado pelas mortes na repressão política. Em seu discurso nesta quarta, ele ressaltou o caráter de "conciliação" da anistia e do reconhecimento de indenização das chamadas "vítimas da ditadura". "Não haverá indivíduo que possa a isso reagir, e se houver terá resposta", disse o ministro da Defesa. Em um momento raro em seus discursos, Lula elogiou o trabalho de Jobim no governo Fernando Henrique Cardoso, citando nominalmente seu antecessor e adversário político. Também citou outro tucano, o ex-ministro José Gregori. O ministro Paulo Vanuchi, chefe da Secretaria Especial de Direitos Humanos, também negou que a publicação tenha o objetivo de promover um acerto de contas com os militares. Um dos irmão do ministro (Alexandre Vannuchi Leme, líder estudantil e militante do grupo ALN) foi preso no campus da USP em 1973 e dado pelos militares como "morto em atropelamento". "Este não é um ato de alegria, um ato de festejar. O conteúdo do relatório trata de uma guerra em que não houve vencedor, uma guerra em que todo o Brasil perdeu", disse Vannuchi.

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