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Fã de Roberto Carlos, Bolsonaro promete que ‘daqui pra frente tudo vai ser diferente’

Presidente chama Rodrigo Maia de ‘prezado irmão’, mas tem como maior desafio extrapolar a fronteira do “nós com nós mesmos” e não incendiar o “nós contra eles” 

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Foto do author Vera Rosa
Por Vera Rosa
Atualização:

Caro leitor,

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Com um desabafo aqui e uma piada acolá, o presidente Jair Bolsonaro chega aos cem dias de governo dando sinais de que “daqui pra frente tudo vai ser diferente”. Além de demitir o polêmico Ricardo Vélez Rodríguez do Ministério da Educação e mudar o comando da Secretaria de Comunicação, ele tem se reunido com dirigentes dos mais variados partidos e pedido apoio no Congresso. Até agora, foram muitas horas de reuniões e poses para fotos, com homens engravatados sorrindo diante das câmeras. Mas, de concreto mesmo, nada de aliança e muito menos casamento de papel passado

Na abertura da Marcha em Defesa dos Municípios, nesta terça-feira, 9, Bolsonaro também chamou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), de “prezado irmão”, após uma temporada de troca de farpas entre os dois. No capítulo anterior, Maia havia dito que não seria “mulher de malandro” para ficar “apanhando” de seguidores do capitão reformado. A temperatura subiu. Antes, o deputado tinha afirmado que Bolsonaro estava “brincando de presidir o País” e, em entrevista ao Estado, classificou o governo como “um deserto de ideias”, como você pode ler aqui

O presidente Jair Bolsonaro durante posse do novo ministro da Educação,Abraham Weintraub, que assume a pasta no lugar de Ricardo Vélez Rodríguez, demitido na segunda-feira, 8 Foto: Eraldo Peres/AP

“Às vezes me pergunto: meu Deus, o que eu fiz para merecer isso? É só problema”, disse Bolsonaro a portas fechadas, na sexta-feira, 5, diante de uma plateia formada por servidores que assistiam à inauguração de uma ouvidoria da Presidência, no Planalto. “Eu não nasci para ser presidente. Nasci para ser militar”, afirmou ele, em tom de brincadeira.

A frase, que certamente será usada por adversários em campanhas eleitorais, chama a atenção no momento em que Bolsonaro começa a mexer na estratégia de comunicação, após perder popularidade e capital político. Aconselhado a vestir as sandálias da humildade e a se aproximar de eleitores que não o seguem nas redes sociais, o presidente tem como maior desafio, agora, extrapolar a fronteira do “nós com nós mesmos” e não incendiar o “nós contra eles”. 

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A tarefa é considerada quase impossível no Planalto, mesmo porque o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), o filho “zero dois” – conhecido por atacar até potenciais aliados no Twitter –, parece estar acima de todos.

Na tentativa de amenizar as dificuldades, o vice Hamilton Mourão garantiu, nos Estados Unidos, que Bolsonaro está ciente da necessidade de arquivar a retórica do enfrentamento. Um dos alvos da artilharia de Olavo de Carvalho, guru ideológico do presidente, o general Mourão também definiu o apagão nas articulações com o Congresso como um processo de “ensaio e erro”

O problema é que as crises ocorridas até agora, com disputas entre olavetes, militares e políticos sobre os rumos do governo, contaminam a economia e podem por em risco a principal aposta da gestão Bolsonaro, que, como todos sabem, é a reforma da Previdência. Até mesmo a Apex, que cuida da promoção de exportações, virou palco de confronto. Nesta terça, 9, a briga provocou a queda do segundo presidente da agência em três meses. 

“A nossa angústia é porque estamos todos no mesmo campo político de Bolsonaro, já que o outro é o do PT. Mas, se não houver articulação política, não há governabilidade”, argumentou o líder do DEM na Câmara, Elmar Nascimento (BA). Com três ministérios no governo – Casa Civil, responsável justamente pelas negociações com o Congresso; Saúde e Agricultura –, o DEM até hoje não fincou pé na base aliada. Embora o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, tenha organizado a cerimônia para bater o bumbo sobre “conquistas” dos cem dias da era Bolsonaro, integrantes do DEM não se cansam de expor o desgaste do Planalto em praça pública.

“Esse negócio de cem dias é o quê?”, perguntou Elmar, engatando na sequência uma penca de questionamentos. “Qual é o projeto de Brasil que eles têm? Qual é agora o plano para a Educação? Ao que eles querem que a gente se associe?” Cético em relação ao discurso de pacificação entoado por Bolsonaro, o líder do DEM ainda emendou: “Eu não vou me associar a quem renega a política.”

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Hostilizado recentemente na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, o ministro da Economia, Paulo Guedes – chamado de “tchutchuca” pelo deputado Zeca Dirceu (PT-PR), como você pode lembrar aqui, – já disse mais de uma vez que, pelo andar da carruagem bolsonarista, o governo não precisa de inimigos. Guedes não fala à toa. Naquela tumultuada sessão do dia 3, por exemplo, o PSL, partido do presidente, não o defendeu. “Muitas vezes não sei mais quem é situação e quem é oposição”, admitiu o líder do PSL no Senado, Major Olímpio. (SP). 

Ao que tudo indica, Bolsonaro não tem mesmo amigos de fé, irmãos, camaradas no Congresso e muito menos aliados de peso. Mas continua fã de Roberto Carlos.

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