Íntegra do discurso de Lula na inauguração do Hospital do Idoso

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Por Agencia Estado
Atualização:

Discurso do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, na cerimônia de inauguração do Hospital do Idoso, no Acre. O Acre representa, para mim, um pouco da História de tudo que nós construímos de 1980 para cá. Eu, no começo da nossa trajetória, fiz comício no Acre, acho que com menos de 10 pessoas. Era duro pegar um avião em São Paulo e vir fazer comício em Rio Branco. Mas eu conheci o Acre antes disso. Eu conheço o Acre desde 1979, quando recebi a visita de dois ilustres cidadãos, que me procuraram no Sindicato de São Bernardo para dizer que queriam fundar um tal de partido dos trabalhadores, aqui, no estado do Acre. Somente depois de muito tempo eu fui descobrir que esses dois cidadãos ? um depois mudou de partido, foi para um outro time jogar futebol, jogar política e; o outro morreu como herói nacional ? eram o João Maia, que foi o primeiro candidato a deputado federal pelo PT no estado do Acre, e o companheiro Chico Mendes. A história se torna engraçada porque quando os dois me procuraram, eu desconfiei que era gente da polícia. Naquele tempo a gente estava sempre com a orelha em pé quando chegava algum estranho querendo discutir política com você. E eu disse para eles: não tem conversa dentro do sindicato, no sindicato eu não converso política (eu já achava que eram da Polícia Federal mesmo), depois das 8 vocês me esperam que eu saio do sindicato e nós vamos a um boteco conversar. Aí, foi no bar do Gordo ? ainda hoje existe perto do sindicato ? quando eu tomei consciência de que eram dois companheiros do Acre. O João Maia naquele tempo era assessor da Contag, e o companheiro Chico Mendes era vereador em Xapuri. Conversamos, eu lhes entreguei umas fichinhas e eles saíram construindo o nosso partido aqui pelo Acre afora. Em 82 quase que a gente elege um deputado federal, não elegemos porque os ricos daquela época evitaram colocar transporte para trazer os trabalhadores rurais para votarem, senão a gente já teria um deputado naquela época, porque aqui, neste estado, o PT nasceu forte, apesar de ser um estado distante do centro nervoso ou político do nosso país. Mas eu estou aqui, hoje, para dizer para vocês o seguinte: o estado do Acre ? eu noto muito as coisas, eu viajo muito o Brasil, e tem alguns estados que me chamam a atenção ? é um dos poucos estados do Brasil em que o povo sabe cantar e canta o hino do seu estado com muito orgulho. Um povo que aprende a cantar o hino do seu estado, significa que está com o estado incrustado no seu coração, na sua consciência, na sua cabeça. Diga-se, por sinal, que o hino do estado do Acre é de excepcional qualidade e todas as vezes em que vim aqui e que cantaram o hino, eu fiquei emocionado porque acho bonito as pessoas saberem cantar o hino da sua cidade, do seu estado, e saberem cantar o hino nacional. Isso demonstra o primeiro compromisso com o meio onde a gente vive, com as coisas que são a razão da nossa existência. Não poderia deixar de ser diferente hoje, aqui, inaugurando o Hospital para os Idosos, que leva o nome do nosso querido Lauro Campos. Eu sempre disse que um país que não cuida das crianças e um país que não cuida dos idosos, é um país que não tem alma. Quando a gente tem 20 anos de idade, a gente aguenta qualquer tranco, ou seja, qualquer coisa para a gente é brincadeira. Uma febre de 40º para um rapaz de 20 anos, ele pensa que resolve tomando conhaque, mas com uma criança ou uma pessoa de idade, é preciso ter mais cuidado porque as pessoas estão mais fragilizadas, uns no início da vida e outros no fim da vida. No Brasil, muitas vezes, não se cuidou corretamente do idoso. Eu sei que nós temos muito, mas muito pela frente para que a gente possa dar conta da responsabilidade de um Governo. Depois de muitos anos de espera, na fila do Senado, nós aprovamos o Estatuto do Idoso, garantindo direitos históricos ao idoso brasileiro, depois de dezenas e dezenas de anos reivindicando. Lógico que entre aprovar e implementar a totalidade, leva um certo tempo. Recentemente, nós unificamos a data-base para o salário dos aposentados em primeiro de maio, porque os que ganhavam um pouco mais do que um salário mínimo recebiam depois dessa data. Nós, então, juntamos