Lacunas marcam laudo oficial sobre Rubens Paiva

Documentos revelam fragilidade da versão de que ex-deputado teria sido libertado durante tiroteio

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Por Wilson Tosta
Atualização:

Lacunas e contradições marcam dois dossiês elaborados por militares nos anos 70 para corroborar a sua versão, depois desmentida, sobre o desaparecimento do ex-deputado federal Rubens Paiva - que era seu prisioneiro e, segundo eles, teria sido resgatado por guerrilheiros em tiroteio. O cruzamento de depoimentos de envolvidos no episódio com o laudo pericial feito pelo próprio Exército, além da análise da perícia, mostra a inverossimilhança das alegações dos agentes e das conclusões da investigação. Os militares alegaram, por exemplo, ter sido cercados por terroristas, que teriam alvejado de curta distância o veículo em que levavam Paiva, mas todos saíram ilesos. "Como a prisão teve repercussão enorme e houve pressão da imprensa internacional, inventou-se aquela farsa", diz o filho de Paiva, jornalista Marcelo Rubens Paiva, colunista do Estado e blogueiro do site estadao.com.br. Segundo seus familiares e grupos de defesa dos direitos humanos, o ex-deputado foi assassinado sob tortura por militares do Destacamento de Operações de Informações (DOI). O corpo jamais foi encontrado. Só em 1996 sua família recebeu um atestado de óbito. Segundo relatório de fevereiro de 1971 da sindicância sobre a "fuga", assinado pelo major Ney Mendes, do Quartel-General do I Exército, Rubens Paiva, em 22 de janeiro de 1971, fora levado a indicar uma casa onde poderia estar "elemento que trazia correspondência dos banidos no Chile". "O sr. Rubem (sic) não conseguiu identificar a casa e, ao regressarem (...), o Volkswagen da equipe do DOI foi interceptado por dois outros Volks (...) Estes, violentamente, contornaram a frente do carro do DOI,cujos ocupantes dispararam suas armas de fogo contra a Equipe. Esta abandonou o carro rapidamente, refugiou-se atrás de um muro e respondeu ao fogo. O sr Rubem fugiu pela porta da esquerda (...)." Laudo feito no mesmo dia mostra que o Fusca foi atingido por 18 tiros. É assinado pelo comandante do Pelotão de Investigações Criminais, primeiro-tenente Armando Avolio Filho; pelo terceiro-sargento perito Lucio Eugênio de Andrade; e pelo comandante do I Batalhão de Polícia do Exército, coronel José Ney Fernandes Antunes. Além da inexistência de ferimentos na equipe que conduziria o preso - capitão Raimundo Ronaldo Campos, primeiro-sargento Jurandir Ochsendorf e Souza e terceiro-sargento Jacy Ochsendorf e Souza -, os documentos não explicam como Paiva teria escapado pela porta esquerda, lado mais atingido, sem ser, ele mesmo, alvejado - era madrugada. Não aparece nas fotos o muro atrás do qual os agentes teriam se protegido do ataque. Ele também não está no croquis da perícia, que mostra apenas um barranco.

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