Ética e candidatura própria agitam Congresso do PT

Encontro é o 3º em 27 anos de partido e terá a presença de Lula e deve tratar de questões éticas

Por CARMEN MUNARI
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Munido de uma pauta de difícil construção entre suas várias tendências, o PT realiza no fim do mês o Congresso Nacional da legenda, com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Com poderes para alterar estatuto e programa, será o terceiro congresso em 27 anos de existência do partido. A questão ética, abalada na crise do mensalão, estará no olho do furacão durante o encontro, que se realiza em São Paulo entre 31 de agosto a 2 de setembro. Será realizado já sob a ótica da decisão do Supremo Tribunal Federal, que nesta semana decide se transforma em réus os 40 denunciados pelo esquema. "Queremos aprovar uma diretriz sobre a ética que inclua a instituição de uma corregedoria no partido", disse à Reuters Joaquim Soriano, representante da tendência de esquerda Democracia Socialista (DS) e secretário-geral do partido. A DS tem na Articulação de Esquerda (AE) um aliado para a instituição da corregedoria e, um nível acima, conta com o apoio do ministro Tarso Genro (Justiça), que se aliou à tendência para as teses do Congresso. "A corregedoria é mais ágil, apura as denúncias e encaminha para a comissão de ética", explica Soriano. Representante da tendência dominante, Glauber Piva, também secretário do PT, é contrário à proposta. "Não dá para tentar transformar o PT em polícia. O partido tem que se focar na formação política", disse Piva. Para ele, "temos que partir da inocência de todos e a corregedoria vai em outra mão." A corrente, que domina o PT há mais de dez anos e esteve à frente do mensalão, propõe apenas a reestruturação da ouvidoria e da comissão de ética, que prevê ser "menos fraca do que hoje", sem detalhar. Até agora chamada de Campo Majoritário, a corrente quer ser conhecida como Construindo um Novo Brasil, já que deixou de ser "majoritária" na eleição interna de 2005, consequência do escândalo do mensalão. Fazem parte da tendência desde Lula ao presidente da legenda, deputado Ricardo Berzoini, passando pelos ministros mais próximos do Planalto. O deputado cassado José Dirceu, que também estará presente no Congresso, mantém influência na corrente. No escândalo de caixa-dois e compra de votos do partido, apenas o tesoureiro Delúbio Soares foi expulso. Silvio Pereira, então secretário-geral, pediu desfiliação da legenda, e outros, como o ex-presidente José Genoino, apenas deixaram a função. A comissão de ética foi vista pelas correntes de esquerda como instância sem poderes de punição. Eleições diretas Grande parcela do partido aposta na aprovação pelo Congresso Nacional do sistema de financiamento público de campanha para evitar que os fatos que se abateram sobre a direção petista se repitam. O PT vai discutir também a antecipação das eleições internas. A transferência da data aparenta consenso entre os delegados, mas ainda não há certeza quanto à data. "O PED (Programa de Eleições Diretas) vai ser antecipado, tudo indica que sim, para dezembro", disse Valter Pomar, secretário de relações internacionais da sigla e representante da Articulação de Esquerda. Berzoini foi eleito em 2005 com mandato até 2008, ano de eleições municipais que se chocariam com o processo de eleição interna. Realizadas no mesmo ano do escândalo do mensalão, as eleições alteraram a correlação de forças da legenda. Berzoini e o agora ex-Campo receberam 42 por cento dos votos de quase 300 mil militantes e tiveram que dividir a direção com as tendências de esquerda, que passaram a ocupar secretarias. Para o Congresso, no entanto, a ala de Berzoini, que pode concorrer à reeleição, estima ter 51 por cento dos 931 delegados. A DS soma 15 por cento e a AE, cerca de 5 por cento. Os índices, extra-oficiais, são determinantes para a aprovação das resoluções, por maioria simples. Sem Lula em 2010 Temas do cenário político também estarão sobre a mesa de discussão, como a definição do perfil do candidato às eleições presidenciais de 2010. Independentemente da coloração da corrente, os integrantes do PT concordam que o fator aglutinador da legenda desde 1989 até 2006 foi representado pelas sucessivas candidaturas de Lula à Presidência, com duas vitórias. Com Lula fora da disputa em 2010, a perspectiva do PT fica reduzida; a oposição e mesmo os aliados se atiçam e "o que era agregação vira desagregação potencial", segundo análise de um integrante do partido. "Em 2010 o PT terá candidato próprio", prevê Glauber Piva, que considera uma experiência inédita ir para a disputa sem Lula. Mesmo sem ser o foco principal, Lula será o grande eleitor do futuro candidato, levando para o palanque as realizações de seus dois mandatos. Já o nome de consenso virá depois das eleições municipais do ano que vem.

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