'Enfadonho' diz Fux sobre julgamentos no Supremo

Ministro propõe limitar a 15 minutos tempo de fala para agilizar ações; ele diz que Lava Jato tramita 'em ritmo razoável'

Por Brasília
Atualização:

“Aqui, debaixo de cada toga, bate um coração.” Dita com emoção pelo ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), a obviedade pretende frisar que as chamadas 11 ilhas, cada qual no seu quadrado, precisam abrir canais entre si. Primeiro, falando menos para a TV Justiça. Segundo, conversando mais uns com os outros. Para o falatório, chato e sem nenhum controle, Fux propõe um limite de tempo: 15 minutos, o mesmo que cabe aos advogados que ocupam a tribuna. Para diminuir a distância entre as ilhas, que acha já estar melhorando, confia nas “escolhas trágicas” que a sociedade civil está levando à Corte.

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Carioca, de 63 anos, Fux foi advogado, promotor, juiz (por 14 anos), desembargador, ministro do Superior Tribunal de Justiça (indicado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso e aprovado pelo Senado) e, a partir de março de 2011, um dos 11 do STF, por indicação da presidente Dilma Rousseff e aprovação do Senado. O ministro recebeu o Estado, depois de uma sessão do tribunal pleno, na antessala do gabinete, no 3.º andar do anexo 2. E também falou sobre a Operação Lava Jato.

As sessões do Supremo continuam prolixas e cansativas, porque os ministros, até mesmo o senhor, passam muito tempo lendo os votos... É enfadonho.

Ninguém merece, nem os senhores... É verdade.

Alguma solução à vista? Num dado momento de amadurecimento nós poderíamos estabelecer, até regimentalmente, que aquele que estiver de acordo (com a questão em discussão) manifeste essa posição em menos de um segundo. Quem não estiver de acordo disporá, para discordar,o mesmo prazo dos advogados que sobem à tribuna, 15 minutos. É uma regra que agiliza. Dá para resolver mais uns cinco processos de repercussão geral por sessão.

O senhor não teria dificuldade pessoal para aceitar essa regra? Não. Zero.

Porque às vezes, data vênia, parece que o senhor realmente gosta de ficar naquela leitura... Não. A gente faz a mesma coisa que todo mundo faz, quando é relator (do caso em pauta). Mas essa redução tem de acontecer. Eu acredito naquela colocação do Rui Barbosa, acho que na Oração aos Moços: o juiz não tem de mostrar quanto direito ele sabe, mas o direito que a parte pede.

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Sem precisar exibir erudição... A grande aflição do jurisdicionado deve ser essa. Ele ouve, ouve, ouve, é um banho de cultura, mas o que ele quer mesmo saber é se deu provimento ou negou provimento, se ganhou ou perdeu.

O senhor já conversou como outros ministros sobre essa ideia de limitar as intervenções ao tempo dos advogados? Eu já tenho comentado isso com um ou outro ministro. Sempre é uma questão de você ir criando parâmetros novos.

Algum deles concorda? O (Luís Roberto) Barroso, o Teori (Zavascki), o (Edson) Fachin, o (Dias) Toffoli, eu tenho certeza que aceitariam.

Já é quase uma maioria. E a presidente Cármen Lúcia? Com ela eu ainda não conversei a respeito.

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Outra crítica recorrente ao STF é que os senhores são 11 ilhas, que não conversam entre si. Ainda são 11 ilhas, mas hoje é menos, melhorou um pouquinho. Os ministros tem de conversar. Vai melhorar mais.

Em que o senhor baseia esse otimismo? Na necessidade de solução de casos muito difíceis, em que a sociedade merece uma resposta que não é passível de ser obtida só com a soma de votos. Estão começando a chegar ao Tribunal casos em que as escolhas são trágicas, para usar a teoria dos filósofos Guido Calabresi e Philip Bobbit.

O que são essas escolhas? São soluções em que uma delas será necessariamente trágica, e então é preciso conversar. Aqui no Supremo, debaixo da toga de todo mundo, bate um coração. Nessa hora, todo mundo quer o apoio de todos.

