Governo tenta ampliar inserção do País nas decisões internacionais

Por Agencia Estado
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O Palácio do Planalto acredita que 2002 será um ano de oportunidades para o País na esfera internacional. De um lado, o presidente Fernando Henrique Cardoso tentará colocar em prática sua estratégia para elevar o Brasil aos grupos decisórios mundiais e garantir maior previsibilidade para sua economia. De outro, os negociadores terão o desafio de enfrentar pesadas barganhas comerciais em três frentes - a Organização Mundial do Comércio (OMC), a Área de Livre Comércio das Américas (Alca) e o acordo entre União Européia e o Mercosul. Em boa medida, as chances de o Brasil pleitear um espaço entre os países que decidem surgiram com os atentados de 11 de setembro nos Estados Unidos. Uma fonte do Palácio do Planalto explicou à reportagem que a tragédia teve como efeito, na órbita diplomática, o questionamento da hegemonia americana no mundo. O próprio governo do presidente George W. Bush passou a trabalhar de forma mais cooperativa com países declaradamente aliados aos seus esforços de combate ao terrorismo e ainda flexibilizou posições antes mantidas com rigidez em vários foros de negociação. Os sinais dessa mudança foram percebidos na reunião ministerial da OMC em Doha, em novembro. A ação dos diplomatas americanos foi orientada para a busca do consenso em favor do lançamento da nova rodada multilateral do comércio. Para tanto, os Estados Unidos concordaram em colocar na mesa de negociações temas que pretendiam manter à salvo das discussões, como a sua legislação antidumping. As mostras da nova orientação americana também vieram com a ausência da tradicional oposição aos pleitos do Brasil de uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU), de reforma do G-8 - o grupo dos países mais ricos do mundo e a Rússia -, e de novas regras sobre o movimento dos capitais internacionais. De acordo com essa mesma fonte, em outros momentos a diplomacia dos Estados Unidos teria se manifestado claramente contrária. As oportunidades do Brasil deverão ser exploradas nos eventos já agendados para o primeiro semestre de 2002. A defesa de uma posição de maior relevância para o País no cenário internacional deverá ser retomada na Reunião de Cúpula da Governança Progressiva, fórum que se reunirá nos dias 22 e 23 de fevereiro, em Estocolmo (Suécia). O evento deverá arrematar o esforço diplomático de FHC, que defendeu essa mesma idéia pessoalmente aos líderes da França, da Espanha, da Inglaterra, dos Estados Unidos e da ONU nos últimos dois meses. No mês seguinte, em Monterrey (México), o Brasil deverá aliar-se aos países que defendem uma nova "arquitetura financeira" mundial, capaz de financiar o desenvolvimento dos países mais pobres e a inserção deles no comércio e entre os alvos de investimentos internacionais. A Conferência das Nações Unidas sobre o Financiamento ao Desenvolvimento tratará ainda de outros pontos de interesse do Brasil, como a contenção da volatilidade dos fluxos financeiros e a reformulação do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial (Bird). "Não queremos que os fluxos financeiros sejam inibidos, até porque o Brasil e outros países emergentes necessitam da poupança externa para financiar seu desenvolvimento", afirmou o embaixador Marcus Caramuru, assessor internacional do Ministério da Fazenda e representante brasileiro nas reuniões preliminares. "Mas precisamos contar com certa regulação, para que haja maior previsibilidade para essas mesmas economias." Na área comercial, os negociadores brasileiros começarão a jogar em três tabuleiros ao mesmo tempo. Durante o mês de janeiro, os 142 membros da OMC vão se reunir em Genebra para montar a estrutura que vai levar adiante a nova rodada multilateral, até 2005. Segundo o embaixador José Alfredo Graça Lima, subsecretário-geral de Assuntos de Integração, Econômicos e de Comércio Exterior do Itamaraty, a expectativa é que até março a máquina negociadora - os grupos de trabalho e comissões especiais - começará a receber as ofertas de cada país e acionar as discussões. O Palácio do Planalto trabalha ainda com a possibilidade de explorar um curto período, entre o início de maio e o final de junho, para o ataque a um dos pontos mais controversos na nova rodada da OMC - a redução de subsídios à produção e à exportação agrícola, principalmente os da União Européia. Esse período corresponde ao da organização do novo governo francês, depois das eleições presidenciais de 28 de abril, e o final da presidência espanhola da União Européia. A França, atualmente, é um dos países mais resistentes à diminuição dos subsídios, e a Espanha, um dos mais abertos às demandas dos latino-americanos. A Alca também deverá disparar em março as negociações sobre acesso a mercados, ou seja, sobre como se darão as reduções de tarifas e de medidas não-tarifárias aplicadas pelos 34 países da região. Trata-se do principal tema, do ponto de vista do Brasil e de seus sócios do Mercosul. A expectativa de ver essa discussão fluir, entretanto, depende da decisão final do Congresso dos Estados Unidos em relação ao Trade Promotion Authority (TPA). Trata-se da permissão para o governo fechar acordos comerciais, sem o risco de vê-los emendados depois pelos deputados e senadores. O tema, aprovado pela Câmara na semana passada, ainda vai passar pelo Senado. E, pelo sistema em vigor nos EUA, o Senado pode aprovar um texto diferente daquele que saiu da Câmara - o que complicaria as negociações da área agrícola. Em abril, em Buenos Aires, será a vez da negociação do acordo entre União Européia e o Mercosul deslanchar no mesmo tópico - o acesso a mercados. Como ambos os blocos já apresentaram suas ofertas negociadoras, consideradas modestas, a fase que iniciará em março é a da clássica barganha.

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