Texto atualizado às 23h13
BRASÍLIA - Um ex-funcionário da Casa Civil e da Polícia Federal foi alvo nesta sexta-feira, 24, de uma operação da instituição em Brasília. Os agentes vasculharam o apartamento do advogado Marcelo Bulhões dos Santos. A suspeita é de que ele produzia e vendia relatórios falsos, com timbre de órgãos oficiais, sobre vários assuntos - alguns versariam sobre terrorismo.
O grupo antibomba da PF e homens encapuzados do Comando de Operações Táticas (COT) fizeram buscas no imóvel de Bulhões. O aparato seguiu protocolo determinado pela corporação para atividades antiterrorismo. As investigações também envolveram agentes do grupo de combate ao terrorismo.
Ao Estado, investigadores explicaram que, ao planejar a ação, considerou-se o risco de o advogado resistir ao mandado de busca e apreensão, daí toda a estrutura envolvida. Ele trabalhou na Coordenação-Geral de Polícia Criminal Internacional, braço da Interpol na PF, e poderia ter conhecimento das táticas usadas em operações dessa natureza.
A PF vai analisar o conteúdo dos relatórios apreendidos no apartamento de Bulhões e tentar identificar para quais clientes ele os teria vendido. Há suspeitas de que o advogado possa ter contato com grupos extremistas. Contudo, está descartado nesta fase da investigação que ele seja um deles.
No Brasil, o terrorismo não é tipificado como crime. O mandado de busca e apreensão, expedido pela Justiça Federal, citava a necessidade de apreender documentos. Os papéis obtidos no apartamento de Bulhões, supostamente vendidos por ele e de cunho privado, continham por exemplo o timbre da PF.
A defesa de Bulhões nega o envolvimento do advogado com extremismo e que as investigações tratem do assunto.
Carreira. Bulhões é ex-servidor do governo federal e atua como consultor jurídico em Brasília desde 2010, quando pediu exoneração do serviço público. Há alguns meses, presta serviços à Embaixada de Omã. O advogado foi nomeado em 2004 agente administrativo da PF, mas, a partir de 2007, serviu a órgãos da Presidência.
Ele trabalhou como assistente da Casa Civil entre maio de 2008 e 2010, quando a presidente Dilma Rousseff chefiava a pasta. No Facebook, Bulhões postou foto ao lado da petista, com o comentário: “Época de trabalho na Casa Civil da Presidência da República... Saudades!”.
Bulhões e sua família moram no apartamento vasculhado há cerca de um ano, segundo vizinhos. Para abordar a mulher do investigado, que segue a fé islâmica, a PF escalou agentes femininas, proibiu os homens de tocá-la e os orientou a esperá-la se cobrir com o véu muçulmano antes de iniciar a ação. A equipe do COT deixou o imóvel com três malotes de documentos.
O advogado de Bulhões, Ariel Foina, explicou que seu cliente trabalha com direito internacional para clientes de todo o mundo. “Não tem nada de terrorismo. Fizeram uma ilação por envolver um muçulmano”, disse, no fim da noite, após o cliente prestar depoimento.
De acordo com o defensor, não há nos documentos da investigação aos quais teve acesso referência a pratica de terrorismo. A acusação, explicou, é de alterar, falsificar ou fazer uso indevido de marcas, logotipos e outros símbolos da administração pública.
O advogado não soube explicar a presença do Grupo Antibomba e do COT na ação. “A PF é que tem de explicar.”
CPI. Em 2013, num documento enviado à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Espionagem no Senado, o advogado denunciou supostos excessos de serviços secretos contra cidadãos de origem ou que professam a fé islâmica no Brasil.
“Há fortes indícios de que vários cidadãos brasileiros de origem árabe e/ou de confissão islâmica tenham sido objetos de investigação por parte de serviços de inteligência nacionais e estrangeiros, sendo que nem sempre haveria motivo plausível para tal”, escreveu, em setembro daquele ano, num ofício endereçado à senadora Vanessa Grazziotin (PC do B-AM).
Em nota, a PF informou ontem que cumpriu mandado de busca e apreensão em investigação sobre falsificação de documentos. Além disso, explicou que o inquérito tramita em segredo de Justiça e que os atos praticados pelo investigado “não guardam relação direta com seu passado funcional ou, ainda, com suas atividades como servidor comissionado”.