tudo. E agora estamos inaugurando este Hospital. Um hospital de 39 leitos, que parece pequeno, mas nenhuma grande caminhada começa com um passo muito grande, começa com o passo do tamanho das possibilidades das nossas pernas. E nós estamos fazendo. Este é um exemplo que quero dizer às pessoas de terceira idade, aqui, no estado do Acre. Na medida em que a vida das pessoas vai melhorando, a gente vai vivendo mais. Quando eu nasci, a média de idade do povo brasileiro não deveria ultrapassar 50 anos e, aos 50 e poucos anos de idade, as pessoas morriam. Hoje, a média do povo brasileiro chega a 70 anos. E, se Deus quiser, ela vai chegar a 80, vai chegar a 90 e vai chegar a 100. Na medida em que a ciência evolua, na medida em que a qualidade de vida das pessoas evolua, a comida melhore de qualidade, o tratamento melhore de qualidade, e o aconchego dentro da casa da gente melhore, certamente a gente vai viver muito mais. Nós sabemos Tião, e eu dizia muito isso quando era presidente do Sindicato, que, muitas vezes, o companheiro se aposentava depois de 35 anos trabalhando sem parar. E o tédio passava a ser a razão pela qual ele morria mais rápido, ou seja, pelo fato de não ter o que fazer, não ter área de lazer, não ter onde estudar, não ter onde brincar. Eu digo o seguinte: a vida tem que ser um eterno namorar. Nós temos que estar sempre procurando alguma coisa para justificar a nossa passagem pela Terra. A gente não pode, nunca, se conformar com o que tem. A gente não pode nunca se conformar com as coisas que já conquistou. O ser humano é, por natureza, um ser sempre desejoso de mais. A gente nunca pode se conformar: ?estou doente, vou ficar aqui, meio acabrunhado, de cabeça baixa.? Não. Tem que levantar, porque a doença é doida para pegar quem se deixa vencer por ela. E aí nós temos que fazer o que estamos fazendo, garantindo para vocês o seguinte: no infortúnio de uma doença pegar um idoso, nós temos que ter um lugar adequado para tratá-lo. E eu acho que graças ao trabalho do senador Lauro Campos; graças ao trabalho do nosso querido companheiro Tião Viana; graças à disposição desse menino, Jorge Viana, que trabalha como se fosse um gigante pelo estado do Acre; graças à compreensão do ministro Humberto Costa, estamos inaugurando este Hospital. Eu me lembro que, quando o Fernando Henrique Cardoso era presidente da República, só tinha dois governadores que colocavam na televisão e na propaganda o dinheiro que o governo federal mandava para cá, era exatamente o governo Jorge Viana, do PT, e o governo Zeca, do PT. Se tem dez mil reais gastos aqui, são cinco do governo federal, cinco do governo estadual, e, se tiver, tanto do governo municipal. Por quê? Porque ninguém quer fazer propaganda, o que nós queremos é que a informação seja dada corretamente para o povo brasileiro saber quem é que está fazendo as coisas neste país. E isso é apenas uma questão de honestidade. O governo federal não pode fazer propaganda de uma obra, se tiver dinheiro do estado, sem mencionar o dinheiro que o estado deu. Da mesma forma que o estado não pode fazer propaganda sem dizer quem deu o dinheiro. E o que mais acontece no Brasil, hoje, é isso. E acontecia em todos os governos: Fernando Henrique Cardoso, Itamar, Sarney, os militares, ou seja, as pessoas nunca prestaram contas de quem recebe o dinheiro. Nunca. Às vezes o ministro da Saúde manda fazer uma creche e a inaugura como se fosse uma obra do prefeito. Às vezes o ministro dos Transportes manda fazer uma estrada, inaugura como se fosse do governo estadual. Às vezes você faz um programa de vacinação, o estado dá como se fosse dele e assim por diante. O povo brasileiro não fica sabendo quem, exatamente, fez as coisas no Brasil, e é por isso que a gente não perde por ser honesto, a gente não perde por ser ético na política e a gente não perde por ter paciência. Eu me lembro dos comícios que fiz em Xapuri, no tempo em que a gente não tinha nem ilusão de que chegaria à Presidência da República. E eu sou capaz de ter cada palavra guardada na minha cabeça e de dizer que nós vamos cumprir todas elas. E aquelas que não cumprirmos não será por falta de vontade, mas por falta de tempo ou por falta de recursos para fazermos aquilo que a gente precisa. Governar, não é diferente da vida na casa da gente. De vez em quando se inventa um monte