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Gilmar Mendes considera 'normal' reação dos juízes

Manifesto assinado por juízes havia criticado decisão de Mendes de enviar ao CNJ cópia da decisão De Sanctis

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Por Adriana Chiarini e da Agência Estado
Atualização:

Em sua primeira declaração após conceder pela segunda vez habeas-corpus ao banqueiro Daniel Dantas, dono do Banco Opportunity, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, disse neste sábado, 12, considerar "absolutamente normal" a reação de juízes e procuradores à sua decisão.   Veja também: Leia a íntegra e saiba quem são os juízes que assinam o manifesto Após habeas-corpus, Daniel Dantas deixa prisão em São Paulo Opine sobre nova decisão que dá liberdade a Dantas  Íntegra da decisão assinada pelo presidente do STF  Você concorda: não há mais intocáveis no País  Entenda como funcionava o esquema criminoso  Veja as principais operações da PF desde 2003  Entenda o nome da Operação Satiagraha, que prendeu Dantas     Um manifesto assinado por juízes federais havia criticado o envio ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), pelo presidente do STF, de cópia da decisão do juiz Fausto Martin De Sanctis, da 6.ª Vara Criminal Federal de São Paulo, que decretara as prisões preventivas de Dantas e de outros acusados. O ato foi interpretado por colegas de Sanctis como uma intimidação. "Não fiz representação formal, só o registro mesmo", disse o ministro.   Em outro momento, ele disse que o objetivo era "o acompanhamento estatístico". No entanto, de acordo com o professor de direito José Ribas Vieira, tecnicamente o registro feito à corregedoria do CNJ equivale a um pedido de investigação. Procuradores também criticaram a decisão do ministro.   O presidente do STF participou hoje da banca examinadora da tese de doutorado "Do direito ao silêncio à garantia de vedação de auto-incriminação - o STF e a consolidação das garantias processuais penais", do advogado Thiago Bottino do Amaral, na PUC do Rio.   Durante seus comentários, o ministro observou que, diante do questionamento se em momento de insegurança deve se optar por priorizar a segurança em detrimento dos direito fundamentais, "o Supremo não tem dúvida em afirmar que há que se realizar a segurança com respeito aos direitos e garantias fundamentais".   Segundo ele, "quando um juiz segue o canto da sereia da mídia, ele descumpre direitos e garantias fundamentais". O presidente do STF destacou o habeas-corpus como um tema que ganha relevância nesse contexto.   Ele afirmou que há um grau "elevadíssimo" de recursos por habeas-corpus no STF. "É dado revelador de alguma patologia no sistema ou de alguma incongruência", afirmou. Disse também que mesmo pessoas que sabidamente tenham cometido crimes devem ter assegurados os seus direitos e garantias fundamentais.   O ministro ressaltou que se deve aplicar ao processo penal o princípio da dignidade da pessoa humana. Ele concluiu elogiando o trabalho sob a perspectiva de diálogo e crítica ao STF. "Não temam fazer críticas à jurisprudência do Supremo."   O advogado Bottino do Amaral afirmou que o Estado de exceção no Brasil está presente na violência policial e do Exército, na procuradoria e também nos tribunais. "Felizmente não está no Supremo e também não esteve antes, mesmo com a mudança total dos componentes da Corte", disse ele, que estudou a jurisprudência do STF de 1988 a 2007 sobre o tema.   O autor, que teve a tese aprovada, citou a "banalização dos monitoramentos telefônicos e a exibição de pessoas com algemas, sem necessidade, e de roupas íntimas, na intimidade do seu lar", numa referência à prisão do ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta, filmado sendo preso de pijama também na operação Satiagraha, entre outros exemplos.   "Hoje a gente vive um regime de caça às bruxas até dentro de tribunais, com muita gente cedendo à pressão, mas há uma maioria silenciosa que respeita os direitos e garantias fundamentais - autorizam a busca e apreensão em domicílio, mas não prisões temporárias", disse Bottino do Amaral.   Também integrava a banca o professor Mauro Dias, que destacou a "atualidade da tese" e referiu-se a um "terrorismo estatal". Segundo Dias, "o ativismo judicial tem levado o Judiciário a opções trágicas".   Depois, em entrevista, o professor comentou, sobre o caso Daniel Dantas, que, "se existe até direito ao silêncio, não é admissível a espetacularização das prisões". Quando indagado se estava referindo-se à PF, Dias respondeu que falava de "todo o contexto".   Polêmica   No despacho divulgado ontem, por volta das 17h30, o chefe da mais alta corte do País desqualifica os argumentos usados por De Sanctis para justificar o retorno de Dantas à carceragem da PF e acusa o magistrado de resistir reiteradamente às decisões do Supremo.   "O novo encarceramento do paciente revela nítida via oblíqua de desrespeitar a decisão deste Supremo Tribunal Federal", destacou Mendes, no despacho. "Não é a primeira vez que o juiz insurge-se contra decisão emanada desta corte."   Para tentar comprovar a resistência do juiz às decisões do Supremo, Mendes citou o caso do empresário russo Boris Abramovich Berezovsky, dono da MSI, que patrocinava o clube Corinthians.   Berezovsky é acusado de usar o patrocínio para lavar dinheiro. Por decisão liminar do ministro do STF Celso de Mello, o processo deveria ser suspenso enquanto o habeas corpus não fosse julgado no mérito. De Sanctis, segundo Mendes, tentou burlar a decisão.   Operação Satiagraha   Dantas é alvo da operação Satiagraha, da Polícia Federal (PF), que desmontou esquema de desvio de recursos públicos, lavagem de dinheiro, uso de informação privilegiada, entre outros crimes. Os pedidos de prisão apresentados na terça-feira, 8, atingiram, além de Dantas, o megainvestidor Naji Nahas, o ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta e mais 21 pessoas. Contudo, apenas uma pessoa continua presa - Hugo Chicaroni.   Novas provas   Para decretar a segunda prisão de Dantas, a preventiva, De Sanctis alegou que novas provas demonstrariam que o banqueiro ordenou a tentativa de suborno a um delegado envolvido na Operação Satiagraha para que seu nome fosse excluído da investigação. Da primeira vez, o controlador do Banco Opportunity foi preso em caráter temporário para que fosse interrogado e para que a Polícia Federal pudesse colher novas evidências.   Mendes refutou as novas provas citadas por De Sanctis para determinar a preventiva. "O exame do panorama probatório até aqui conhecido indica que a própria materialidade do delito (suborno) se encontra calcada em fatos obscuros, até agora carentes de necessária elucidação, dando conta de se haver tentado subornar delegado da Polícia Federal", alegou, no seu despacho.   A Polícia Federal filmou a tentativa de dois emissários de Dantas de subornar o delegado. Chegaram a registrar até a entrega do dinheiro. Os dois emissários tiveram a prisão preventiva decretada, decisões que não foram derrubadas pelo Supremo.   As farpas de Mendes não pararam por aí. "O magistrado não indicou elementos concretos e individualizados aptos a demonstrar a necessidade da prisão cautelar, atendo-se, tão-somente, a alusões genéricas." Na quinta-feira, Mendes já havia acionado o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Conselho da Justiça Federal (CJF) e a corregedoria do Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Quis, com isso, que a conduta do juiz fosse investigada.

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