''''Há um desencanto, uma tristeza grande no País''''

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Por Fausto Macedo
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O País está perdendo a confiança nas instituições oficiais, alertou ontem o empresário Alencar Burti, presidente da Associação Comercial de São Paulo. "Há um desencanto, uma tristeza grande, e quando isso prevalece sempre pode surgir um aventureiro para levar o País a um destino muito ruim, sem rumo." Burti, de 76 anos, paulistano da Liberdade, incorporou-se ao Movimento Cívico pelo Direito dos Brasileiros, que será lançado hoje em São Paulo na sede da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). O movimento não é um ato político, mas uma manifestação cívica de cidadania, informa a OAB. Para estimular a adesão pública, a partir de amanhã estará nas ruas uma campanha publicitária. Peças de mídia impressa e eletrônica vão exibir pessoas de todas as idades, raça e classes sociais descrevendo situações e fatos que contribuem para a sensação de caos. A jornada reúne algumas das principais lideranças do País. "A meta é despertar a sociedade para que resgate direitos praticamente esquecidos pela inércia do poder público", declara Burti, que cresceu na Rua Genebra, bairro do Bexiga. "Era um tempo em que não se prescindia da honra. Aquele que assumia uma conduta incompatível a nossa rua excluía prontamente. Temos que recuperar esses valores, do contrato de honra, o tempo saudável do olho no olho que caiu em desuso." Burti assumiu a presidência da Associação Comercial de São Paulo em abril. Ele revela indignação diante dos descaminhos do País, a violência, a corrupção, desmandos, omissões. Rebela-se contra os escândalos de malversação de dinheiro público, "que não têm conseqüência alguma", contra o descaso da administração pública e contra a carga tributária, que reputa perversa. Este ano, contabiliza a entidade que preside, o governo já arrecadou R$ 502 bilhões em tributos. "É o que nós, pobres brasileiros, pagamos para ocupar esse maravilhoso País. Nós queríamos apenas ter um retorno compatível com o que pagamos." Qual a importância dessa mobilização pela cidadania? A grande importância é a recuperação de determinados valores e a conscientização da sociedade. Quem governa é a sociedade. Quem executa é o governo. Mas a sociedade parece anestesiada, parece ter perdido a noção da sua importância. A essência do movimento é mostrar a todos os setores governamentais que há um desencanto que se transforma em cansaço, em fadiga, e pode se transformar em revolta. O Legislativo, o Judiciário e o Executivo devem ficar atentos para isso. A sociedade está perdendo a paciência. O governo deve evitar que um estado de espírito desses não seja epidêmico. Isso pode ter conseqüências graves. Deus nos livre do que poderá vir. O movimento é extremamente pacífico, mas profundamente significativo. Um movimento silencioso que vai se transformar em um grito agudo da sociedade para que os poderes fiquem em estado de alerta diante do risco que o País está correndo. É uma mobilização sem agressão, não é contra esse ou aquele partido. É uma defesa legítima e fundamental da sociedade que tem que mostrar seu desagrado, descontentamento, inconformismo, tristeza, cansaço. Sua indignação. Por que chegou a esse ponto? Ninguém toma providências, os poderes não assumem uma atitude para mudar. Vamos analisar a tragédia do Airbus da TAM. Buscam uma desculpa, o motor, o reverso, a pista, a chuva. Pode haver uma fatalidade. O que não se pode aceitar é que há mais de um ano muitos setores vêm alertando para os riscos de um grave acidente, mas ninguém se mexeu para corrigir erros, a posição dos controladores, a estrutura precária, equipamentos defasados. Havia uma pressão, mas será que ficaram tão à margem que nem a morte de um semelhante sensibiliza mais os poderes constituídos para que atuem em benefício do Brasil? Isso é estarrecedor. A corrupção não tem fim? O problema está aí, na soma de fatores. São coisas que vêm de anos e o País não vê nenhuma atitude. A Polícia Federal tem varrido esquemas de corrupção, mas não tem conseqüência. É como expor uma criança doente e faminta e passa todo mundo e ninguém estende a mão para socorrê-la ou para dar o que comer. Onde estão os homens públicos? Quem assume cargo público tem que estar consciente de suas responsabilidades. Ainda há tempo? Homens de empresa e homens que amam a vida não podem perder a esperança. É fundamental a fé. Temos que trabalhar, que cada brasileiro volte a amar o seu País e a cobrar os poderes constituídos. O País está perdendo a confiança nas instituições oficiais. O Movimento Cívico não vai resolver tudo, mas temos que buscar no coração do brasileiro a solução, uma ferramenta de ação, de cobrança do poder público. A sociedade precisa se reorganizar para fazer valer seus direitos sob pena de amanhã nos transformarmos em súditos dessa estrutura. Que o Executivo não use a fraqueza da Câmara e do Senado para se aproveitar politicamente disso. Os partidos políticos têm que entender que, antes de defender seus interesses, devem prevalecer os interesses da sociedade. Quem os colocou lá foi a sociedade. Está acontecendo exatamente o inverso. Prevalecem interesses pessoais ou dos partidos e o cidadão vai sendo esquecido. Quem é: Alencar Burti Alencar Burti, paulistano, 76 anos, controla 4 empresas Preside a Associação Comercial de São Paulo (ACSP) desde abril. Também é presidente da Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB) e da Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo (Facesp)

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