Lula cobra de Mantega fim da guerra de grupos na Receita

Para presidente, ministro da Fazenda errou ao demitir Lina Vieira antes de encontrar substituto para o cargo

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Por Vera Rosa
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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ao ministro da Fazenda, Guido Mantega, que não quer ver a Receita Federal "refém" de uma guerra entre grupos. Furioso com o tiroteio na direção da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, Lula cobrou de Mantega providências para pôr fim à batalha interna desencadeada após a demissão da ex-secretária da Receita Lina Vieira. Em conversa mantida com Mantega na semana passada, o presidente avaliou que Lina provou não estar à altura do cargo. Demitida em julho, a ex-mulher forte da Receita afirmou que Dilma pediu a ela, em dezembro, que agilizasse as investigações do Fisco sobre as empresas da família do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). A chefe da Casa Civil, pré-candidata do PT à sucessão de Lula, em 2010, não só nega o pedido como o encontro. Na avaliação de Lula, Mantega errou ao demitir Lina antes de encontrar um substituto para o cargo e, com essa atitude, acabou provocando uma crise sem precedentes. Sob a alegação de que a Receita não é mais imune às "ingerências e pressões de ordem política ou econômica", 12 superintendentes e coordenadores da instituição entregaram os cargos na segunda-feira. A rebelião se agravou ao longo da semana com outra leva de dispensas. Os demissionários fizeram questão de dar tom político à saída: solidarizaram-se a Lina e bateram na tecla de que a Receita abandonou a fiscalização sobre grandes contribuintes. Em conversas reservadas, Lula tem dito que a disputa de poder na Receita parece o confronto entre facções da Polícia Federal. Nos bastidores do governo, a PF é chamada de "ninho de cobra". Para o presidente, o problema começou em agosto de 2008, quando Mantega resolveu trocar Jorge Rachid - ligado ao ex-secretário da Receita Everardo Maciel - por Lina Vieira. Ela trabalhou com o senador Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN) quando ele foi governador do Rio Grande do Norte (1995-2002) e assumiu o comando da Receita com o apoio de um grupo de oposição à atual diretoria da Unafisco, o sindicato nacional dos auditores fiscais. Lina caiu em desgraça depois de entrar em rota de colisão com a Petrobrás: denunciou a manobra contábil pela qual a estatal deixou de pagar R$ 1,18 bilhão em impostos. A notícia municiou a oposição, que conseguiu aprovar a CPI da Petrobrás no Congresso. Ao deixar a Receita, a ex-secretária disse a amigos que não aceitaria a pecha de incompetente. Auxiliares de Lula asseguram que ela atribuiu a demissão a Dilma, embora a palavra final tenha sido de Mantega. DEFESA Ex-braço direito de Lina, o atual secretário da Receita, Otacílio Cartaxo, só ganhou o cargo após ter defendido o artifício usado pela Petrobrás, contrariando publicamente a posição de sua antecessora. Otacílio é considerado "independente" dentro da instituição. Na conversa com Mantega, Lula afirmou até hoje não saber por que motivo Rachid acabou "fritado". O ex-secretário foi nomeado para o posto pelo então ministro da Fazenda Antonio Palocci, hoje deputado do PT. Mantega e Palocci - ambos próximos a Lula - nunca se entenderam sobre rumos da economia. Palocci sempre foi da linha "monetarista", defensor de um ajuste fiscal rigoroso e a qualquer preço. Mantega integra o grupo dos chamados "desenvolvimentistas" da equipe, que pregam a ampliação do papel do Estado na economia. Apesar das críticas de Lula, o ministro da Fazenda nunca deixou de consultar o presidente antes de tomar decisões. Agiu assim, mais uma vez, quando quis substituir Rachid por Lina. Foi, na prática, uma das últimas mudanças feitas por ele na equipe de Palocci.

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