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Dê um exemplo de escolha trágica que tramita no Supremo Tribunal Federal. Esse caso dos remédios (se o Estado deve bancar os medicamentos e tratamentos de alto custo, julgamento interrompido em setembro por um pedido de vista do ministro Teori Zavascki). Ninguém vai querer sair daqui com fama de impiedoso. Nem pode. Ninguém quer. Essas escolhas trágicas vão unir os ministros, vão trazer a necessidade de nos reunirmos, para prover de maneira humana e jurídica. Para dar uma caridade justa e uma justiça caridosa.

No caso dos remédios o senhor ainda não votou. Ainda não. Tem de haver um pool da sociedade. O Supremo é o guardião da Constituição desde o seu preâmbulo. E ela abre afirmando que o esforço do Brasil é para criar uma sociedade fraterna e justa. Esse é o primeiro mandamento. Depois vem o resto. Como é que nós vamos deixar a suposta altivez, a ilha, a paz de cada um, superar o dever moral de trazer uma solução humana nesses casos? Os ministros precisam conversar mais entre si.

O relator da operação Lava Jato, aqui no Supremo, é o ministro Teori Zavascki. O senhor acha que está demorando ou não? É uma operação complexa, tem várias fases. Eu acho que está andando num ritmo bastante razoável.

O que se ouve, volta e meia, é que, enquanto o juiz Sérgio Moro já dá uma sentença, na média de seis meses, o Supremo mal recebe uma denúncia... Nem pode ser diferente. O Moro tem uma competência limitada, o Supremo tem uma competência ampla. Aqui nós somos 11 ministros, com jurisdição sobre todo o território nacional, e para todos os ramos do direito. Não recebemos só Lava Jato.

Quantos processos o senhor tem no gabinete hoje? Uns 5 mil processos. Nós temos uma litigiosidade desenfreada. De cada dois cidadãos, um litiga. São 200 milhões de brasileiros e 100 milhões de ações. É inacreditável. No sistema brasileiro, o Judiciário não pode negar justiça, em qualquer provocação ele deve se manifestar. Essa é a razão pela qual o Supremo tem 70 mil casos para julgar, e a Suprema Corte americana tem 70. O Superior Tribunal de Justiça tem 263 mil processos para julgar, e o Terceiro Senado Alemão, que é equiparável ao STJ, tem 3 mil.

O que o senhor acha das denúncias do Ministério Público no caso da Lava Jato, seja na chamada espetacularização, seja, às vezes, na pré-sentença condenatória que tem vindo junto com a denúncia? Teoricamente, o libelo é um projeto de sentença. Mas o comportamento do Moro em relação aos procuradores tem sido bem imparcial. Ele às vezes aceita, e às vezes não aceita.

E o que o senhor diz em relação ao comportamento dos procuradores, ou de alguns procuradores que apresentam a denúncia como se já fosse a sentença? Nos casos emblemáticos, a imprensa tem de ter o acesso, e tem manifestado um interesse muito intenso nesse caso. Por vezes eles se sentem instados a dar uma satisfação pública. Talvez nesse caso eles pequem mais pelo excesso de atender aos reclamos da mídia.

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O senhor tem alguma preocupação institucional com a Operação Lava Jato? Eu não tenho preocupação institucional. Eu entendo que o Supremo Tribunal Federal quando resolve uma questão objetiva, como, por exemplo, marcha da maconha, união de casais homoafetivos, está resolvendo uma questão sobre a qual há um desacordo moral na sociedade. Aí o juiz deve aferir a percepção da sociedade com relação àquele tema. Mas, quando o julgamento é subjetivo – Ministério Público versus A, B ou C –, aí efetivamente o juiz tem de julgar de acordo com o seu grau de convicção e a prova dos autos. Lava Jato é julgamento de réus de acordo com os crimes que praticaram, processo subjetivo, portanto, processo que tem apenas sujeitos.