Liberdade de expressão:uma conquista consolidada

Para especialistas, Carta é capaz de enfrentar desafios da era digital, mas faltam normas em temas como privacidade

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Por Gabriel Manzano
Atualização:

Um dos dispositivos incluídos nas cláusulas pétreas da Constituição, aquelas que não podem ser alteradas nem por emenda, a liberdade de expressão está consagrada ao longo dos princípios que norteiam a Carta Magna como direito sagrado dos brasileiros. Em um quarto de século de existência, o texto passou a conviver com novas tecnologias e formas de relacionamento em redes sociais. Ainda assim, foi no dia a dia desses 25 anos que o País consolidou de vez a importância da liberdade de expressão como eixo da democracia.

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“Nossa Constituição tem duas grandes qualidades. Primeira, a de não ter titubeado em tornar a liberdade de expressão um princípio amplo e forte, especificado em vários momentos. E segundo, ter conseguido ser levada a sério nesse princípio”, analisa o jurista Carlos Ari Sundfeld ao Estado. “Nas Cartas anteriores, também havia liberdade de expressão, mas ela acabava sendo diminuída por leis restritivas ou por atos institucionais. A atual, nos seus princípios – e a liberdade de expressão é um deles – foi transformada em instrumento prático nas leis que eles inspiraram.”

Ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, Carlos Ayres Britto é defensor histórico da importância da liberdade de expressão. Na Corte, foi relator do processo que culminou na derrubada da Lei de Imprensa, herança da ditadura militar. “A liberdade de expressão é a maior expressão da liberdade, e a imprensa é insubstituível”, afirma ele, para quem imprensa e democracia são “irmãs siamesas”. Na avaliação feita por Ayres Britto quando presidiu o Supremo, “quanto mais se fortalece a liberdade de imprensa, mais se robustece a democracia. Quanto mais se robustece a democracia, mais se fortalece a liberdade de imprensa.”

Era digital. Um princípio tão sagrado, a ponto de só poder ser mudado por uma nova Constituição, convive com outras questões surgidas ao longo dos últimos anos, em especial pelos avanços tecnológicos. Nada disso, porém, pode ameaçar o direito à liberdade de expressão. Tanto que, convivendo há 15 anos com o Google e há 9 com o Facebook, numa sociedade exposta a hackers, blogs anônimos, invasão de privacidade, politização das redes sociais e tecnologias que facilitam pirataria e espionagem, a Constituição está capacitada a enfrentar os desafios da era digital, conforme especialistas.

“Nossa Constituição não precisa de nenhuma mudança”, diz Luiz Tarcísio Ferreira, mestre em Direito Administrativo pela PUC-SP. “A questão não é constitucional, é penal. Falta, por exemplo, uma lei que discipline a comunicação eletrônica de massa.” Para o professor Ronaldo Lemos, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), a Constituição “definiu princípios abrangentes que são, sim, aplicáveis à rede”, mas “o Legislativo, o Executivo e o Judiciário estão em dívida com a Constituição”.

Um exemplo prático de sua atualidade: se um hacker invade um site, isso é invasão de privacidade, outro direito incluído nas cláusulas pétreas. No total, o artigo 5.º tem 78 incisos e quatro parágrafos, nos quais se abriga um arsenal de garantias às liberdades individuais e de expressão. Ao longo da Constituição, também são contemplados dispositivos como transparência, fundamental para o livre exercício da imprensa.

Quanto às “dívidas” dos Três Poderes, Ronaldo Lemos menciona duas normas que o Legislativo devia discutir e aprovar: um texto que permita aos cidadãos apoiar via internet as leis de iniciativa popular e uma que detalhasse melhor a questão da privacidade.

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As garantias da Constituição, no entanto, são parte de um mundo em que a tecnologia permite a sofisticação dos abusos. Tanto Estado quanto cidadãos devem estar atentos, na avaliação do conselheiro da OAB paulista Coriolano de Almeida Camargo, especialista em direito eletrônico. Princípios básicos da Constituição, como liberdade de expressão e direito à privacidade, deverão inspirar, no futuro, “sistemas ativos de defesa da privacidade do cidadão”. E o Estado “precisa estar cada vez mais equipado com ferramentas capazes de combater a criminalidade cibernética”.

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