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Errado por linhas tortas

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Por Redação
Atualização:

Justiça se faça ao ministro da Justiça. É um homem coerente, de ideias firmes e rumo certo. Desde quando se assumiu porta-voz da campanha "Fora FHC" - contra a orientação da direção do PT - no segundo mandato de Fernando Henrique, Tarso Genro vem mantendo sempre a mesma linha de pensamento equivocada e de ação atabalhoada.Não faz uma concessão ao acerto.Antes de entrar no tema em pauta - o anúncio do ministro sobre a crise institucional que se avizinha caso o Supremo Tribunal Federal não avalize o refúgio por ele concedido ao italiano Cesare Battisti -, um brevíssimo apanhado de alguns dos momentos (não necessariamente os melhores) do ministro.Memorável sua participação no episódio do dossiê que a Casa Civil fazia esforço para convencer tratar-se de um "banco de dados" sobre os gastos da Presidência anterior, abraçado à tese de que a elaboração de "dossiês" era algo corriqueiro em qualquer governo.Na crise aérea, a altura tantas do caos e da paralisia do poder público, informou que o governo não estava com "pressa neurótica" para resolver o problema. Mais recentemente, classificou como manifestação de "arrojo" o assassinato de quatro pessoas por integrantes do MST, em Pernambuco.Com esse histórico, não surpreende que surja em cena para comentar a primeira etapa do julgamento do STF sobre o recurso apresentado pelo governo italiano à concessão do refúgio, alertando para o risco de crise institucional. Isso, caso o tribunal confirme a tendência de anular a decisão e autorizar a extradição de Battisti para o cumprimento da condenação por quatro homicídios, na Itália.Estará, assim, na interpretação de Tarso Genro, aberto um perigoso precedente de desrespeito ao primado do equilíbrio entre os Poderes da República.A fim de não perder relatando os inúmeros episódios em que o atual governo transgrediu o preceito interferindo nas questões internas do Legislativo - até porque um malfeito não torna lícitos outros ilícitos -, passemos ao embasamento do ministro no tocante à teoria da crise."Será a mesma coisa se o Poder Judiciário julgasse um determinado processo contra o Executivo, por exemplo, e o Executivo invadisse a prerrogativa do Judiciário dizendo o seguinte: "Não, não, não vamos cumprir porque essa decisão é juridicamente errada". O Executivo estaria interferindo na prerrogativa que a Constituição dá ao Judiciário."Se o ministro mistura as coisas de propósito, sofisma. Mas se o faz com pureza d"alma, o caso é de insuficiência de compreensão do funcionamento das coisas.Ao Supremo Tribunal Federal cabe julgar em sistema de colegiado com base na lei e mediante argumentos fundamentados.O Executivo não tem a prerrogativa de decidir juridicamente a respeito de coisa alguma. Já ao Judiciário cumpre a função de zelar pelo cumprimento da Constituição.Se o Executivo exorbitar, descumprir a lei, é o Judiciário quem deve julgar. Para isso ele existe. Por isso na democracia as decisões no Executivo não são absolutas.Por maioria, o STF decidiu que caberia a ele, sim, examinar a concessão do refúgio, bem como até agora a maioria (4 a 3) opinou que a resolução do ministro fere tratado internacional do qual o Brasil é signatário e, portanto, obriga-se a cumprir. Ao arrepio das concepções do ministro Tarso Genro. É o Estado brasileiro que está representado na delegação conferida a ele pelo presidente da República, também submetido aos ditames legais.Paciente, o presidente do Supremo, ministro Gilmar Mendes, não polemizou. Em resposta, apenas explicou que "essas questões não ocorrem dessa maneira. Estamos num outro padrão civilizatório no Brasil. Muitas vezes declaramos a inconstitucionalidade de uma emenda constitucional aprovada por mais de 400 votos na Câmara e setenta e tantos no Senado e isso nunca provocou celeuma nem escaramuças". É isso. Fosse como acredita - ou quer fazer acreditar - o ministro da Justiça, a derrubada de decisões do Legislativo, consideradas inconstitucionais, representariam interferência indevida e renderiam crises institucionais. Seria uma por mês.Assim como uma sentença favorável à extradição e contrária à posição do ministro não abrirá crise alguma (queira o bom senso que a normalidade não seja motivo de desgosto para o ministro), um resultado oposto - em favor do refúgio - não abalará a República. Será apenas uma decisão de corte que, como diz o nome, é suprema em sua prerrogativa de resguardar a legalidade.IdentidadeA ofensiva do governo argentino contra o jornal Clarín, somada à hostilidade dos mandatários para com a liberdade de imprensa em países como Venezuela, Bolívia e, de maneira dissimulada, Brasil, é a certidão do parentesco estreito entre a concepção populista da relação entre governantes e governados e a vocação autoritária para o exercício do poder.

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