Força do PMDB já preocupa o Planalto

Vitória eleitoral do partido pode ser começo do fim da atual base aliada

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Por Marcelo de Moraes e BRASÍLIA
Atualização:

A lua de mel do governo federal com sua base de sustentação no Congresso já não existe mais. Depois de passar praticamente o ano inteiro aprovando todos os projetos de seu interesse, aproveitando os altos índices de popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o governo não tem mais controle político sobre seus aliados na Câmara e Senado e registra, com preocupação, o início de recuperação do discurso oposicionista. Isso não significa que o governo vai perder todas as votações do seu interesse. Mas representa o aparecimento de desgaste na conversa com os parlamentares, além do risco de aprovação de despesas que a equipe econômica considera indesejáveis. Nos últimos dias, o governo viu senadores do PMDB, seu principal partido aliado, comandarem uma insurreição contra a medida provisória 446, que anistia as entidades filantrópicas, e sua devolução ao Executivo - um desafio que não ocorria desde 1989. Assistiu ainda o senador petista Paulo Paim (RS) liderar o movimento de aprovação do projeto de lei 58, na Comissão de Assuntos Sociais do Senado, que prevê a recomposição do valor de aposentadorias e pensões da Previdência Social, num período de cinco anos. O impacto financeiro da proposta - que ainda precisa passar pelo plenário do Senado - provoca arrepios na equipe econômica e no Ministério da Previdência Social: ele chega a R$ 76,6 bilhões anuais. Paim ainda provocou outro mal-estar ao organizar uma vigília madrugada adentro, no plenário do Senado. RISCOS NA SUCESSÃO "Sei que estou criando um problema para mim dentro do governo, mas paciência. Não dá para ficar parado e não defender o reajuste", justifica o senador. O Palácio do Planalto também enfrenta enormes dificuldades para administrar o processo de sucessão para as presidências da Câmara e do Senado, especialmente na relação entre PMDB e PT. A própria convivência com os peemedebistas, fortalecidos pelo ótimo desempenho nas eleições municipais, tornou-se um fardo diário para o governo. Para o PT, a solução ideal seria a pura divisão do poder nas duas Casas. O PMDB ficaria com a Câmara, com Michel Temer (SP), e o PT levaria o Senado, com Tião Viana (AC). É pouco provável, porém, que o desfecho seja esse. O PMDB abortou rapidamente esse plano ao cobrar o cumprimento do acordo feito dois anos atrás na Câmara e que garantiu a eleição de Arlindo Chinaglia (PT) para comandar a Casa com o apoio peemedebista. Em troca, o PT teria que apoiar um peemedebista para a sucessão de Chinaglia. Os peemedebistas lembraram que essa aliança nunca inclui o processo sucessório do Senado e que o partido também pleiteia essa presidência, que pode ficar com José Sarney (PMDB-AP). O Planalto teme que essas dissidências abram espaço para a eleição de um candidato pouco alinhado com o governo e que traga ainda mais problemas. Além de ser protagonista na disputa sucessória do Congresso, o PMDB tem cobrado mais espaço dentro do governo - pressionando Lula até para trocar um ministro do partido (José Gomes Temporão, da Saúde). Em contrapartida, o ministro reagiu cobrando mudanças na Fundação Nacional de Saúde (Funasa), reclamando de irregularidades na gestão da autarquia, tocada pelo próprio partido. Para evitar nova crise, Lula decidiu contemporizar. Manteve o ministro e autorizou mudanças pontuais na Funasa. Mas, segundo interlocutores, achou mais prudente não tomar nenhuma medida radical que pudesse provocar novos atritos na relação com o PMDB. O presidente registrou o problema e, conforme relato de aliados, desconfia que alguns líderes da legenda começam a ensaiar o desembarque da base aliada. Essa fratura da base é provocada por uma mistura de componentes. A crise financeira internacional enfraqueceu a economia do governo, justamente um dos pontos que garantiam seu prestígio e tiravam os argumentos da oposição no debate político. O cenário agora aponta para retração do crescimento econômico, contrariando os planos do governo de faturar politicamente esse desenvolvimento. Ao mesmo tempo, o mau resultado eleitoral do PT nas grandes capitais acendeu o sinal de alerta entre os aliados e espalhou pelo Congresso um ar de incerteza em relação ao xadrez político de 2010. Sem ter Lula na próxima disputa eleitoral e com o governador de São Paulo, José Serra, se fortalecendo como principal nome da oposição, os partidos aliados do governo têm "flexibilizado" sua lealdade ao Palácio do Planalto. De quebra, o PMDB percebeu seu fortalecimento político e seu potencial para poder desequilibrar a sucessão de 2010, dependendo do candidato que apoiar. Assim, passou a jogar com esse prestígio nas negociações com o governo dentro e fora do Congresso. GOVERNO X ALIADOS{TEXT} Pressão por aumento para os aposentados O senador petista Paulo Paim (RS) organizou movimento no Congresso para garantir vantagens aos aposentados, aumentando o valor das aposentadorias e pensões. Somente com uma de suas propostas, aprovada na Comissão de Assuntos Sociais do Senado, o governo calcula um impacto de R$ 76,6 bilhões anuais, que diz não ter como pagar. A mobilização incluiu uma vigilância no plenário do Senado durante a madrugada com o apoio de vários governistas Guerra das MPs Irritados com a quantidade de medidas provisórias enviadas pelo governo para o Congresso, senadores se rebelaram contra a chamada MP das entidades filantrópicas. O envio da medida, que anistia entidades com contas supostamente irregulares, foi considerado uma afronta e foi devolvida para o governo. A ação foi liderada pelo presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), e por outros senadores peemedebistas Sucessão na Câmara e no Senado PMDB e PT não conseguem chegar a um acordo sobre a divisão do poder no controle do Congresso. O PT já recuou na Câmara e dará apoio a Michel Temer (PMDB-SP), mas não consegue convencer os peemedebistas a desistirem da presidência do Senado em favor do petista Tião Viana (AC). O risco do governo é perder o controle de alguma das Casas para um candidato independente ou de oposição, caso a base se frature demais Briga por cargos O PMDB pediu a Lula a demissão do peemedebista José Gomes Temporão do Ministério da Saúde. O ministro, por sua vez, pediu para mudar a Funasa, núcleo histórico de poder de lideranças peemedebistas. O presidente preferiu não entregar a cabeça de Temporão nem reestruturar a Funasa, mas deve manter postos importantes na autarquia para entregar aos líderes do PMDB. O partido também tenta tirar o petista Tarso Genro do Ministério da Justiça

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