de dificuldades, mas governar é exatamente isso. Quando a gente está em casa e recebe o salário, a gente só pode gastar aquilo que recebeu. Se gastar mais do que recebeu, a gente contrai uma dívida. Se a gente contrai uma dívida e não tratar de pagá-la, essa dívida vai aumentando, e chega um tempo em que a gente perde até aquilo que comprou porque não pode pagar. Nós pegamos este país com uma dívida praticamente impagável, e todo mundo sabe disso. Todo mundo sabe que nós também tomamos a decisão de não ficar falando dos governos anteriores. Nós temos que olhar para frente e fazer aquilo que nós nos propusemos a fazer com dificuldade ou sem dificuldade. E eu vou dizer uma coisa para vocês: quanto mais dificuldades, mais eu gosto. Eu sou um homem chegado a desafios, eu acho que se as coisas fossem fáceis, se estivesse tudo pronto, acabado, nós não ganharíamos as eleições. Nós só ganhamos porque o povo brasileiro falou: espera aí! Essa gente governa o Brasil desde que Cabral chegou aqui, há 500 anos. É um tal de diz que diz e a gente está sempre na ?pindura?. Vamos experimentar o pião que veio do nosso meio. É por isso que eu tenho guardado, Elpídio, na minha cabeça, cada compromisso que assumi e, muitas vezes, eu sei da pressa. Todos nós somos apressados. Eu me lembro quando a Marisa me comunicou: ?Lula, estou grávida?. Era do meu primeiro filho, o Fábio. Eu fiquei pensando: puxa vida, vou ter que esperar nove meses. Não dá para nascer amanhã não? Mas eu tive que esperar os nove meses. Governar também é isso. O ano passado foi um ano em que nós comemos o pão que o diabo amassou, plantando, tirando as ervas daninhas que estavam espalhadas pela nossa lavoura. Deixamos o roçado pronto, plantamos e este ano começamos a colher. Este hospital é um exemplo do primeiro frutinho que nós estamos colhendo no estado do Acre e vamos colher muito. E por que vamos colher muito? Porque nós temos muito mais dinheiro para investir, nós temos mais condições de financiamento e nós temos condições de fazermos muito mais. Por exemplo, Jorge, nós liberamos em dezembro do ano passado, 1 bilhão e 700 milhões para saneamento básico. Em 2002, Jorge, só para você ter uma idéia, foram liberados 1 bilhão e 400 milhões, só foram contratados 262 milhões e só foram pagos 19. Ou seja, nós, em apenas um ano, liberamos muitas vezes mais, o que começa a dar frutos este ano, porque as pessoas estão fazendo os contratos, as licitações para começarem a produzir. E este ano tem muito mais. Este ano, só do superávit nós vamos ter 3 bilhões para investir em saneamento básico, coisa que muita gente não fazia há muitos anos no país. É só pegar o secretário de habitação ou de serviços urbanos que ele vai te contar quantos anos o Brasil ficou sem investir corretamente. Entre 1998 e 2001 morreram neste país, 300 mil crianças ? está no nosso projeto de Moradia ? por doenças causadas pela falta de saneamento básico no Brasil. E por que não se gosta de fazer saneamento básico? Porque saneamento básico, dizem, é enterrar dinheiro, e as pessoas não vêem a obra. Não dá para colocar o nome de um parente no muro, não dá para colocar ?viaduto fulano de tal?. Não dá para colocar nome em manilha. A gente colhe o resultado é na qualidade da saúde das nossas crianças, é na qualidade da saúde do nosso povo. E é isso que nós vamos fazer. Da mesma forma que temos muito mais dinheiro para financiar habitação; da mesma forma que temos muito mais dinheiro para financiar projetos. Eu tenho dito para os empresários, quem tiver projeto apresente, porque não falta dinheiro para fazer esse país se desenvolver e crescer. Agora, as coisas serão feitas com a maior responsabilidade. Como este ano é um ano eleitoral, Jorge, é importante ressalvar isso aqui. Este é o ano em que todo mundo se dá ao luxo de falar o que bem entende, e eu acho normal. Como eu falei muito a vida inteira, não reclamo de quem fala. Eu só queria lembrar uma coisa: tem gente que governou este país, nos últimos 30 anos e a grande maioria está no poder ainda, não saiu! Então, já estão no poder há 30 anos. E agora, eles cobram de nós, como se nós pudéssemos fazer, em 500 dias, o que eles não fizeram em 500 anos. Não dá para fazer com essa rapidez. Mas do que eles têm medo, na verdade? O Tião Viana está no Senado e sabe as dificuldades que nós temos para aprovar