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Empreiteira da Lava Jato afirma que cartel atuou na década de 90

Posicionamento da empresa, a primeira a firmar acordo de leniência com o Cade, vai de encontro ao depoimento do executivo Augusto Mendonça, que firmou delação premiada e detalhou a atuação do 'clube' de empresas

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Por Nivaldo Souza
Atualização:

Atualizado às 21h43

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Brasília - O cartel suspeito de atuar em contratos da Petrobrás e investigado na Operação Lava Jato teria surgido em “meados dos anos 90”, no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), com a criação de um “grupo de estudos” na Associação Brasileira de Engenharia e Montagem Industrial “com o fim de combinar preços, condições, vantagens e abstenções entre concorrentes em licitações” da estatal. A afirmação foi apresentada ontem pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) no “histórico de conduta” do acordo de leniência firmado com Setal Engenharia e Construções e nove funcionários. 

O Cade apresentou documentos mostrando a atuação do cartel em licitações de refinarias como Henrique Lage (SP), Presidente Getúlio Vargas (PR), Paulínia (SP), Alberto Pasqualini (RS) e Duque de Caxias (RJ).

O cartel investigado agora pelo Cade surgiu com a “criação de grupo de estudos junto à Petrobrás” na metade da década de 1990 e operou até a licitação das obras do Complexo Petroquímico do Rio (Comperj), entre o fim de 2011 início de 2012. Entre o fim da década 1990 e início dos anos 2000, as empreiteiras passaram a operar ativamente até que, entre 2003 e 2004, já no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os ex-diretores da estatal Renato Duque e Paulo Roberto Costa organizaram o esquema.

Segundo o Cade, o cartel passou então a se reunir “de forma estável e organizada” no “clube das 9”, formado pelas nove primeiras construturas, até evoluir, a partir de 2007, para o chamado “clube das 16”. 

Refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco Foto: Wilton Júnior/Estadão

Fases. Ao menos 23 empresas, incluindo não integrantes do clube que eram chamadas “esporadicamente” para disputar obras, se envolveram no esquema dividido pelo Cade em 11 fases. O órgão destacou três as etapas: fase preliminar, que abrange o fim dos anos 1990 e início dos anos 2000, quando começam a agir de forma combinada; a etapa de formação do “clube das 9”, a partir de 2003/2004; e a fase do “clube das 16” (fim de 2005/início de 2006), quando a Setal disse que “os participantes das reuniões passaram a ser tanto do alto escalão das empresas como do escalão operacional”. 

A partir de 2008 ou 2009, “tendo em vista a alta frequência das reuniões e a quantidade de pessoas presentes”, as reuniões do grupo de empresas participantes do esquema eram comandadas pelo “escalão operacional”. O grupo operava até por meio de mensagens de celular. “Os contatos anticompetitivos se davam, sobretudo, em reuniões presenciais, mas também houve conversas ao telefone e trocas de SMS.”

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O “clube das 16” ficou completo com a chegada da Galvão Engenharia, segundo o Cade. “Em 2007, já faziam parte do clube pelo menos 15 empresas e, entre 2007/2008, a décima sexta empresa, Galvão Engenharia S/A, passou a fazer parte”, diz o documento. O Cade aponta ainda como integrantes do grupo Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Norberto Odebrecht, Mendes Junior, MPE, Promon, Setal/SOG, Techint, UTC, OAS, Engevix, GDK, Iesa, Queiroz Galvão e Skanska. 

Líderes. O acordo de leniência, que pode amenizar penas da Setal e de executivos ao fim da investigação do Cade em troca de colaboração, foi assinado também com nove pessoas físicas que assumiram estar “envolvidas nas condutas anticompetitivas” relatadas pela Setal – Alberto Jesus Padilia Lizondo, Augusto Ribeiro de Mendonça Neto, Dorian Luis Valeriano Zem, Francisco Vera Codina, Gabriel Aidar Abouchar, José Luis Fernandes, Marcos Pereira Berti, Maurício Mendonça Godoy e Roberto Ribeiro de Mendonça. 

Duas dessas pessoas apontaram os líderes do cartel. “As empresas UTC, Queiroz Galvão e Odebrecht eram as principais articuladoras/coordenadoras das reuniões e do que seria discutido no clube das 16”, disseram. A Andrade Gutierrez divulgou nota na qual disse repudiar “ilações indevidas” feitas sem “qualquer tipo de prova”. 

A Queiroz Galvão disse refutar “veementemente as alegações contidas no acordo de leniência” e afirma que “não atua no ramo de engenharia, construção e montagem industrial”. 

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Lista. Duque e Costa combinavam com as construtoras a composição de listas de empresas do cartel para disputar licitações da estatal. Empreiteiras e os diretores buscavam, assim, evitar “surpresa” nos certames. O acerto incluía a elaboração de planilhas de preços de referência e “tabelas contendo as informações sobre as obras anteriores que já tinham sido vencidas por cada uma das empresas”, além de “informações sobre obras futuras previstas”. O cartel divida as obras entre si. 

Houve um racha em 2005 no “clube das 16”, dando origem a um “clube vip”, integrado pelas maiores empresas que fatiavam obras mais caras, como a Refinaria Abreu e Lima (PE) e o Comperj. Esse grupo mas passou a “exigir primazia” nas “grandes obras”, segundo o Cade.

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