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Habeas-corpus divide opinião de especialistas

Dalmo Dallari considera ?infeliz? decisão de liberar Dantas; Cândido Mendes elogia presidente do STF

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Foto do author Vera Rosa
Por Vera Rosa , Felipe Recondo e BRASÍLIA
Atualização:

A prisão do banqueiro Daniel Dantas dividiu as opiniões. Para o jurista Dalmo de Abreu Dallari, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, errou ao conceder habeas-corpus a Dantas. "Foi uma decisão infeliz", resumiu. De posição oposta, o cientista político Cândido Mendes declarou que o ministro "fez muito bem" ao mostrar que a Polícia Federal não pode agir sob a luz dos holofotes. Para o cientista político, houve crime de imagem, pela situação em que foram mostrados os presos. "Em nenhum país do mundo são feitas essas prisões espetaculares", destacou Cândido Mendes. "O problema não é Daniel Dantas ser preso: é quantos injustiçados são presos e, pela Constituição, a lei tem de valer para todos." No próprio STF há divisão sobre a conveniência da decisão de soltar o banqueiro. São muitos os pedidos de habeas-corpus - quase sempre pedidos de liberdade da prisão - rejeitados pelos ministros, sob a justificativa de que cabe aos tribunais inferiores esgotar a linhas de recursos. Para endossar sua opinião, porém, Dallari lembrou que há dois fundamentos para a manutenção da prisão, num caso como o do banqueiro: de um lado, o risco de fuga e, de outro, a interferência do acusado nas investigações. Depois de haver sido libertado, na madrugada de ontem, o banqueiro foi mais uma vez preso pela Polícia Federal, no início da tarde. "O ministro ignorou isso, não levou em conta jurisprudências", argumentou Dallari. Para ele, Mendes ficou tão indignado quando a Polícia Federal divulgou seu nome na Operação Navalha - quando, na verdade, se tratava de um homônimo - que "perdeu a serenidade ao decidir". Apesar de se dizer "entusiasmado" com a "absoluta independência" da Polícia Federal - que, no seu diagnóstico, mostra não haver criminosos privilegiados no Brasil -, Dallari também vê "exageros" dos agentes nas operações. "Essa exposição pública ou espetáculo da algema é dispensável", comentou o jurista. "Isso não é necessário para que a polícia ganhe prestígio." Dallari destacou que a PF precisa ter "comedimento e prudência", porque os acusados ainda não foram julgados. "Em direito prevalece a presunção da inocência, que está na Constituição", insistiu. DISCRIÇÃO O ministro das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, concorda com Dallari. "Na própria Polícia Federal há um código estabelecendo que essas operações devem ser feitas com discrição. Esse código foi quebrado", constatou ele. Mesmo sem querer comentar a prisão preventiva de Dantas, Múcio observou que a população muitas vezes não entende o vaivém da Justiça. "A sociedade fica perplexa: uma hora a pessoa está solta, outra hora está presa." Na avaliação do ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Sepúlveda Pertence, presidente da Comissão de Ética do governo, não houve crime de imagem na primeira prisão de Dantas, filmada pela Rede Globo. "São excessos típicos de um Estado de espetáculo que vivemos em praticamente todo o mundo", afirmou. "De qualquer forma, acho que devemos fazer um esforço para garantir a todos, suspeitos e investigados, esses direitos elementares para evitar a imagem destruída." PERGUNTAS E RESPOSTAS Se não havia foro privilegiado, por que o habeas-corpus para Daniel Dantas foi decidido no STF? Dantas e sua irmã Verônica já tinham impetrado habeas-corpus no Tribunal Regional Federal (TFR) da 3ª Região, de São Paulo, e no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Nos dois tiveram as liminares negadas. Por isso recorreram ao STF Por que os advogados fizeram um adendo ao habeas-corpus preventivo pedido tempos atrás? Temiam que os clientes fossem presos em junho e se adiantaram. Quando a Justiça decretou a prisão, essa decisão facilitou o trabalho dos advogados, que puderam acionar imediatamente o STF A decretação de prisão não configura um fato novo, o que demandaria um novo habeas corpus, encaminhado à primeira instância? Na decisão de quarta-feira, Mendes afirmou que o habeas corpus inicial era preventivo, mas, após as prisões, o pedido passou a ter caráter "liberatório". Por isso, disse, podia analisar o caso ainda com base no primeiro pedido. Alguém pode ser mantido preso só para ser interrogado pelo juiz? Não há, segundo o presidente do STF, lei que permita a prisão só para interrogatório. A Constituição é excessivamente liberal ou é o Código do Processo Penal que a contradiz? Juízes e promotores argumentam que o STF faz leitura restrita do Código Penal, o que inviabilizaria prisões preventivas e temporárias. Ministros e advogados alegam haver abusos nas prisões e desrespeito aos direitos individuais.

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