as coisas naquela Casa. É preciso muita conversa. Eu sempre acho que todo ser humano é bom, até que prove o contrário. Mas tem gente que pensa: ?Por que votar nas coisas que o Governo manda para cá, se isso vai favorecer o Governo? Por que votar nas coisas que podem mudar o Brasil?? Quantos anos eles passaram para votar a reforma tributária? Nunca votaram. Nós, em sete meses, votamos. Quanto tempo eles passaram para votar a reforma da Previdência? Nunca votaram. Nós votamos. Sabe por que eles não votavam? Porque eles pensavam nas próximas eleições. E nós queremos pensar no Brasil daqui a 20 ou 30 anos. Eu quero saber qual é o Brasil que o meu neto vai herdar, das coisas boas que nós fizemos agora, das coisas que estamos plantando agora. Eu tenho dito o seguinte: tem gente que não se conforma. Vocês já perceberam quando um jogador está no banco de reserva? Quando ele entra, aquele que sai fica com medo: ?Será que ele vai marcar um gol?? O cara jogou 80 minutos, o outro joga só dez, ele fica com medo. Tem gente que não se conforma que a gente faça bem as coisas. Este estado tem, no companheiro Jorge Viana, a maior demonstração disso. Eu sei o quanto esse companheiro foi atacado. Para atacar esse companheiro, até o crime organizado merecia destaque nas primeiras páginas de jornais, metiam o pau. Ou seja, eu sei o que ele passou quando foi prefeito, depois governador. E levou tempo, mas nós somos acostumados a apanhar. E hoje o povo do Acre pode bater no peito com orgulho e dizer: O Acre já teve muitos governadores, mas nenhum chegou perto da qualidade do companheiro Jorge Viana e do compromisso que o Jorge Viana tem para com esse povo. E eles têm a preocupação de que isso aconteça conosco. Ora, imagina para eles, que governam há 500 anos, de repente, um pernambucano, torneiro mecânico, do PT, fazer mais do que eles. É demais, eles não vão querer isso, eles vão tentar atazanar a nossa vida. O que nós temos que fazer? Não perder a tranqüilidade nunca, ficar sempre tranqüilos, sempre de bom humor e ter a certeza do quê? Ter a certeza de que os nossos compromissos não são eminentemente eleitorais, os nossos compromissos com esse povo são compromissos de vida, são compromissos históricos, que não estão apenas na cabeça, estão no nosso sangue. E a inauguração deste Hospital para as pessoas da terceira idade é apenas uma vírgula daquilo que a gente vai poder fazer na Saúde. Eu ia trazer aqui, Jorge, a gente ia entregar, hoje, 10 ambulâncias, mas é importante confessar que a gente não trouxe porque faltavam alguns equipamentos e não dá para a gente inaugurar a obra inacabada. No Brasil, existe a mania de se inaugurar uma obra e, depois de três meses, a gente detecta que a obra não está pronta, principalmente quando está chegando o ano eleitoral. Então, nós vamos na Mercedes Benz, buscar 380 das 1.480 ambulâncias que nós vamos distribuir para os municípios, para fazer resgates. São ambulâncias chiques e com muito equipamento. Eu aprendi com o Joãozinho 30: ?quem gosta de miséria é intelectual?. O povo gosta é de coisa boa, o povo gosta de ser bem tratado. Então, eu vou na Mercedes Benz, no dia 26, com o Humberto Costa, receber as primeiras 380 ambulâncias, e depois do dia 26, Jorge, não sei se o Tião Viana vai trazê-las guiando uma atrás da outra mas, de qualquer forma, depois do dia 26, vocês vão receber essas ambulâncias. O Jorge está reivindicando alguma coisa para o Acre que nós vamos cuidar: ele está reivindicando à Superintendência da Polícia Rodoviária, o que eu acho plenamente possível colocar aqui. Nós vamos ter que trabalhar com carinho porque este estado não pode prescindir de um helicóptero porque senão há desmatamento. O Humberto Costa me mostrou, no avião, que neste plano de ambulância especial vai ter uma ambulância que não é ambulância, é um barco que vai fazer o papel da ambulância para cuidar dos povos ribeirinhos, ou seja, nós vamos fazendo as coisas na medida do possível. O que eu quero que vocês façam é o seguinte: nunca deixem de nos cobrar. Se vocês deixarem de cobrar, a gente pensa que tudo está bem. É importante cobrar, é importante reclamar, porque quem quer ser presidente da República tem que ter os ouvidos bem grandes para ouvir o clamor do seu povo. Muito obrigado e boa sorte para vocês.

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