Ex-diretor teria sorteado bônus na gráfica do Senado

De acordo com chefes do setor, Agaciel distribuía de R$ 1,3 mil a R$ 1,8 mil em uma espécie de ?jogo?

PUBLICIDADE

Por Leandro Colon e BRASÍLIA
Atualização:

A abertura da caixa-preta da gráfica do Senado revela que gratificações foram sorteadas pelo ex-diretor-geral Agaciel Maia entre os funcionários. O sorteio beneficiou nos últimos anos servidores com FC-6 e FC-7, funções comissionadas que variam de R$ 1,3 mil a R$ 1,8 mil mensais. A denúncia foi feita por chefes de serviço da gráfica numa reunião na sexta-feira e deve ser investigada internamente a partir de hoje. Segundo servidores, Agaciel não só decidiu transformar a concessão do bônus num jogo, como acompanhava pessoalmente esse método de distribuição. Um dos sorteios ocorreu no antigo auditório da gráfica, onde funciona hoje a seção de edição em braille. Com um saco na mão e os números de matrícula dos servidores dentro dele, assessores de Agaciel sorteavam os beneficiados. Durante a festa, quem se dava bem recebia aplausos dos demais colegas. O sorteio, conhecido pelo nome de "mão no saco", era um "espetáculo", relatam servidores. Até hoje essas pessoas recebem o dinheiro extra no salário. O presidente do Sindicato dos Servidores Legislativos (Sindilegis), Magno Mello, confirma que a prática é conhecida no Senado. "É uma história que já me foi contada, dizem que é quente, mas eu não tenho nenhuma prova", afirma. Na época, Agaciel argumentou aos servidores que recebia muita pressão para distribuir esses bônus. Em vez de optar pelo critério de merecimento, ele decidiu então sortear o benefício para evitar reclamações. A iniciativa, no entanto, criou um problema interno de hierarquia: alguns funcionários sortudos passaram a receber uma gratificação maior do que a do próprio chefe. Não se sabe ainda o número certo de quantas pessoas foram gratificadas pelo sorteio. Estima-se que a quantidade pode chegar a 100, pelo menos. Dona de um orçamento de R$ 30 milhões para investimentos e terceirização, a gráfica do Senado possui 1.100 funcionários efetivos, dos quais 420 estão deslocados para outras funções. A maioria acabou conseguindo - por sorteio ou mérito - algum tipo de gratificação na gestão de Agaciel. Quem teve azar e perdeu um FC-7 contentou-se com FC-6. Os chefes já recebem um FC-8, de R$ 2 mil. E os diretores, um FC-9, de R$ 2,2 mil. REDUTO A gráfica é o grande feudo de Agaciel no Senado. Foi por lá que ele, sem concurso, começou a trabalhar, ainda em 1977. Como a Constituição efetivou todo mundo que estava no serviço público, mesmo sem concurso, até o dia 5 de outubro de 1983, Agaciel acabou por se tornar um servidor efetivo. De 1987 a 1995 ele exerceu o cargo de diretor-executivo do setor. A gráfica fica distante do prédio principal do Senado, longe dos holofotes. Até semana passada, a entrada no local era permitida somente com autorização expressa da primeira secretaria. A gráfica é responsável pelas publicações dos trabalhos em plenário, dos anais, do Diário Oficial do Senado, e dos livros referentes aos senadores. PRESTÍGIO As gratificações salariais eram instrumento de poder de Agaciel dentro da Casa. Em troca do benefício, ele angariava aliados e prestígio entre os colegas. Na edição de ontem, o Estado revelou que os atos secretos foram usados para conceder bônus salariais com datas retroativas. Foi o que ocorreu, por exemplo, na secretaria de estágios em 2007. Na época, a pasta era comandada por Sânzia Maia, mulher de Agaciel. Um ato secreto de agosto de 2007 concedeu FC-7 a cinco servidores do órgão. Detalhe: a decisão era retroativa a dezembro de 2006. Ou seja, os funcionários receberam, ao menos, sete meses de gratificação sem ter trabalhado por isso. Agaciel deixou o cargo em março após a suspeita de ter ocultado a propriedade da residência onde mora em Brasília. Ele chegou à diretoria-geral pelas mãos do presidente José Sarney (PMDB-AP) em 1995. A reportagem o procurou ontem. Agaciel está de licença para se defender de um processo administrativo. Um recado foi deixado no telefone celular dele, mas nenhuma resposta foi dada até o fechamento da edição.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.