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Governo Médici ordenou por escrito silêncio sobre tortura

Comissão da Verdade revela que norma de Médici impedia agentes públicos de dar esclarecimentos a órgãos no País e no exterior

Por Roldão Arruda
Atualização:

SÃO PAULO - A Comissão da Verdade revelou nesta segunda-feira, 4, que o governo militar determinou a todos os agentes públicos no Brasil e no exterior, a partir de 1972, que não atendessem a nenhum pedido de esclarecimento de organizações nacionais e internacionais sobre mortos e desaparecidos em consequência da repressão.

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A determinação foi feita por escrito: saiu do gabinete do presidente da República, general Emílio Garrastazu Médici, e foi assinada pelo secretário-geral do Conselho de Segurança Nacional, o também general João Baptista de Oliveira Figueiredo, que viria a ser o último presidente do regime anos depois.

O ato foi uma reação específica às ações da Anistia Internacional, que vinha denunciando e cobrando esclarecimentos sobre violações de direitos humanos, como torturas, desaparecimentos e assassinatos de opositores.

O documento se tornou uma espécie de orientação geral que vigorou ainda no governo posterior, do general Ernesto Geisel.

A ditadura, segundo o coordenador da Comissão Nacional da Verdade, Cláudio Fonteles, temia as repercussões que denúncias sobre violações de direitos humanos pudessem causar entre militares e policiais civis envolvidos diretamente com a repressão. “Para manter a coesão de sua estrutura repressiva”, escreveu o coordenador da comissão, “o Estado ditatorial militar fecha-se, aniquila as liberdades públicas e, incontrolado sobrepõe-se a todos e a tudo”.

Desmoralização’. Em 1976, a Informação Confidencial n.º 22/16/AC, da Agência Central do Serviço Nacional de Informações, tinha como foco principal a “campanha internacional de desmoralização” de membros das unidades de repressão.

Incluía entre os organizadores dessas campanhas a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a Anistia Internacional e, com maior destaque, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

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No fundo, segundo a ditadura, todas essas entidades eram manipuladas pelo que chamava de Movimento Comunista Internacional. Seu objetivo era “colocar no banco dos réus os elementos responsáveis pelo quase total desbaratamento das organizações subversivas que atuam no Brasil.”

Lista. O informe do SNI cita uma lista, que circulava no Brasil e no exterior, com nomes de supostos torturadores. Identifica-os como oficiais e praças das Forças Armadas, a maioria do Exército, e assinala que sempre atuaram sob ordens de seus chefes.

Na parte final destaca que essas denúncias acabam provocando o “surgimento de um clima de desestímulo e de certa apreensão entre os componentes dos órgãos de segurança”. E mais: “Parece-lhes que as autoridades superiores os estão colocando, indiscriminadamente, sob suspeição e que estão dando crédito às denúncias recebidas.”

O ataque particular à OAB devia-se principalmente a um pedido de esclarecimentos sobre a situação dos presos políticos, feita em novembro de 1975.

A principal providência tomada pelas autoridades na época foi um pedido de exame grafotécnico das assinaturas do documento e a identificação de seus autores.

 

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