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Intenção e gesto

Por Dora Kramer
Atualização:

Presidente de honra do PSDB, Fernando Henrique Cardoso na semana passada pela primeira vez foi veemente na manifestação de apoio à postulação de Geraldo Alckmin para prefeito de São Paulo. "Ele não vai abrir mão da candidatura, e eu estou com ele", afirmou FH, justamente no momento em tese mais impróprio para dizer o que não havia dito até então. O governador José Serra e o ex-senador Jorge Bornhausen haviam conseguido atrair Orestes Quércia, e com isso o PMDB, para uma aliança com o prefeito Gilberto Kassab, num reforço de peso à candidatura que Fernando Henrique já dissera ser a sua predileta. Todo mundo notou que a idéia era esvaziar politicamente a postulação de Alckmin e levá-lo espontaneamente à desistência. Todo mundo viu também que Alckmin resistiu, anunciando para segunda-feira a confirmação de seu nome na disputa. Afora os ativistas mais vistosos de sua causa, ninguém no PSDB se manifestou convictamente em seu favor. No plano nacional, só o senador Tasso Jereissati, que não perde uma oportunidade para marcar suas diferenças com o governador Serra. O presidente do PSDB, Sérgio Guerra, ficou discreto, o governador de Minas, Aécio Neves, nem levantou os olhos de seus afazeres aliancistas em Belo Horizonte e as bancadas tucanas no Congresso caladas estavam, caladas ficaram. Nem parece que há um candidato do partido sendo tacitamente assediado a desistir em favor de um candidato de outra legenda. Ao contrário: o que se ouviu foram as vozes de vereadores e secretários municipais tucanos reforçando a tese da aliança com Kassab na cabeça. Então, por que logo Fernando Henrique, um adepto da programação Serra presidente, Kassab prefeito e Alckmin governador em 2010, pede a palavra para ir contra a maré de maneira tão assertiva quanto isolada? Talvez porque na atividade política, mais do que em qualquer outra, em geral a fala expressa o avesso do que vai à alma do autor, naquele cantinho onde repousam suas verdadeiras intenções. Note-se, por exemplo, a firmeza das negativas verbais do presidente Lula em relação à possibilidade de continuar no poder, vis-à-vis a frouxidão dos gestos efetivos para levar os correligionários a enterrar de vez o tema. E o que dizer das atuais mesuras da oposição aos partidos aliados de Lula, em contraposição aos discursos no Parlamento, classificando a base governista com insultos tais como vendida? Pois é a essa categoria de assimetria entre as intenções e os gestos que parece pertencer a fala de Fernando Henrique. "Estou com Alckmin", diz. Não está. Mas, na impossibilidade de fazer a luta livre, joga xadrez. Cerca o "lourenço" de gentilezas táticas, valoriza seu passe, prestigia a candidatura, mas, de concreto, é só. Onde a movimentação de tucanos de alta patente para demonstrar real apoio à candidatura de Geraldo Alckmin? Em lugar nenhum. O que se observa mesmo é uma torcida para a composição na undécima hora, mas nas bases pretendidas por José Serra, com Alckmin fora da disputa. Na mesma entrevista, Fernando Henrique manifesta "confiança" na rejeição do presidente Lula ao terceiro mandato. "O presidente tem declarado que é contra, e confio nele", diz. Não confia, mas no momento é o que convém dizer. Não interessa à oposição banalizar ainda mais o tema, que já está perdendo a condição de tabu, como demonstram os 50% favoráveis à idéia registrados na última pesquisa CNT/Sensus, quando eram 65% os que a rejeitavam na pesquisa Datafolha de dezembro último. Quando o presidente de honra do PSDB diz que "está" com Alckmin, mas isso não corresponde a uma demonstração robusta de apoio partidário, só há duas conclusões possíveis: ou está em marcha a dita saída honrosa ou a candidatura é mesmo "irreversível" como afirma FH, e a intenção é caracterizar a rendição diante do que não tem remédio e, portanto, remediado está. O teste de tal apoio se dará mais à frente, quando será possível observar se o grau de engajamento do PSDB, FH à frente, na campanha de Geraldo Alckmin em 2008 será maior ou menor que o empenho tucano na campanha presidencial de José Serra em 2002. Boa lembrança Leitor da capital paulista escreve para sugerir à Força Sindical que faça a gentileza de informar de onde sai tanto dinheiro para patrocinar as festas de 1º de Maio com shows de artistas caros, sorteios de casas e apartamentos. Os filiados aos sindicatos da central certamente nada têm a opor, pois devem esperar o ano todo pela chance de ganhar um dos preciosos prêmios. Mas, considerando o trânsito de verbas oriundas dos bolsos de todos na contabilidade das centrais, mediante convênios e agora o repasse de parcela do imposto sindical - sem fiscalização do Tribunal de Contas, diga-se -, o assunto é do interesse, mas talvez não seja do agrado público.

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