Ipen produz radiofármaco para dor crônica

PUBLICIDADE

Por Agencia Estado
Atualização:

Com a construção de uma nova célula de produção e mudanças na operação do seu reator nuclear, o Instituto de Pesquisas Energéticas Nucleares (Ipen), de São Paulo, conseguiu desenvolver o processo de produção do samário 153, um radiofármaco indicado para tratamento da dor crônica, em casos de câncer ósseo. O desenvolvimento levou 2 anos e as pesquisas médicas para sistematizar o uso do produto ocorreram a partir de 1995, paralelamente a pesquisas semelhantes, desenvolvidas no exterior. Já conhecido pelos médicos nucleares, o samário 153 agora vem sendo difundido entre os oncologistas (especialistas em câncer) como substituto da morfina e de outros opióides. Com a ampliação da capacidade de produção do Ipen, através do aumento da potência do reator para 5MW, o instituto está em condições de atender a toda a demanda do país. Segundo a farmacêutica Marycel Figols de Barboza, responsável pela produção comercial do samário 153 no Ipen, o radiofármaco é obtido a partir da irradiação do óxido de samário 152, ao qual se acopla uma molécula do agente fosfonado EDTMP (um ácido orgânico com fósforo), que tem a função de "dirigir" o medicamento até as lesões ósseas e depois é eliminado pela via renal. O reator do Ipen teve de ser adaptado e passou a operar 48 seguidas, ao invés de 8 horas, para garantir a atividade necessária à irradiação do samário. Com estas mudanças e com a construção da célula de produção, específica para este radiofármaco (para evitar contaminação cruzada), o Ipen investiu cerca de R$ 800 mil, tendo recebido recursos também da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), em torno de US$100 mil, para equipamentos, capacitação e troca de informações em encontros regionais. A produção atual é de 10 a 12 doses por semana, que tem de 70 a 100 milicuries. O samário 153 é aplicado por via intravenosa, em dose única, na proporção de 1 milicurie por quilo de peso do paciente. A resposta se dá em uma semana e pode perdurar por 3 a 4 meses. Se o paciente está em condições clínicas adequadas, a dose pode ser repetida após este período, o que acontece com cerca de 15% dos pacientes, conforme avaliações realizadas no Hospital das Clínicas de São Paulo. De acordo com o médico nuclear Marcelo Tatit Sapienza, dos hospitais Samaritano e das Clínicas, o samário 153 tem menos efeitos colaterais do que os opióides. "Não há alteração do estado de consciência do paciente, nem interferência no trato intestinal ou salivação", diz. O produto também não cria dependência. Ainda assim, é preciso monitorar os pacientes, em geral já debilitados devido ao câncer. Em aproximadamente 10% dos casos o medicamento causa uma leve depressão medular, transitória, de duração média entre 6 a 8 semanas. Por isso, antes da aplicação da dose única deve ser feito um hemograma para contagem de leucócitos e plaquetas, repetido quinzenalmente. De acordo com Sapienza, é igualmente recomendável fazer uma cintilografia óssea para ter certeza de que as lesões captarão bem o samário, pois podem haver variações de um paciente para outro. A cintilografia é feita com um agente chamado MDP, marcado com tecnésio 99m, que tem o mesmo comportamento do samário 153, com emissões bem menores, usadas para produzir as imagens de diagnóstico. Se o marcador chega às lesões, o medicamento também as atingirá. Tais procedimentos são semelhantes aos adotados com um outro radiofármaco de efeito contra dor crônica, o estrôncio 89, pouco usado devido ao seu custo proibitivo. No Brasil, uma dose de estrôncio 89, importado, custa cerca de R$ 2 mil, enquanto uma dose de samário 153 sai por R$ 250.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.