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Empreiteiras fazem pontes com a política para garantir obras

Nas duas últimas eleições, elas doaram mais de R$ 100 milhões, valor que pode ainda subir no balanço final

Por Marcelo de Moraes
Atualização:

As maiores empresas de construção do Brasil doaram pelo menos R$ 102,5 milhões nas duas últimas eleições para candidatos e comitês financeiros de campanhas. Levantamento feito pelo Estado, com as doações oficiais registradas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pelas principais empreiteiras do País, mostra o repasse de aproximadamente R$ 56,3 milhões nas eleições de 2006 e outros R$ 46,2 milhões nas de 2008. No caso da eleição passada, esses valores ainda vão aumentar porque os partidos têm até o dia 30 deste mês para registrar todas as doações recebidas. O volume de recursos destinados por essas empresas e suas coligadas deixa clara a influência do setor sobre os políticos. Perdem apenas para os bancos em termos de quantidade de repasses feitos para as campanhas. A explicação para esse interesse é simples: presidentes, governadores e prefeitos são responsáveis por obras no País, nos Estados e nos municípios que serão tocadas por empreiteiras. Já os parlamentares apresentam emendas ao Orçamento da União que garantem verbas para a realização de várias obras. Transitar bem no meio político é estratégico para essas empresas. Isso fica evidente na quantidade de recursos enviados para comitês financeiros de campanha. Em 2006, a construtora Camargo Corrêa, por exemplo, doou mais de R$ 3 milhões diretamente para essa finalidade. E a lógica desse processo é de estabelecer pontes de contato com todos os lados - a empresa foi a principal investigada da Operação Castelo de Areia, deflagrada pela Polícia Federal no mês passado. Em 17 de agosto de 2006, a Camargo Corrêa repassou R$ 500 mil para o comitê financeiro nacional da campanha à reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em 26 de setembro, enviou mais R$ 500 mil. Mas a empreiteira não se esqueceu de ajudar também o comitê financeiro nacional do PSDB, que disputava a eleição com Geraldo Alckmin. No dia 4 de agosto, repassou R$ 200 mil e, dez dias depois, mais R$ 200 mil. Lógica parecida foi seguida na campanha de 2006 pela OAS, que destinou R$ 3,5 milhões para comitês financeiros. A OAS preferiu, contudo, priorizar doações para o comitê de Lula, fazendo oito repasses que totalizaram cerca de R$ 1,6 milhão. Para a campanha tucana, destinou bem menos: R$ 100 mil. Em compensação, foi mais generosa com a campanha de José Serra, com dois repasses de R$ 500 mil para comitê financeiro estadual do PSDB. GRANDE DOADORA No levantamento feito pelo Estado, as empresas ligadas ao grupo Camargo Corrêa aparecem como as que mais contribuíram para as duas últimas campanhas dentro do setor de construção. Em 2006, foram doados R$ 14,4 milhões. Em 2008, outros R$ 23,9 milhões. Em relação ao pleito municipal, a Camargo Corrêa aparece como a campeã do setor porque decidiu anunciar, na quarta-feira, o total entregue no ano passado aos políticos, quase um mês antes do fim do prazo legal para o registro das colaborações eleitorais - uma decisão tomada no rastro da operação da PF. A investigação levou à prisão de quatro diretores e de duas secretárias da Camargo Corrêa, suspeitos de participação num suposto esquema de superfaturamento na construção da refinaria Abreu e Lima, da Petrobrás, em Pernambuco. Também apontou para a existência de um suposto esquema de doações feitas "por fora" (ou seja, não registradas) pela empresa para partidos políticos. A empresa nega que tenha cometido irregularidades e feito pagamentos a políticos que não tenham sido declarados à Justiça Eleitoral. Há pelo menos duas décadas, investigações sobre supostas irregularidades têm esbarrado no relacionamento das empreiteiras com o meio político, como ocorreu no mês passado na Operação Castelo de Areia. Só que antes mesmo de a operação ter efetuado a prisão de integrantes da Camargo Corrêa, as ligações entre empreiteiras e políticos já estavam no centro de outros escândalos. ANÕES Em 1993, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Orçamento desmontou um esquema no qual um grupo de parlamentares influía diretamente nas decisões da Comissão de Orçamento do Congresso, destinando emendas para obras de interesse de empreiteiras em troca de pagamento. Em outro caso rumoroso, em 2007, a Operação Navalha revelou as atividades irregulares da construtora Gautama, do empresário Zuleido Veras, que montou uma rede de influência dentro de órgãos do governo federal e em governos estaduais e prefeituras para conseguir dirigir licitações públicas a seu favor. Apesar disso, parlamentares entendem que é legítimo que as grandes construtoras queiram se aproximar dos políticos para defender seus interesses e usem as doações eleitorais para ampliar seus canais de acesso com os políticos.

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