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Governo põe sob sigilo dados de veículos lançadores de satélites; ato dispensa licitação de foguete

Medida facilita aquisição de equipamento finlandês avaliado em de R$ 145 milhões, que deve ser integrado aos sistemas de controle e vigilância das fronteiras

Foto do author Marcelo Godoy
Por Marcelo Godoy
Atualização:

O presidente Jair Bolsonaro decretou sigilo sobre os dados e a dispensa de licitação para compras ou para contratação de serviços e obras relacionadas ao lançamento de veículos espaciais e aos serviços ligados aos seus projetos. A decisão foi tomada por meio do decreto 10.631, que ampliou a quantidade de atividades relacionadas à segurança nacional. Assinaram ainda o documento o ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, e o ministro chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno Ribeiro Pereira.

Em nota, o Ministério da Defesa negou que as mudanças no decreto tenham alguma relação com a compra sem licitação por R$ 145 milhões de um satélite finlandês para o monitoramento, que deve ser integrado aos sistemas de controle e vigilância das fronteiras, da Amazônia e das águas do Oceano Atlântico. A mudança publicada no decreto, segundo a pasta, está “diretamente relacionada à necessidade de classificar como atividade de segurança nacional o lançamento de artefatos espaciais civis partindo de uma Unidade administrada pela Força Aérea Brasileira”. 

A Base de Alcântara, no Maranhão; governo decretou sigilo sobre uma dispensa de licitação para serviços de lançamento de satélites Foto: VALTER CAMPANATO/AGÊNCIA BRASIL

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Essa unidade é a Base de Alcântara, no Maranhão. A Defesa informou ainda que, “em virtude dos desafios tecnológicos, houve o realinhamento da estratégia de desenvolvimento de veículos lançadores de satélite, sendo a prioridade atual o projeto do Veículo Lançador de Microssatélites (VLM-1)”. O projeto VLM-1 tem por objetivo o desenvolvimento de um “veículo destinado ao lançamento de microssatélite em órbitas baixas (LEO) equatoriais ou de reentrada, com três estágios”.

Terceira tentativa

Previsto para ter seu primeiro lançamento em 2019, o VLM-1 é a terceira tentativa do programa espacial brasileiro para contar com um veículo lançador de satélites. Duas outras tentativas – o projeto VLS e o projeto Cyclone-4, em parceria com a Ucrânia – foram abandonados depois de fracassos, ao custo de mais de R$ 850 milhões. Não há nova estimativa para o lançamento do VLM-1 – em setembro passado, a Força Aérea testou o transporte do motor S50, feito em parceria com a Avibrás. 

O VLM-1 terá um novo sistema propulsor movido a combustível sólido, com três estágios. Trata-se de um projeto feito em parceria pelas agências espaciais do Brasil e da Alemanha. O projeto prevê ainda a construção de um veículo menor, suborbital, o VS-50.O plano é usá-lo para testar os sistemas que estarão no VLM-1. Seu primeiro voo deve ser feito em Alcântara. A parceria com a Alemanha prevê dois lançamentos do VS-50 e um do VLM-1. 

As alterações feitas no decreto que dispensa a licitação para compras que possam comprometer a segurança nacional por Bolsonaro incluem pela primeira vez – o decreto original é de 1997 – os veículos lançadores em uma categoria que já tinha as compras na área de inteligência, segurança de informação, segurança e defesa cibernética e das comunicações. Em tese, a mudança não incluiria a compra dos satélites, alvo de críticas de especialistas.

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Apesar de a tecnologia do equipamento comprado ser conhecida, os militares da Força Aérea decretaram sigilo sobre os dados da compra do satélite finlandês, considerado desnecessário por especialistas em monitoramento. Para o diretor do secretariado do Grupo de Observações da Terra (GEO, órgão vinculado à ONU), Gilberto Câmara, o sigilo no caso não protege informações sobre uma tecnologia que, se revelado, poderia comprometer a segurança do País. “São informações públicas. Estão na internet.”

Câmara foi diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) de 2006 a 2013. De acordo com ele, o Inpe hoje já usa de graça imagens de satélites europeus que conseguem cobrir a Amazônia em três dias, enquanto os satélites encomendados pelos militares vai demorar dois meses para fazer o mesmo serviço. “Nem de graça esse satélite é melhor do que o Inpe já usa.” Atualmente os dados sobre desmatamento no País são públicos, o que tem causado atritos com o governo Bolsonaro. “Nós tememos que o governo tente fechar os dados”, disse. 

Para o governo, não há sobreposição de funções entre o sistema do Inpe e o do Ministério da Defesa, mas complementaridade.

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