ESPECIAL-Sirene abre negócios de peixe fresco na madrugada d S

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Por SÉRGIO S
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Às 2h toca a sirene anunciando o início das negociações no Mercado de Pescados da Ceagesp, em São Paulo. Peixes estão expostos em tablados no chão chamados de "pedra". Os carregadores começam a tomar conta dos estreitos corredores transportando as 190 toneladas de peixes frescos comercializados diariamente no local: salmão do Chile, merluza argentina, cação uruguaio, atum brasileiro, sardinhas de toda parte. Duas horas mais cedo, os primeiros funcionários já montavam seus módulos com tablados, caixas e balanças, à espera dos clientes, a maioria feirantes, compradores de restaurantes e proprietários de mercados. Ao todo, 85 empresas atacadistas vendem pescados na madrugada, a maioria de origem nacional. Uma hora depois do início das negociações, o chão do mercado está praticamente inundado com a água do gelo derretido e todos, exceto os desavisados, usam galochas brancas acima da canela. Para quem não está acostumado, o cheiro é forte. No balanço anual de 2006, o mercado registrou a venda de 45.810 toneladas de pescados, mais de 3,8 mil toneladas por mês, um acréscimo de 11,9 por cento frente às vendas de 2005, segundo dados da Ceagesp. Ainda assim, o movimento é menor que o registrado em meados da década passada. "De dez anos para cá as vendas vêm caindo. Até 1992, o consumo vinha crescendo. No auge, a gente vendia 350 toneladas ao dia", afirmou Jiro Yamada, 63 anos, presidente da Associação dos Comerciantes Atacadistas de Pescados do Estado de São Paulo (Acapesp), culpando os produtos industrializados pela queda nas vendas. O ambiente no mercado é frio e úmido, e quase todos usam jalecos brancos. Os caminhões refrigerados a cerca de 5 graus negativos que levam os peixes até a praça de venda tornam o local gelado mesmo na época de calor. A Ceagesp (Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo) foi criada em 1969, mas estima-se que o mercado de pescados tenha surgido em 1972, embora não haja uma data oficial. O PESCADO Os preços dos peixes podem variar durante a semana, de acordo com a demanda, o abastecimento, e até mesmo a qualidade. O quilo do atum oscila entre 10 e 15 reais, por exemplo. "Aqui não tem muito segredo, quem conhece chega e compra, não fica enrolando muito", disse um comprador que não quis se identificar. "Em geral, o peixe é muito bom." A rede Nakombi, com três restaurantes japoneses em São Paulo, compra no mercado por causa do preço e da qualidade. "A gente adquire uma grande quantidade para os restaurantes, então fica mais fácil a negociação", acrescentou uma representante do Nakombi. Não se pode confundir o mercado com um supermercado. Embora qualquer um que tenha interesse possa ir lá fazer compras, há que se levar em conta que é um atacado e não dá para levar somente um "peixinho". Assim, o consumidor tem a opção de uma peça de cação de 20 quilos ou a caixa de sardinha inteira. Os compradores, geralmente acompanhados de um carregador, passam pelos corredores vistoriando a mercadoria, perguntando preços e anotando tudo numa caderneta. Ao contrário do senso comum de que peixe tem odor forte, Jiro, da Acapesp, explica que "peixe bom não tem cheiro". "O odor ruim vem da limpeza inadequada do local, que acumula água de resíduos, e de alguns peixes começando a ficar ruins", explicou. OLHA A FRENTE É preciso prestar muita atenção para não ser atropelado. Carregadores apressados, geralmente autônomos, vagam velozes pelos estreitos corredores do mercado. Paulo Saturnino Ferreira, de 55 anos, 15 deles trabalhando como carregador autônomo na madrugada, já quebrou o pé direito quando um colega passou com um carrinho em cima dele. "Tem que tomar cuidado, senão atropela mesmo", disse. Ferreira não reclama da dor nas costas nem do horário de trabalho que enfrenta. O ruim, segundo ele, é o preço que os feirantes e outros consumidores pagam por seus serviços. "Aqui somos em cerca de 80 carregadores autônomos. Já é duro. E a gente recebe 1 real por caixa de peixe que cabe no carrinho. Na época boa... chegava a 3 reais", afirmou. Ferreira diz que em cada viagem leva o máximo de 25 caixas e que, no mês, consegue tirar cerca de 600 reais, incluindo nisso seus serviços em outro mercado da Ceagesp, o de flores. "No de flores a viagem custa 15 reais. Por mim, eu ficava só no de flores", desabafou. "Mas o de flores funciona só de terça e sexta..." A madrugada de Ferreira e do mercado chega ao fim às 6h, quando já está claro e os tablados com pescados no chão começam a ser retirados para dar lugar à equipe de limpeza com seus rodos e vassouras.

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